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Itapemirim: uma cidade do ES marcada pela instabilidade política

Itapemirim: uma cidade do ES marcada pela instabilidade política

Para além do dinheiro do petróleo que jorra na cidade do Sul do Estado, brigas e reviravoltas políticas têm se tornado comuns. Já há até quem chame o município de "Sucupira", em referência a folclórica cidade da novela "O Bem-Amado"

Publicado em 12 de setembro de 2019 às 19:04

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Até a polícia foi chamada numa das vezes em que a Câmara aprovou o afastamento do prefeito. (Internauta Gazeta Online)

Não é apenas dinheiro do petróleo que jorra em Itapemirim, cidade do Sul do Espírito Santo com 34 mil habitantes. Tramas e atritos envolvendo prefeito e vereadores e a instabilidade política têm sido a marca do município nos últimos anos.

Há quem se refira a Itapemirim até como "Sucupira", a folclórica cidade da novela "O Bem-Amado", de tão curiosos os reveses e decisões que de lá surgem.

Vez ou outra o prefeito Thiago Peçanha (PSDB), interino, é afastado pela Câmara. Horas depois ele "volta", por decisão judicial, sem nunca ter deixado, de fato, o cargo. Esse vaivém também já se dá entre os próprios vereadores.

Um deles - Waldemir Pereira Gama (PRP), aliado do prefeito - teve o mandato extinto pelo presidente da Câmara, Mariel Delfino Amaro (PCdoB). E, no mesmo dia da publicação da decisão, houve a suspensão, mais uma vez, pelo Judiciário, que tem sido demandado para resolver os imbróglios.

Em meio a tudo isso, Itapemirim comemorou 204 anos de emancipação política na semana passada com uma grande festa, com direito a shows de Matheus e Kauan, Bell Marques, Thaeme e Thiago e Revelação.

Não se pode dizer que a instabilidade política do município remonta a tempos tão antigos. Mas também não é de hoje. Na gestão de Alcino Cardoso, em 2004, por exemplo, o prefeito chegou a ser afastado mais de uma vez, tanto pela Câmara como pela Justiça. E, nos intervalos, era reconduzido ao cargo.

O mesmo ocorreu com Luciano Paiva (sem partido). Eleito em 2014, era substituído, nas ocasiões em que estava afastado, pela vice Viviane Peçanha. Mesmo alvo de diversas denúncias, Paiva foi reeleito em 2016 e assumiu o mandato em janeiro do ano seguinte.

Desde o dia 26 de abril de 2017, no entanto, devido a mais um afastamento, quem comanda a prefeitura é Thiago Peçanha, o vice. Como é a relação entre os dois? Depende de a quem você pergunta. Entre os aliados de Peçanha, a resposta é que Paiva nem é visto em Itapemirim. Entre os opositores, a história é que o prefeito afastado e o interino estão unidos.

Há, ainda, um terceiro personagem, co-protagonista de tudo isso, o próprio presidente da Câmara. Se Peçanha fosse afastado, seria ele, Mariel Delfino Amaro, que assumiria a prefeitura. Ele chegou até a assinar atos com prefeito interino durante o último afastamento de Thiago Peçanha aprovado pela Câmara. Há quem veja nesse resultado o objetivo mesmo dos afastamentos aprovados pelo Legislativo.

O presidente da Câmara não concedeu entrevista. Aliás, os principais personagens da política de Itapemirim esquivam-se de questionamentos. Thiago Peçanha respondeu, por escrito, apenas a perguntas enviadas previamente.

Thiago Peçanha é prefeito interino de Itapemirim. (Facebook Thiago Peçanha)

Para ele, o motivo da instabilidade política na cidade tem nome e sobrenome: Theodorico Ferraço (DEM), deputado estadual e ex-prefeito de Cachoeiro de Itapemirim. A esposa dele, a deputada federal Norma Ayub (DEM), já foi prefeita de Itapemirim.

