O senador capixaba Fabiano Contarato (Rede) questionou, de forma incisiva, o subprocurador da República, Augusto Aras, sobre o conceito de família somente como a união de um homem e mulher, e se ele aceita tratamento de cura gay. Esses pontos constam em uma Carta de Teses e Princípios da Associação Nacional de Juristas Evangélicos (Anajure), assinada por Aras.
Homossexual, casado e com filho, o parlamentar fez a pergunta na sabatina a que o subprocurador está sendo submetido nesta quarta-feira (25) pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Os integrantes votaram a indicação de Aras pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL) para exercer o comando da Procuradoria-Geral da República (PGR) pelos próximos dois anos. Depois, os senadores da CCJ aprovaram, com 23 votos favoráveis, 3 contrários e um em branco, a indicação.
Contarato iniciou sua fala questionando "quais os motivos levaram o presidente a escolher Vossa Excelência? Qual a importância da PGR para o governo?". Em seguida, pontuou que todas as conquistas da população LGBTI não se deram pelo Poder Legislativo, o que considerou uma "vergonha". Após esta contextualização, o senador questiona sobre o documento assinado por Aras, no qual o item 7.1 diz que: "a instituição familiar deve ser preservada como heterossexual e monogâmica".
"Todos somos iguais perante a lei, senhor procurador. Eu sonho o dia em que eu chegarei a essa comissão ou à tribuna do Senado e vou ter orgulho de dizer que vivo num estado democrático de direito. Que ninguém vai ser julgado pela cor da pele ou pela sua orientação sexual, por ser idoso ou jovem, por ser mulher, por ser índio. Porque todos somos brasileiros. Eu quero muito que esse dia chegue logo. (Mas) Eu quero sim que o senhor me responda se eu tenho família. Eu quero sim que o senhor me responda se eu estou doente", complementou, recebendo aplausos de alguns colegas senadores.
A RESPOSTA
No momento de sua resposta, Aras afirmou que assinou o compromisso com a Anajure sem ler em detalhes os pontos descritos. Ele ainda afirmou não acreditar na cura gay.
"Fui contactado pela Anajure, e ela me levou a pauta. Confesso que imediatamente eu não li aquela pauta inteira, depois fui ler, e vi que apenas o item 7, que Vossa Excelência se resigna, realmente tem um enfoque que está superado pelas decisões do STF. Não quero jamais dizer a Vossa Excelência, nem a ninguém, que não tenha família. Eu sou um cidadão deste tempo, e que estuda culturas, não posso deixar de compreender todos os fenômenos sociais, que podem ser apreensíveis cognitivamente, e posso te dizer: respeito muito Vossa Excelência, tenho amigos e amigas que tem casamento homoafetivo. E o casamento, como contrato, deve merecer toda a proteção".
O subprocurador acrescentou que considera que o Direito Previdenciário foi mais avançado do que o Direito Civil, quanto aos direitos dos homossexuais. "Quando, sob o Código Civil de 1916, o casamento era exclusivamente entre homem e mulher, já havia o reconhecimento da união homoafetiva pela Previdência. Então, a minha única ressalva é de ordem formal. Me sentiria muito mais confortável, por mim, e por meus amigos e amigas, que tem casamento, se houvesse uma legislação, uma norma constitucional, em que eu não leia 'homem e mulher', mas eu leia 'pessoa', 'cidadão', 'cidadã', porque a Constituição disciplina a matéria de uma forma não contemporânea".
Aras ainda afirmou que os cidadãos devem ter direito de livremente escolher sua opção sexual.
"Eu não entendo essa dinâmica intitulada cura gay como algo científico. Eu entendo que a medicina já busca em várias áreas compreender a identidade de gênero não só a partir de homem e mulher, mas compreender o direito sagrado de cada cidadão a escolher na idade adequada sem influência de quem quer que seja a sua opção de gênero. Cura gay é uma dessas artificialidades pela qual eu não tenho nenhuma consideração de ordem científica".
OUTRAS QUESTÕES
Os senadores Marcos do Val (Cidadania) e Rose de Freitas (Podemos) também estiveram na sessão da CCJ. Do Val não chegou a fazer nenhuma pergunta. Já Rose questionou o subprocurador sobre as políticas para as mulheres.
"Novamente um tema que encabeça a nossa luta é a violência contra a mulher. Infelizmente a marca nesse país, do desrespeito com as mulheres, as estatíticas estão presentes em dados, e as ONGs em defesa das mulheres mostram que mais de 821 registros de violência doméstica , das quais 129 resultaram em mortes. Eu gostaria de saber uma posição de Vossa Senhoria sobre essa grave realidade."
Na pergunta, Rose emendou sobre a questão de 30% das obras do governo federal estarem paradas e inacabadas. "As consequências são graves, mais de R$ 10 bilhões de sangria nos cofres públicos, gastos sem nenhum retorno para a sociedade, sem geração de emprego, sem renda. Há ainda a paralisação das creches. Elas impediram mais de 1 milhão de vagas, dificulta que as mães vão para o mercado de trabalho. Quais serão as medidas do senhor na chefia da PGR para destravar esses impasses que constantemente prejudicam o futuro do país?".
Aras respondeu que o Ministério Público tem todo interesse em contribuir para fortalecer o enfrentamento à violência contra as mulheres. "Tem feito através da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão. Um caso emblemático foi o da garota encarcerada no Paraná que estava juntamente com a população masculina. Da nossa parte o fortalecimento do enfrentamento da violência o contra a mulher se fará muito mais pelo CNMP, porque lá estão os representantes do MP nos Estados, e as políticas públicas que desenvolvem lá, atingiriam todo Brasil. Há maior espectro de atuação. Em relação às creches não acabadas, o MPF pode instar seus membros a fazer uma fiscalização", disse.
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