A figura do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) orbitará as campanhas eleitorais municipais no Espírito Santo, seja como referência positiva ou negativa. Há uma profusão de políticos tentando se apresentar como legítimos representantes do bolsonarismo, ou da agenda do presidente e, do outro lado, os candidatos que apostam na estratégia do desgaste de Bolsonaro, sobretudo em questões relacionadas à pandemia de Covid-19 e às políticas sociais, para conquistar votos.
A pré-campanha e as convenções partidárias nos municípios já deram uma demonstração que, em algumas cidades, haverá uma disputa entre quem defende e quem se opõe ao presidente, fazendo muita referência à crise econômica e social que o país está vivendo, ao contrário do que se espera das eleições municipais, que focam as questões locais.
Esse posicionamento fora da lógica da eleição local não responde aos maiores desafios que os futuros prefeitos terão que lidar: a melhoria da qualidade da educação, vagas em creches, em postos de saúde, a atração de investimentos, a mobilidade urbana, a assistência à população mais vulnerável.
Com o início da campanha nas ruas, esta semana, e na TV e no rádio, nos próximos dias, a tônica de cada candidato vai estar mais clara para os eleitores, mas nas convenções partidárias já houve alguns sinais. Em Vitória, no evento que lançou Capitão Assumção (Patriota), que se coloca como o mais fiel depositário do ideário de direita, o agora candidato ergueu uma caixa de cloroquina, fez menções a Deus e a Bolsonaro, e saiu em defesa da implantação de escolas cívico-militares na Capital e do reforço no combate à criminalidade.
Em aparições com candidatos aliados, reforçou também o conservadorismo. "Elegemos Bolsonaro para governar o Brasil, e foi uma importante etapa. Agora a etapa fundamental é que nós possamos eleger os nossos conservadores em todo o Brasil. Ligados a Bolsonaro, aos movimentos de preservação da família, de preservação do emprego e renda", disse, ao apoiar o também bolsonarista Luciano Merlo (Patriota), em Colatina.
Em outro espectro, o candidato João Coser (PT) fez críticas indiretas a Bolsonaro e a seus aliados durante a convenção do PT de Vitória. "Nós não agredimos, não ameaçamos, não oferecemos dinheiro para matar ninguém. Nós defendemos a dignidade humana, os direitos humanos, o SUS. Nós somos diferentes", disse.
Ele e outros candidatos a prefeito pelo PT, como Célia Tavares, em Cariacica, também participaram de uma live com a ex-presidente da República, Dilma Rousseff (PT), onde não faltaram críticas ao presidente.
"A integração dos quatro municípios (da Grande Vitória) vai ser importante para potencializar os recursos de vocês. No governo Bolsonaro não existe uma política de auxílio aos municípios. Essa vocação que o PT sempre teve de se articular com governadores e prefeitos mesmo que eles não sejam de partidos aliados, o Bolsonaro não tem", pontuou Dilma.
Além de Assumção e Coser, há candidatos como Lorenzo Pazolini (Republicanos) e Halpher Luiggi (PL), também na Capital, que, embora não se vinculem ou citem o presidente, focam algumas das pautas prioritárias do bolsonarismo, como o conservadorismo, a família e os valores religiosos.
No campo da esquerda, além do PT, as candidaturas do PSOL (Gilbertinho Campos), do PCdoB (Namy Chequer) e do PSTU (Raphael Furtado) também demonstram que em alguns momentos vão fazer críticas à gestão federal e associar a ela os problemas de Vitória.
O fenômeno não é exclusivo da Capital. Em Vila Velha, enquanto há bolsonaristas como Amarildo Lovato (PSL), que ao definir seu projeto, diz que "o nosso papel é defender a direita, o projeto do Bolsonaro", há a candidatura de Rafael Primo (Rede), que se coligou ao PT e também alfineta o governo federal. "Escolhemos unir forças para mostrar coerência frente ao retrocesso e ao autoritarismo", declarou.
