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Como a MP que limita remoção de conteúdos nas redes sociais afeta sua vida

Como a MP que limita remoção de conteúdos nas redes sociais afeta sua vida

Editada por Bolsonaro, proposta restringe a exclusão de perfis e de conteúdos nas redes sociais. Para especialistas, mudanças de maneira provisória e sem debate sugerem interesse eleitoral

Rafael Silva

Repórter de Política / rfreitas@redegazeta.com.br

Publicado em 12 de setembro de 2021 às 14:03

Redes sociais
Redes sociais: plataformas só poderão excluir conteúdos por "justa causa" Crédito: Pixabay

O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) editou nesta semana uma medida provisória que cria novas regras para uso e moderação de conteúdos de usuários nas redes sociais. A MP conta com restrições para redes como o Facebook, YouTube, Instagram, Twitter, TikTok, entre outras, retirarem conteúdos que violarem as regras dos termos de conduta dessas empresas.

A bandeira da transparência dos critérios de exclusão de perfis e postagens é antiga entre movimentos a favor da liberdade de expressão na internet. No entanto, a ação do governo ser feita próxima ao ano das eleições e por medida provisória, sem o debate com o Legislativo, chamou a atenção de especialistas e entidades que acompanham o tema.

Na última quinta-feira (9), a ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF), deu 48 horas para o governo se manifestar sobre a medida provisória, após ações diretas de inconstitucionalidade (Adin) protocoladas pelo PSDB e pelo Solidariedade.

Nos últimos meses, Bolsonaro assistiu publicações dele e de apoiadores serem deletadas pelas empresas responsáveis pelas plataformas. Em março do ano passado, duas mensagens do presidente sobre a pandemia de Covid-19, que iam de encontro com as normas das autoridades sanitárias e aumentavam o risco de transmissão do coronavírus, foram excluídas.

Conteúdos com desinformação e discurso de ódio passaram a ter, de acordo com o código de conduta de cada rede, uma vigilância maior. A liberdade de expressão nas redes ganhou ainda mais discussão a partir de janeiro deste ano, quando o então presidente dos EUA, Donald Trump, foi bloqueado no Twitter, acusado de incitar apoiadores a invadir o Congresso norte-americano.

OS PRINCIPAIS PONTOS DA MP

  • Conteúdos e perfis só poderão ser deletados por "justa causa";
  • Usuário terá direito ao contraditório, ampla defesa e recurso;
  • Provedores estão vedados a moderar ou limitar o alcance de divulgação de conteúdo que impliquem censura de ordem política, ideológica, científica, artística ou religiosa;
  • São considerados justa causa para exclusão de perfis: perfis que simulam identidade de terceiros (exceto aqueles que indiquem aspecto humorístico); contas geridas por computador para simular atividades humanas, contas que ofertem produtos que violem patente;
  • São considerados justa causa para exclusão de conteúdo: nudez, prática ou apoio a crimes contra a vida, terrorismo ou tráfico; apoio a organizações criminosas; prática ou apoio a atos de violência por discriminação ou preconceito de raça, cor, sexo, etnia, religião ou orientação sexual;
  • Segundo o governo, a MP tem como objetivo “combater a remoção arbitrária e imotivada de contas, perfis e conteúdos por provedores”.

QUAL IMPACTO QUE ISSO TRARÁ NA VIDA DO USUÁRIO COMUM?

De acordo com o advogado e coordenador de liberdade de expressão do Interlab, Artur Pericles Lima Monteiro, o principal efeito da MP será a criação de uma espécie de "censura colateral". Ele explica que a MP dá poderes ao Poder Executivo para regulamentar normas, com um texto subjetivo, que poderá moldar as plataformas a moderar conteúdos seguindo uma régua definida pelo governo federal, o que não é o ideal.

"Na nossa visão, há uma armadilha no texto que é a captura das regras das plataformas pelo governo, que em si, é um ato contra a liberdade de expressão. A MP diz que o conteúdo para ser excluído precisa de uma ‘justa causa’, mas não diz o que é essa motivação. No geral, vai ser o Poder Executivo que vai ditar o que vai remover ou não. Os departamentos jurídicos das plataformas acabam adotando a visão de quem tiver no governo", afirma.

"Liberdade de expressão é proteger que os governantes possam ser criticados. Quando a MP cria um modelo regulatório que dá esse poder ao governo, para moderar conteúdo, ela viola diretamente a liberdade de expressão"

Artur Pericles Lima Monteiro

Advogado e coordenador de liberdade de expressão do Interlab

Para Lima Monteiro, na prática, os usuários deverão ver menos restrições a conteúdos de desinformação e discurso de ódio do que o que existe atualmente, além de começar a seguir uma linha definida pelo Poder Executivo.

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Novas regras precisam ser aprovadas pelo Congresso para não caducar Crédito: Pexels

MUDANÇA NAS REDES SOCIAIS POR MP DESMONTA MARCO CIVIL DA INTERNET

A MP dá 30 dias, a partir do 6 de setembro, para que as plataformas se adequem às novas regras. A medida provisória tem validade por 120 dias e precisa da aprovação do Congresso Nacional para se tornar lei, em definitivo.

No parlamento, a principal crítica é a regulamentação via MP, sem a discussão prévia no Congresso Nacional, pois traz alterações ao que foi aprovado no Marco Civil da Internet, de 2014, que previa em seu texto a liberdade de expressão nas plataformas on-line.

Para a advogada especialista em Direito Administrativo, Cristina Daher, que tem acompanhado o debate em torno da liberdade de expressão na internet, um debate desta natureza não pode ser minimizado a uma medida de caráter provisório, já que é uma mudança elementar na internet, que necessita de ser debatido e não deve ser feito às pressas.

"Existem, sim, elementos sobre a liberdade de expressão nas redes sociais que precisam ser debatidos. Alguns deles já foram pontuados no Marco Civil da Internet. É preciso saber por que as plataformas bloqueiam algumas pessoas e outras não. Agora o aspecto como isso foi pautado, por medida provisória, e da forma como foi trazido, trouxe muito menos a questão dos esclarecimentos, e mais da natureza política que vivemos", afirma.

"Ficou parecendo uma tentativa do presidente de evitar que aconteça no Brasil, o que aconteceu com o presidente Trump nos Estados Unidos"

Cristina Daher

Advogada especialista em Direito Administrativo
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