A proliferação das frentes parlamentares para atuar na defesa dos mais diversos tipos de causas tornou-se uma realidade no Poder Legislativo. Desde o início deste ano, na Assembleia Legislativa do Espírito Santo, já foram criadas 43. Dos 30 deputados, 14 são autores de grupos desse tipo - que atuam sobre debates mais específicos da sociedade. Tem Frente Parlamentar em Proteção aos Ciclistas Capixabas; em Defesa do Pagamento das Indenizações do Processo do Rotativo do Banestes; em Defesa dos Povos Indígenas; de Enfrentamento ao Câncer Infanto Juvenil, entre outras. Muitas vezes, esses grupos ajudam os parlamentares a mostrarem serviço quanto a suas bandeiras, aproximando-os do eleitorado. (Veja abaixo a relação completa das frentes parlamentares)
O número é quase o dobro comparado a 2015, que foi o primeiro ano da legislatura anterior. Havia 22 frentes parlamentares na época. E a a intensificação da prática não é exclusividade do Espírito Santo, já que na Câmara dos Deputados já há 282 grupos criados, enquanto em 2015 eram menos de 200.
Na frente parlamentar, vários deputados de vários partidos se unem para debater sobre determinado tema de interesse da sociedade. Essa associação se difere das comissões, que são mais formais, têm reuniões obrigatórias e têm como função discutir e deliberar sobre os projetos de lei. As frentes geralmente atuam em temas mais específicos, se reúnem numa frequência a critério do deputado que preside o grupo, não são decisórias e não têm direito a espaços fixos ou verba. No caso da Assembleia, o assessoramento é efetuado pelos servidores das Comissões Temporárias, que também atendem às CPIs.
Para se criar uma frente desse tipo, o deputado autor da ideia precisa ter o apoio de um terço de seus colegas, o que na Assembleia significa colher 10 assinaturas. Num gesto de coleguismo, um endossa esse tipo de pedido do outro, mas muitas vezes não permanece frequentando as reuniões. Geralmente, nas frentes parlamentares, quem possui o protagonismo é somente o deputado autor.
As temáticas que são mais frequentes são as relacionadas a categorias profissionais, que são 7 ao todo, como por exemplo a Frente Parlamentar em defesa dos Motoristas de Aplicativos, ou a de Valorização da Enfermagem. Também há muitas voltadas a segmentos econômicos, como a que atua em defesa do setor do Mármore e Granito, ou em defesa do Comércio e Serviços.
A deputada Janete de Sá (PMN) é a autora do maior número de frentes, com sete, seguida por Iriny Lopes (PT) e Hércules Silveira (MDB), com seis cada.
Algumas convocações para as reuniões das frentes parlamentares são registradas no Diário Oficial da Assembleia, mas isso não é uma exigência. Em alguns casos, inclusive, elas são feitas fora do prédio do Legislativo, e os deputados enviam os convites direcionados aos grupos interessados no tema. Não há nenhuma regra para que as reuniões sejam semanais, ou mensais, por exemplo. Com isso, não há nenhuma forma estruturada do cidadão monitorar as reuniões e os resultados delas.
O deputado Hércules Silveira defende que as frentes são um instrumento importante da atuação do parlamentar. "As comissões acabam tratando dos temas de forma muito ampla. A Comissão de Saúde, por exemplo, tem centenas de assuntos. Mas quando faço a Frente Parlamentar da Violência Obstétrica, conseguimos discutir o problema mais específico, realizar audiências públicas, debater com especialistas, e dali tirar conclusões, que podem nos embasar para cobrar o governo do Estado, criar projetos de lei, e outras medidas", afirma.
Como o lobby não tem regulamentação no Brasil, as frentes acabam se tornando a ponte entre a sociedade civil e o Congresso, já que muitos grupos são criados com apoio de empresas ou entidades.
É o que avalia o deputado Fabrício Gandini (Cidadania), autor de quatro frentes. "Nós somos procurados por setores da sociedade, que gostariam de ter uma voz. Nas frentes, nós conseguimos dar foco a um determinado assunto, e fazer visitas, sugerir ações, traçar panoramas. Não é algo compulsório, mas que dá uma orientação mínima."
Os parlamentares admitem que as frentes também são muito utilizadas para que eles construam um protagonismo em relação aos temas tratados e junto àquela população representada. A deputada Iriny Lopes entende que esses grupos são importantes para qualificar a ação do parlamentar. "É natural que alguns façam para ter uma proximidade maior com sua base. Mas elas são espaços fundamentais de especialização, algo que você não consegue na comissão, que tem o tempo muito limitado para debater os assuntos. Uma frente pode fazer um seminário de um dia inteiro, e os interessados estarão ali. A sociedade atual é extremamente diversificada, e estamos em um momento de grande perda de direitos e conquistas, em que determinadas soluções vão se tornando cada vez mais complexas", avalia.
O grande número de deputados investindo na criação de frentes parlamentares demonstra o chamado "empreendedorismo político", em que cada deputado cuida de seus interesses. Ele utilizam isso como saída para fazer política, sob uma perspectiva individual, mantendo os partidos fracos em programas. Entendem que como não é possível representar a sociedade como um todo, vão investindo nos nichos. Essas são instâncias de articulação política que acabam substituindo os mecanismos formais dos partidos, que são quem deveria encampar as pautas. Outro ponto é que a atuação de alguns deputados no plenário, quando não são líderes, é muito diminuta. E como as comissões têm pouca visibilidade, então eles buscam outras formas de fazer chegar ao seu eleitor o recado de que está trabalhando. Mas vale lembrar que há o risco de que boa parte das frentes criadas não tenham atuação efetiva e que a criação de blocos cada vez mais específicos possa diminuir o poder de pressão em vez de aumentá-lo.
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