Sendo Bolsonaro o presidente da situação, na Serra e em outros municípios, como Guarapari, as candidaturas que tentam se vincular a ele são em maior número do que as que se alinham à oposição. Do flerte com o liberalismo econômico ao conservadorismo moral, passando pela pauta armamentista, candidatos tentam mostrar identificação com os valores mais caros a Bolsonaro.
Vandinho Leite (PSDB) e Alexandre Xambinho (PL) têm dado ênfase a algumas pautas bolsonaristas e se vinculado a movimentos de direita. O mesmo em Guarapari, com Oziel de Sousa (PSC) e Cláudio Paiva (PRTB).
E a situação também já é uma realidade nos municípios dos outros Estados, sobretudo Capitais. Em São Paulo e no Rio de Janeiro, por exemplo, Celso Russomano e Marcelo Crivella, ambos do Republicanos, preparam uma ofensiva para atrair empresários e líderes bolsonaristas, além do apoio formal do próprio presidente. Já Guilherme Boulos, candidato do PSOL em São Paulo, já declarou que o "grande tema da eleição é derrotar o bolsonarismo".
Assim como em Vitória, a Capital paulista contabiliza muitos candidatos de partidos de esquerda: 7, ao todo. Frente à incapacidade da esquerda em se unir, pode-se esperar também um número maior de vozes para se opor ao bolsonarismo.
Dada esta amostra pelos posicionamentos já expressados na pré-campanha no Estado, existe o risco de que temas ideológicos que não têm a ver com a realidade dos municípios acabem ganhando corpo e desvirtuando o que deveria ser mais importante na discussão eleitoral, segundo especialistas.
Contudo, a prioridade dada a esses assuntos está muito mais vinculada à conduta dos candidatos, do que dos eleitores, para o doutor em Ciência Política e pesquisador João Gualberto Vasconcellos. Mas cabe saber se isso é algo em que os eleitores embarcarão.
"Quem quer tirar proveito da figura de Bolsonaro são os candidatos, seja para se alinhar a ele, ou para bater. Mas o alinhamento ou não ao presidente não é o mais relevante. Independentemente de quem será o prefeito, as políticas do Bolsonaro serão feitas. Quanto aos eleitores, as pautas que geram engajamento são as mais vinculadas aos problemas municipais. Há cidades em que o importante tem sido falar de royalties; em outras, de estradas; ou ainda de agricultura, drenagem, prevenção a enchentes. É isso que a população precisa questionar aos candidatos nas ruas", avalia.
Como o eleitor médio em muitos casos não sabe como funciona a divisão de competências entre as esferas federal, estadual e municipal e, ainda, entre Executivo e Legislativo, algumas propostas, se apresentadas com viés muito ideológico, também podem distorcer os debates eleitorais.
Um debate sobre a saúde pública da cidade pode ficar limitado a uma discussão se médicos terão liberdade para utilizar remédios sem comprovação científica ou não; sobre a qualidade da educação, candidatos podem tentar vinculá-la a questões de disciplina e valores morais. E para a segurança pública, que tem forte apelo com o presidente, podem aparecer propostas que não têm aplicabilidade por um município, já que a principal atuação é do Estado.
O sociólogo e cientista político da UFRJ Paulo Baía pontua que foi comum em outros pleitos como na época do governo Lula, por exemplo que algumas candidaturas tentassem fazer um vínculo com o governo estadual ou federal, quando ele estava bem avaliado, para pegar carona no prestígio, mas vinculando às pautas locais.
Por pragmatismo, a maioria dos candidatos pode preferir não se posicionar sobre temas nacionais, mas pode investir em valores que estão sendo muito explorados, como ocorreu com a pauta anticorrupção, nos anos anteriores.
"Eles leem, estudam as pesquisas. Vão investir nos valores que elas indicam, e a questão conservadora é uma das questões que pesa, porque a sociedade brasileira tem viés conservador grande. O problema é que, trazida para o campo municipal, essa questão fica desconectada", analisa.
