Nas eleições de 2018, o governador do Espírito Santo, Renato Casagrande (PSB), então postulante ao cargo de chefe do Executivo estadual, surpreendeu o mercado político ao escolher a correligionária Jacqueline Moraes (PSB) para ocupar a vaga de vice na chapa.
Na época, Jacqueline, que só tinha exercido um mandato político, o de vereadora de Cariacica, não tinha tradição na militância partidária, mas era conhecida pela militância social, principalmente em movimentos voltados para mulheres negras e periféricas.
Quatro anos depois dessa decisão, Casagrande faz um movimento oposto. Na última terça-feira (19), o governador anunciou que, em 2022, seu candidato a vice será o ex-senador Ricardo Ferraço (PSDB), um homem branco, de centro-direita e político tradicional. Nada fora dos padrões.
Essa mudança brusca de perfil tem influência direta do cenário político e ideológico que se desenhou de lá para cá. Em 2018, quando Jacqueline foi escolhida para vice de Casagrande, o Brasil passava por um momento de fomento de candidaturas femininas.
Dos 13 candidatos que disputaram a presidência na última eleição, duas eram mulheres e cinco tinham mulheres como vice, entre eles Fernando Haddad (PT), que disputou o segundo turno contra Jair Bolsonaro (PL) e tinha Manuela D'ávila (PCdoB) na chapa.
No Espírito Santo não foi diferente. Duas mulheres disputaram o governo do Estado — Rose de Freitas (MDB) e Jackeline Rocha (PT) — e três, dos outros quatro candidatos, escolheram uma mulher para vice.
É claro que Jacqueline não foi escolhida apenas pelo fato de ser mulher. Até porque, havia outros candidatos cotados para o posto, entre eles Lenise Loureiro (Cidadania), ex-secretária de Turismo do governo. Mas, naquele ano, existia uma preocupação entre os socialistas de ter um vice mais voltado para o lado social, que representasse a cara do político que Casagrande queria imprimir.
“A Jacqueline é uma liderança popular importante, uma mulher, negra, com sensibilidade na área social, e se encaixou bem no perfil de vice que eu estava querendo”, afirmou o socialista em entrevista para A Gazeta em agosto de 2018.
As alianças que Casagrande conseguiu aglutinar em torno da própria candidatura naquela eleição também viabilizaram a escolha de Jacqueline. Ele tinha apoio de 18 partidos e definiu a escolha de uma vice da mesma legenda como “necessária para que houvesse um equilíbrio de forças”. Ou seja, evitar conflitos com outras legendas.
A importância de candidaturas femininas não diminuiu em 2022, mas a preocupação, neste ano, é outra. Em um cenário nacionalmente polarizado, a busca do "equilíbrio" tornou-se o foco de muitos candidatos, inclusive Casagrande. Isso ficou explícito na nota enviada pelo governador à imprensa na última terça-feira, quando Ricardo Ferraço foi anunciado vice.
“A frente liderada pelo governador Renato Casagrande deve seguir, nas próximas semanas, com a composição de uma coligação ampla, envolvendo todas as forças políticas capixabas que desejam um Estado forte e equilibrado”, diz um trecho da nota.
Com tradição em um partido progressista e de centro-esquerda, o atual governador ganhou, nos últimos anos, o rótulo de "comunista" diante da ascensão do bolsonarismo no Brasil. A declaração de apoio ao ex-presidente Lula (PT) no último mês pode ter reforçado essa imagem para muitos eleitores, principalmente os antipetistas.
Ter um vice "de direita" é, na atual conjuntura, fundamental para Casagrande mostrar equilíbrio e ampliar o eleitorado. E uma formação puro-sangue (com candidato a governador e vice do mesmo partido) mostra-se inviável em 2022, conforme analisa o cientista político Antônio Carlos Medeiros.
Ricardo Ferraço cumpre bem esse papel. É um político de centro-direita, que transita bem entre o empresariado. E por mais que o governador não encontre tanta resistência nesse segmento, ele não é a figura política mais querida. Ter o apoio dos empresários é importante para qualquer governo, mas não é só isso.
Ricardo também agrega experiência política. Já foi senador, deputado e vice-governador de Paulo Hartung entre 2007 e 2010. É filiado a um partido tradicional, que já exerceu protagonismo na política brasileira. Dificilmente receberia o rótulo de "comunista".
Na avaliação de Antônio Carlos Medeiros, Ricardo Ferraço será uma peça chave para Casagrande angariar apoio de outros partidos políticos. Ele vê uma eleição difícil pela frente e a necessidade de uma ampla coalização.
“A trajetória de Ricardo agrega politicamente apoios a Casagrande. Não apenas na eleição, mas para o pós, caso ele seja reeleito. O governador precisa ter governabilidade e Ricardo soma nesse sentido”, aponta.
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