Desde a metade dos anos 1970, apenas quatro prefeitos comandaram a Serra. Alternando-se em dois ciclos, que passam por 11 eleições realizadas, primeiro José Maria Miguel Feu Rosa (PTB) e João Baptista da Motta (PSDB), e depois Sergio Vidigal (PDT) e Audifax Barcelos (PP), revezaram-se como chefes do Poder Executivo serrano nos últimos 48 anos.
Para efeito de comparação, no mesmo período, iniciado em 1976, o Brasil teve 11 presidentes da República, em um intervalo que inclui o fim da ditadura militar e o terceiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Já no Espírito Santo, 10 governadores passaram pelo Palácio Anchieta, ainda que, desde 2003, apenas Paulo Hartung e Renato Casagrande (PSB) tenham se alternado no comando do Executivo estadual.
No caso da Serra, três possibilidades se desenham para as Eleições 2024, em outubro, de forma a manter ou acabar com esse ciclo de duplas se revezando no poder. Líder da intenção de votos na pesquisa Ipec divulgada no dia 2 de setembro, Audifax Barcelos tem a chance de, se eleito, fazer perdurar o ciclo de quase 30 anos com Vidigal.
Já Weverson Meirelles (PDT) pode até chegar à prefeitura como um nome novo, caso ganhe a eleição. Mas terá sido alçado ao poder como herdeiro político de Sergio Vidigal, que o escolheu para sua sucessão – ou seja, o grupo político no comando do Executivo serrano seguirá o mesmo. Restam, então, cinco candidatos que podem dar fim ao domínio político dos últimos anos: Antonio Bungenstab (PRTB), Igor Elson (PL), Pablo Muribeca (Republicanos), Professor Roberto Carlos (PT) e Wylson Zon (Novo).
Caso qualquer um desses cinco saia vitorioso nas urnas, chegará ao fim uma era que começou em 1976, ainda durante a ditadura militar, com a eleição de José Maria Miguel Feu Rosa (então na Arena) para o comando do Executivo serrano. Àquela época, o município ainda era majoritariamente rural, em que poucas famílias tradicionais controlavam a política, entre elas a Feu Rosa.
"Zé Maria" Feu Rosa saiu vitorioso na segunda eleição municipal após o golpe militar de 1964. Na época não havia reeleição e o mandato durou seis anos.
Feu Rosa foi sucedido por João Baptista da Motta (PMDB), o Mottinha. Eleito em 1982, era oposição ao regime militar e representou uma ruptura na gestão, em um período no qual a Serra iniciou seu processo de industrialização, com a inauguração da então Companhia Siderúrgica de Tubarão (CST) – hoje ArcelorMittal Tubarão. Ele cumpriu mandato regular, saindo do cargo em 1987, depois de perder as eleições para seu antecessor.
Feu Rosa (então no PTB) assumiu novamente o cargo de prefeito serrano em 1988. Assassinado em junho de 1990, ele não concluiu seu segundo mandato, e o vice Adalto Martinelli assumiu a vaga. Em 1992, o resultado das eleições municipais garantiu a João Baptista da Motta a volta ao comando do município.
O final da gestão de Mottinha, em 1996, inaugura um dos mais longevos revezamentos entre prefeitos de que se tem memória em território capixaba: a "era Vidigal-Audifax", que dura até os dias atuais. Justamente em um período em que a industrialização e a atração de novas empresas avançaram na Serra.
Sergio Vidigal (PDT) assumiu o cargo de prefeito pela primeira vez em 1997. Geriu a Serra até 2000 e foi reeleito para seguir administrando a cidade até o final de 2004. No pleito de 20 anos atrás, Vidigal, impossibilitado de concorrer ao terceiro mandato consecutivo, decidiu apostar em Audifax Barcelos, que era seu secretário de Administração e estava filiado ao PDT na época.
A aposta feita por Vidigal deu certo e Audifax terminou a disputa eleito com 111.887 votos nas eleições de 2004, garantindo a permanência do PDT no comando da cidade. Porém, ocorreu um rompimento em 2008, quando a legenda decidiu barrar a candidatura do então prefeito à reeleição, optando por investir no nome de Vidigal, que almejava voltar a administrar a Serra.
O desfecho das eleições de 2008 foi positivo para Vidigal, possibilitando seu retorno à prefeitura. Já na condição de adversários políticos, em 2012, o pedetista sofreu um revés e perdeu a reeleição para Audifax, eleito para seu segundo mandato de prefeito pelo PSB.
O confronto se repetiu em 2016 e Audifax saiu novamente vitorioso nas urnas sobre Vidigal. Em 2020, atendendo ao que determina a legislação eleitoral, ele não disputou a continuidade no cargo e decidiu investir no nome do então vereador Fabio Duarte (Rede) para a sucessão. No entanto, Vidigal foi quem venceu a corrida eleitoral, iniciando em 2021 o mandato que deve terminar em dezembro deste ano.
Para o professor de História Filipe Savelli , pesquisador e membro do Laboratório de História das Interações Políticas Institucionais da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), a perpetuação da alternância de gestões na Prefeitura da Serra está relacionada à falta de quadros capazes de manter a mesma dinâmica implantada pelos últimos governantes do município. Ele também chama a atenção para os feitos que ficam na memória do eleitor.
Conforme o especialista, os últimos gestores da Serra – Audifax e Vidigal – têm em comum a habilidade de conseguir alinhamento junto ao Executivo estadual e de se manterem neutros, ou aliados, em relação ao governo federal.
Por fim, Savelli frisa que, se por um lado a administração conduzida por nomes que se alternam no poder pode dar à população a garantia de um mandato bom – caso o retrospecto seja favorável –, por outro atrapalha a renovação, correndo o risco de abrir caminho para o que ele chama de "político aventureiro e sem experiência" assumir a prefeitura.
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