“Theodorico Ferraço e Norma Ayub sempre colocaram seus interesses pessoais e políticos acima da cidade. Isso resultou em um ambiente de forte instabilidade e delinquência política, cujo mentor é o deputado Ferraço e sua esposa Norma, a beneficiária direta. O objetivo de prejudicar e perseguir adversários com denúncias falsas”. Peçanha sustenta que o presidente da Câmara foi “atraído” por Theodorico.

Questionado sobre sua ligação com Luciano Paiva, Peçanha, mais uma vez evoca o deputado, mas admite que firmou um “pacto de não agressão” com o antecessor: “Ferraço tentou se aproximar de Luciano Paiva para agredir a gestão atual e cooptar seus vereadores contra nós. Em razão disso, propus um pacto de não agressão ao grupo de Luciano, para proteger a cidade da eterna instabilidade”.

RESPONSABILIDADE

Ex-assessor parlamentar e aliado do presidente da Câmara a ponto de se apresentar como porta-voz deste, Plínio Marcos Leal* diz que se as coisas andam mais movimentadas na cidade de uns tempos pra cá isso deve ser creditado, sim, ao Legislativo, mas positivamente. “Mariel assumiu com esse comportamento, de vigiar e cobrar do Executivo respostas para atos que não são compatíveis. O mundo está em crise e Itapemirim com abusos, como essa festa mais recente”, afirmou.

“Essas manobras do Thiago para impedir investigações geram mal-estar na Câmara. Tem quem interprete (as decisões do presidente da Câmara) como perseguição, mas são decisões fundamentadas com responsabilidade. Existe interesse na transparência de cada movimento político de Itapemirim”, complementa.

“O que é de interesse da população, aprovamos normalmente. O que é interesse eleitoreiro, o que geralmente está chegando, não estamos aceitando”, resume o vereador Rogério da Silva Rocha (PCdoB), que integra a oposição a Peçanha. Ele ressalta que a Câmara também derruba vetos do prefeito quando há interesse público. Como exemplo, cita o reajuste no valor do auxílio-alimentação para servidores.

Waldemir Pereira Gama (PRP), o Bill, conseguiu reverter a decisão de extinção do próprio mandato após ser alvo de denúncia de incompatibilidade para exercer a função de vereador por já ocupar outro cargo público.

Ele faz outra leitura sobre a relação entre Executivo e Legislativo: “É um município que tem muito recurso e muita rivalidade política. O presidente da Câmara demonstra a intenção de ocupar a cadeira do prefeito. Há muita dificuldade de se colocar em pauta os projetos do Executivo”. Bill também já foi presidente da Câmara e acredita não ser coincidência tantas reviravoltas em ano pré-eleitoral.

NA ASSEMBLEIA

O embate político na cidade vai além dos limites de Itapemirim. A 134 quilômetros de distância, em Vitória, é na Assembleia Legislativa que deputados já adotaram um lado nessa disputa. Euclério Sampaio (sem partido) é do time de Thiago Peçanha.

“É uma cidade conturbada politicamente. Resolvi ajudar o prefeito, que tem vontade de fazer algo pela cidade. É uma vergonha aquela Câmara. É um monte de grupo querendo tomar a cidade de assalto, isso atrapalha a administração da cidade, independentemente de quem seja, é uma guerra para tomar o poder”, avalia. Um irmão do prefeito interino é assessor parlamentar do deputado.

Na outra ponta está Theodorico Ferraço, adversário do atual prefeito e, como já se pode depreender, a recíproca é verdadeira. “A instabilidade política em Itapemirim ocorre pelo excesso de dinheiro, que desperta o interesse de políticos malandros, de dentro e de fora da cidade, que vão para lá se locupletar. Em vez de saúde, educação, querem o dinheiro para enriquecimento ilícito”, afirma Theodorico. Ele diz que a esposa, Norma Ayub, não será candidata a prefeita da cidade: “Jamais”.

Procurado por meio de sua defesa, Luciano Paiva não deu retorno.

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*Este texto foi atualizado às 19h03 do dia 12/09/2019. Na versão anterior, Plínio Marcos Leal era identificado como assessor parlamentar. De acordo com o Portal da Transparência da Câmara de Itapemirim, no entanto, ele foi desligado da função em julho.

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