A presença de policiais e bombeiros militares e policiais civis na política capixaba pode aumentar após as eleições de 2020. A Grande Vitória já conta com pelo menos 11 pré-candidatos ligados às forças policiais, apalavrados com partidos, para disputar o cargo de prefeito. A lista pode aumentar, uma vez que os integrantes das tropas podem se filiar até a data limite de registro de candidaturas estabelecida pela Justiça Eleitoral, no dia 26 de setembro.
De acordo com levantamento de A Gazeta, com base nos pré-candidatos elencados pelas executivas estaduais das legendas, 23 militares em todo o Espírito Santo já se colocam na disputa pelas prefeituras capixabas. Com isso, a probabilidade é que a eleição deste ano tenha número recorde de candidatos militares nos últimos 20 anos.
Vitória e Viana podem ser as cidades com mais candidatos com carreira em forças policiais no Estado. Na Capital, os deputados estaduais Lorenzo Pazolini (Republicanos), delegado da Polícia Civil, e Capitão Assumção (Patriota), da reserva da Polícia Militar, devem testar os seus nomes nas urnas na corrida pela prefeitura. Outro que também pretende disputar a eleição é o Coronel Nylton Rodrigues (Novo), ex-secretário estadual de Segurança Pública e ex-comandante-geral da Polícia Militar, que está na reserva.
Já em Viana, o vereador Cabo Max (PP) e o sargento Martins (PTB), ambos da PM; e o policial rodoviário federal Willys Lira (MDB) também foram apontados por seus partidos como pré-candidatos a prefeito.
Em Cariacica, estão em pré-campanha o subtenente dos Bombeiros Assis (Patriota) e o vereador e cabo da reserva da PM Joel da Costa (PSL). Na Serra, o PRTB aposta no nome do Capitão da PM Anderson Martins, enquanto o PSC lança a delegada da Polícia Civil Gracimeri Gaviorno como pré-candidata a prefeita.
Já em Vila Velha nenhum partido apresentou pré-candidato militar, contudo, o tenente-coronel dos Bombeiros Wagner Borges tem se movimentado para disputar a prefeitura e é apontado como pré-candidato por forças políticas da cidade.
Desde que as profissões passaram a ser colocadas no registro de candidaturas no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em 2000, o maior número de militares candidatos a prefeito foi em 2008, com quatro membros da categoria que se apresentaram para assumir os Executivos municipais.
O único prefeito militar no Espírito Santo é o Coronel Welinton (PV), em Iúna. Antes dele, apenas um militar havia chegado ao cargo no Estado, o cabo da Polícia Militar Dejair Camata, o Cabo Camata, que governou Cariacica entre 1997 e 2000, quando morreu em um acidente de carro.
As associações de classe dos policiais e bombeiros no Estado fazem parte de um movimento criado em 2004, mas que, pela primeira vez, atuará com foco maior nas eleições municipais. O presidente do Projeto Político Militar (PPM), o major da PM Lúcio Bolzan, explica que o objetivo de aumentar a participação dos militares na eleição se deve a um sentimento da categoria de que eles estão sendo afastados da política nos últimos anos e defende que eles podem contribuir à frente dos Poderes também.
"O policial e o bombeiro conhecem, no dia a dia, as mazelas. Atuam onde o Estado não deu certo, onde as necessidades não são atendidas. Por isso, ele sente muitas vezes que pode contribuir mais. O PPM é apartidário e atua dando consultoria estratégica e jurídica para quem quer ser candidato, independentemente de ser de direita ou de esquerda. Ficamos sem voz durante muito tempo, não podíamos falar nada e nem reivindicar. Só recebíamos cobranças. Isso foi um dos fatores que levaram à greve da PM, em 2017. Esse movimento de maior participação política é algo que está acontecendo em todo o país", afirma Bolzan.
Além dos pré-candidatos a prefeito mencionados nesta reportagem, conforme as diretrizes aprovadas em reunião com os líderes das associações, o Projeto Político Militar pretende abrir cerca de 170 vagas para candidaturas a vereador, limitadas a 20% das cadeiras nas Câmaras de cada município.
Onde houver um volume superior de interessados, haverá plebiscito entre a tropa, para escolher quem preencherá as vagas. A categoria também pretende lançar candidatos a prefeito em todos os municípios que houver militares interessados. Onde houver mais de um nome, o PPM votará internamente para escolher um candidato para apoiar.
O fenômeno de candidaturas de policiais no país coincide com o crescimento de movimentos conservadores nos últimos anos. Para especialistas, a consternação dos brasileiros com a violência no Brasil, aliada à popularidade de programas policiais na TV, tem feito com que o perfil de militar passe a ser visto como possível representante político.
Está em debate na Câmara dos Deputados um projeto de lei para estabelecer uma quarentena para ex-juízes que queiram disputar as eleições. Para Antônio Lucena, o ideal é que a proposta também atingisse os militares.
No entanto, o cientista político acredita que o prazo de inelegibilidade deles deve ser menor que os oito anos que estão sendo propostos. "Um ano já seria o suficiente para que eles se dissociassem de suas corporações e pudessem disputar os cargos. Se não forem eleitos, também defendo que possam retomar suas atividades", aponta.
Para o cientista político Fernando Pignaton, o corporativismo entre militares já é uma marca das instituições policiais brasileiras. No entanto, ele destaca que elas não podem ser politizadas, já que devem servir, como estabelece a Constituição, como uma ferramento do Estado.
"As polícias não podem ter vontade própria para se articular politicamente. Os militares, quando entram para a carreira no Estado, fazem um juramento. As forças armadas estão abaixo da hierarquia dos Poderes Legislativo e Executivo, que são eleitos pela população. Quando se permite essa politização militar, essa hierarquia é desgastada. Vimos isso no Espírito Santo, durante a greve da PM, em 2017, que se repetiu depois em outros Estados. O Executivo não pode ficar refém de sua polícia. Um grupo político de dentro da corporação, ao meu ver, é um caminho aberto para o surgimento de caminhos intermediários, de milícias, e isso não pode acontecer", opina.
Para Bolzan, do PPM, não há "perigo" em levar a política para dentro das corporações militares e qualquer tipo de restrição à participação de policiais na eleição é antidemocrática.
"A classe política, daqueles que a veem como uma carreira pessoal e não um serviço para a sociedade, se sente ameaçada com o envolvimento de policiais que querem contribuir. Esse de discurso, na minha opinião, é de quem tem medo de perder espaço. Mas acredito que este movimento seja irreversível, independentemente do que virá pela frente. Os policiais querem ter voz, isso é um movimento que tem acontecido em todo o Brasil", afirma.
Militares têm regras específicas para participar de eleições. É proibido, por exemplo, que sejam filiados a partidos durante os períodos em que estiverem em serviço. Diferentemente de outros servidores, que terão que deixar seus cargos até agosto, três meses antes da eleição, militares têm um prazo maior. Neste ano, eles têm até o dia 26 de setembro para se afastar de suas funções.
Se eleitos, eles também precisam deixar a carreira militar. Se tiverem menos de 10 anos de serviços, são afastados da atividade e só podem retornar após o fim de seus mandatos. Caso tenham mais de 10 anos de carreira, eles são automaticamente aposentados e ficam impedidos de retomar o serviço.
Já os policiais civis precisam se afastar de seus cargos quatro meses antes da eleição ou, no caso de delegados, até seis meses antes. No entanto, eles não precisam deixar suas carreiras ao fim de seus mandatos. Para o caso de policiais civis eleitos como vereador, eles até podem, inclusive, continuar trabalhando mesmo após tomar posse nas Câmaras.
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