Como a pauta de 2020 é uma volta à discussão sobre saúde, emprego e renda por conta da crise gerada pela pandemia, e o empobrecimento da grande massa de eleitores, outra forma de explorar a posição do presidente é relacionando ou não esses problemas a ele..
"Há uma enorme insatisfação por causa do desemprego e da queda de renda, ao mesmo tempo em que o custo de vida sobe, com encarecimento de alimentos, água, luz e remédios, o que pode ser trazido para a realidade local. E por conta da pandemia, essas eleições deverão girar primordialmente em torno da estrutura de saúde dos municípios, o acesso ao sistema, a qualidade da rede e dos profissionais de saúde. Candidatos também podem prometer que vão conseguir apoio ao governo federal", explica Baía.
O doutor em Sociologia e professor do Departamento de Ciências Sociais da Ufes Igor Suzano Machado também destaca que os candidatos que polarizam podem ajudar a eleger pelo menos os seus vereadores.
"Não saberemos se isso atrapalhará a eleição, mas estará presente. Certamente alguns desses nichos vão se eleger. Mas hoje temos em média 30% do eleitorado que apoia o presidente, 30% que desaprova, e outros 30% que flutuam. Se vincular muito a esse tema é uma aposta alta a se fazer. Mas para algumas candidaturas, isso compensa. Se colocar em apoio ou oposição ao presidente é o ponto de partida. É um discurso mais simples de ser entendido", aponta.
Paulo Baía também assinala que esta prática é mais observada nas 95 cidades do país com mais de 200 mil eleitores, que por terem segundo turno, são palco de uma discussão política mais complexa.
"Bolsonarismo ou antibolsonarismo, direita ou esquerda, podem ser mais determinantes para a escolha de um candidato no segundo turno do que as propostas para a cidade, o que é um erro. Já nas cidades menores, que são a maioria, esse aspecto é menos relevante. Tanto é que é há vários casos alianças entre PSL e PT, por exemplo. O que pesa são os grupos políticos locais", avalia.
O prefeito é o chefe do Poder Executivo municipal, o que quer dizer que ele chefia a administração da cidade. É ele quem coordena todo o trabalho no setor público e estabelece as metas e prioridades da prefeitura.
Serviços públicos
O prefeito tem o dever de implementar as políticas públicas que se comprometeu a fazer durante a campanha, que devem ser discutidas com a população. É função do prefeito implementar ações, manter e gerir os funcionários dos equipamentos das seguintes áreas:
É função do prefeito implementar ações, manter e gerir os funcionários dos equipamentos das seguintes áreas:
Recursos
A receita do município, em impostos e taxas, fica sob a gestão do prefeito, que deve arrecadar, administrar e aplicar os recursos para custear obras, serviços e políticas essenciais da cidade.
Os impostos e taxas municipais são o IPTU, ISS e ITBI.
Há as taxas, como a de iluminação pública ou de coleta de lixo;
Municípios recebem parte dos tributos federais e estaduais, como o repasse de 22,5% dos recursos recolhidos pelo Imposto de Renda e pelo IPI; 25% do ICMS.
Há ainda as transferências obrigatórias, que possuem destino definido por lei, como o
Fundo Nacional do Desenvolvimento da Educação e do Fundeb, para a educação, e os recursos do SUS, para a saúde.
Algumas cidades recebem royalties, compensações pela exploração do petróleo.
Prefeitos também fazem acordos com os governos estadual e federal, e com os deputados estaduais, federais e senadores para conseguir o repasse de recursos. Por meio de convênios ou emendas, podem viabilizar obras e trazer programas para a cidade.
Normas
O prefeito deve elaborar a Lei Orçamentária Anual, definindo em que áreas os recursos serão aplicados, e submetê-la à Câmara, que pode alterá-la através de emendas.
Também deve cumprir as leis aprovadas pela Câmara, além de submeter suas contas à fiscalização, que ocorre com o auxílio do Tribunal de Contas Estadual.
Em relação à Câmara municipal, ele possui a função de se manifestar pela sanção ou o veto de leis. Também pode propor novas leis, que são submetidas à análise da Câmara e da sociedade.
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