Com a função de aplicar punições disciplinares aos deputados em caso de transgressões, a Corregedoria da Assembleia Legislativa do Espírito Santo, que já ficou por quatro anos sob o comando do deputado Hudson Leal (Republicanos), vai continuar sendo chefiada por ele pelos próximos dois anos.
O histórico do órgão é o de não aplicar punições a parlamentares. Nas palavras do próprio Hudson Leal, o cargo de corregedor é pouco concorrido, não atrai o interesse dos colegas. Ele já ficou na função entre os anos de 2015-2016 e 2019-2020. Além dele, outros quatro deputados compõem o colegiado (veja abaixo) e eles também têm poder de decisão quanto aos rumos das apurações.
O último processo disciplinar que determinou sanção na Casa foi em 2009, quando o então deputado Robson Vaillant (na época, no DEM) foi punido pela Assembleia com afastamento do cargo após ser denunciado pelo Ministério Público do Espírito Santo (MPES) pela prática de rachid, ao coagir servidores a repassar parte de seus salários.
Nos últimos dois anos, a Corregedoria da Assembleia chegou a receber casos de repercussão envolvendo os deputados Capitão Assumção (Patriota) e Sergio Majeski (PSB), mas que acabaram arquivados. Embora seja tratado pelos deputados como um cargo interno de menor destaque, o corregedor é quem tem acesso às denúncias de irregularidade que chegam à Casa e tem influência sobre o que ganha prosseguimento ou não.
É, portanto, um cargo que exerce uma espécie de poder entre os deputados. O atual corregedor é correligionário do presidente da Assembleia, Erick Musso (Republicanos) e aliado da Mesa Diretora eleita.
A forma como o próprio Hudson chegou ao cargo pela primeira vez, em 2015, demonstra que a cadeira não é totalmente desprezada pelos deputados. Naquele ano, ele e o então deputado Sandro Locutor (que era filiado ao PPS) protagonizaram uma disputa pela função. Os dois montaram as respectivas chapas e levaram a disputa ao limite, a ponto de precisarem decidi-la em plenário, numa apertada votação, vencida por Hudson.
Na última gestão de Hudson, um dos casos que chegaram à Corregedoria foi em 2019, quando o MPES encaminhou à Assembleia manifestação recebida de um cidadão contra Majeski por causa das palavras usadas por ele, da tribuna da Assembleia e em entrevista na televisão, para criticar a aprovação de um projeto do MPES que criou 307 cargos comissionados na estrutura da instituição.
O deputado declarou que a aprovação a jato dos dois projetos teria sido resultado de uma "troca de gentilezas", revelando a "relação altamente promíscua entre as instituições". Por isso, houve o pedido de instauração de um processo por quebra de decoro parlamentar, que não foi adiante.
Pouco menos de um mês depois, o pedido de investigação foi em face de Assumção, também por possível quebra de decoro, devido ao discurso em que o deputado ofereceu R$ 10 mil do próprio bolso para quem matasse o assassino de uma jovem. Foi o procurador-geral da Assembleia, Rafael Teixeira de Freitas, quem apresentou uma notícia de fato, representando a Mesa Diretora, para que o caso fosse apurado.
A situação ganhou repercussão nacional e também foi alvo do MPES, além de receber manifestações de repúdio de diversas entidades. No entanto, o relator, o então deputado Euclério Sampaio (no DC, na época) deu parecer favorável pelo arquivamento baseando-se na imunidade parlamentar. Os demais membros votaram a favor do parecer.
Em um outro episódio envolvendo Majeski, em 2020, foi aberto um procedimento na Corregedoria para apurar a denúncia de que o parlamentar teria se valido dos serviços de um advogado, lotado em seu gabinete, para mover ações que seriam de cunho pessoal.
O deputado esclareceu, na época, que o advogado o representou somente em casos ligados à sua atuação parlamentar e alegou ser vítima de retaliação e perseguição pelo órgão.
Nos últimos anos, observou-se também na tramitação dos processos disciplinares pouca clareza sobre os procedimentos. A Corregedoria da Casa deveria se reunir sempre às terças-feiras à tarde, mas somente são realizadas reuniões caso seja necessário deliberar sobre a distribuição dos processos.
Segundo resolução da Assembleia, qualquer parlamentar, cidadão ou pessoa jurídica pode apresentar denúncia contra deputado por descumprimento ao previsto na legislação. Denúncias anônimas não são admitidas. Há deputados que relatam, contudo, que já foi iniciado processo com base em denúncia feita em nome de um cidadão que se encontrava foragido da Justiça.
Segundo o deputado Hudson Leal, sua recondução ao cargo foi acordada entre todos os deputados e essa é uma função na qual "ninguém tem interesse".
"Nenhuma decisão é só minha. Não há um grande poder, é um órgão colegiado. Não tenho a caneta sozinho. E a finalidade da corregedoria é apenas aplicar o regimento interno. Se a denúncia cumprir todos os requisitos, dar prosseguimento", afirmou.
Segundo ele, há três processos do último ano em tramitação no órgão, ainda estão em fase de instrução. Ele considera importante que o titular tenha um filtro sobre o que recebe, já que sempre há o interesse político de quem denuncia.
"O Ministério Público também cobra andamento, na maioria dos casos. Tem que ter muita sabedoria para não expor as situações. E em muitos casos, o fato também está na Justiça, então é bom esperar uma manifestação de lá", pontua Hudson.
Escolhido como vice-corregedor, o deputado Marcelo Santos (Podemos) também classifica a Corregedoria como um órgão sensível.
"Tem que ter muita sensibilidade para não ter uma decisão veloz e equivocada, ou muito retardada, que cause prejuízo para a própria Casa. Para isso, tem que ter figuras com experiência, que vão saber agir sem o calor da emoção", afirma.
Os deputados Hudson Leal (Republicanos) e Marcelo Santos (Podemos) receberam 27 votos favoráveis e nenhum contrário para as funções de corregedor e vice-corregedor da Assembleia Legislativa, durante a sessão ordinária híbrida desta terça-feira (9). Os mandatos vão até 31 janeiro de 2023.
Além de Hudson e Marcelo, também fazem parte da Corregedoria como membros titulares mais três deputados.
Como membros suplentes estão Carlos Von (Avante), Luciano Machado (PV) e Marcos Madureira (Patriota).
Entre as punições possíveis de ser aplicadas pela Corregedoria a deputados, estão advertência, censura, suspensão do mandato por 30 dias do mandato e até a perda do cargo de deputado.
A Corregedoria possui 15 dias úteis para realizar a apuração dos fatos, ouvir a defesa do denunciado e dar o encaminhamento de acordo com o caso.
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