Ainda que a maior preocupação do brasileiro seja neste momento como enfrentar o novo coronavírus e a crise financeira que se desenha para depois da pandemia, outra questão já começa a bater à porta: é seguro manter a data das eleições de 2020? Quais os riscos ao se remarcar o pleito ou até estender o mandato dos atuais prefeitos e vereadores para depois de dezembro deste ano?
Para o ex-juiz eleitoral e professor em Direito eleitoral Juacy dos Santos Loura Júnior, o adiamento das eleições precisa ser tratado com mais cuidado. Presidente do Colégio de Ouvidores do Tribunal Regional Eleitoral de Rondônia (TRE-RO), ele lembra que estender mandato político destoa do período determinado pela Constituição, algo que é considerado uma cláusula pétrea dela, ou seja, que não deveria ser mudado. Uma alteração para aumentar o período de uma gestão, por conta da pandemia, abriria um precedente perigoso, que pode motivar presidentes, por exemplo, a adotar a mesma medida no futuro.
O tema será tratado por ele nesta segunda-feira (27), às 19h, em uma palestra virtual promovida pelo Tribunal Regional Eleitoral do Espírito Santo (TRE-ES), em parceria com a Comissão de Direitos Políticos e Eleitoral da Ordem dos Advocados do Brasil - seccional Espírito Santo (OAB-ES) e a Escola Superior de Advocacia (ESA-ES). Em entrevista para A Gazeta, Loura Júnior contou sobre as expectativas na Justiça Eleitoral e como o tema tem sido tratado internamente.
O futuro presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Luís Roberto Barroso, assumirá a Corte no final de maio e já afirmou que, se for necessário, as eleições podem ser adiadas, contando que seja pelo prazo mínimo possível. Juacy dos Santos Loura Júnior explica que a decisão de mudar a data do pleito precisa de aprovação do Congresso Nacional, já que o dia da votação é fixado para os primeiros dias de outubro na Constituição Federal. Dessa forma, a mudança só seria possível por uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC).
Ao menos seis propostas já tramitam no Congresso, entre as que tomam mais força estão a do deputado federal Paulo Guedes (PT-MG), que transfere o dia da votação para dezembro, e do deputado federal Aécio Neves (PSDB-MG), que sugere a unificação das eleições em 2022.
"Se for necessário adiar, que seja pelo prazo mínimo possível", afirma Loura Júnior. "Cancelar o pleito não está nem no radar. Neste momento há duas datas importantes para os próximos 90 dias: o dia 6 de maio, que é a data limite para os eleitores tirarem novos títulos ou fazer alguma mudança; e o dia 20 de julho, quando começam as convenções e o corpo a corpo. Sobre os títulos, o sistema permite a mudança pela internet. Ou seja, até o dia 20 de julho pode haver mudanças, então o melhor é esperar."
Em pesquisa feita pelo jornal "O Estado de S.Paulo", ouvindo os parlamentares, ainda faltariam mais de 100 votos dos 308 necessários para aprovar a PEC, que precisa passar em dois turnos na Câmara e no Senado para ser chancelada.
Caso as eleições sejam adiadas para depois do fim do mandato dos atuais prefeitos e vereadores, que se encerra no dia 31 de dezembro de 2020, seriam os juízes que assumiriam as prefeituras, como já está previsto na legislação.
Contudo, não há um entendimento sobre quem iria ocupar as cadeiras de vereadores. "É uma questão tão sui generis (peculiar) que não dá para imaginar o que aconteceria. Há a máxima de que poder não fica vácuo, alguém poderia ocupar, mas os antigos vereadores, por exemplo, não poderiam continuar legislando. Veja que loucura", analisa.
Embora haja quem trate as eleições deste ano com menor importância, o advogado eleitoral afirma que "democracia não é artigo de luxo" e chama a atenção de que uma mudança de legislação para estender mandato abre um precedente perigoso e pode ser um risco para a jovem estrutura institucional brasileira.
Em um possível adiamento da eleição para algumas semanas, de forma que ela ainda aconteça neste ano, uma das mudanças seria a análise das contas dos atuais gestores. Com o prazo mais curto entre o resultado do pleito e o fim do mandato, é possível que os Tribunais de Contas não tenham analisado a gestão de todos os prefeitos antes de se iniciar o novo mandato.
Loura Júnior também destaca que por mais que o pico da pandemia seja contornado, o pleito seja ele realizado em outubro, novembro ou dezembro pode ter algumas medidas para evitar a disseminação do vírus. "Acredito que no dia da votação ainda deverá se ter algum cuidado para evitar aglomerações, talvez ainda tenha que se usar máscara, ou manter distância, mas esperamos que não seja nada que inviabilize o pleito", pondera.
A palestra com o advogado eleitoral faz parte de uma série de entrevistas ao vivo, no canal do TRE-ES no YouTube. O evento on-line contará com a mediação da juíza Wilma Chequer Bou-Habib e do presidente do TRE-ES, Samuel Meira Júnior. A transmissão começa às 19 horas. Acesse pelos links: https://bit.ly/EJE-ES e www.tre-es.jus.br/o-tre/eje.
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