Acusado de atuar como empresário do agronegócio e se dedicar às atividades relativas a uma granja localizada em Muniz Freire, deixando de lado as funções como juiz da Vara Única de Venda Nova do Imigrante, Valeriano Cezário Bolzan foi condenado pelo Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES) à aposentadoria compulsória, pena máxima em Processo Administrativo Disciplinar (PAD) contra magistrado.
A pena foi defendida pelo relator do caso, desembargador Raphael Câmara, e recebeu o apoio de outros 19 desembargadores, em votação iniciada no dia 6 de julho e encerrada na sessão desta quinta-feira (19) do Tribunal Pleno. O juiz está afastado do cargo desde novembro de 2022, quando o TJES determinou a abertura deste PAD e de um outro, ainda em julgamento no Tribunal.
Ele ainda pode recorrer da decisão, mas, se a pena for confirmada, o magistrado vai receber uma aposentadoria com valores proporcionais aos 20 anos de atuação como juiz.
No PAD concluído nesta quinta-feira, Valeriano foi alvo de sete acusações, sendo a maior parte diretamente ligada ao exercício de atividades como empresário, o que é proibido por lei aos juízes. Eles podem apenas ser sócios, mas não podem administrar uma empresa.
Por conta de sua atuação no agronegócio, Valeriano passou a ser citado por advogados como "juiz das galinhas", conforme destacaram diversos desembargadores ao longo da votação.
Ele também é acusado de usar servidores do Fórum de Venda Nova para realizar serviços particulares para ele, na granja Viva Frangos Ltda, localizada em Muniz Freire, a cerca de 40 quilômetros da sede da comarca sob a sua responsabilidade. A propriedade tem 10 galpões com capacidade para 33 mil frangos de corte em cada um deles, segundo informações apuradas pelo TJES.
Embora esteja registrada desde 2020 em nome da esposa e da sogra do juiz, na prática, a granja é do magistrado e era gerida por ele, segundo o relator.
Outra conduta que motivou a aplicação da pena máxima ao juiz foi a assinatura de uma decisão em meio à greve dos caminhoneiros de 2018 que beneficiou, indiretamente, a granja que seria do magistrado.
O desembargador Helimar Pinto, em voto apresentado na sessão desta quinta, citou essa acusação como a mais grave e ressaltou que "há proporcionalidade entre a punição pretendida e os fatos narrados".
Mais novo entre os desembargadores, Fábio Brasil também acompanhou o relator nesta quinta e considerou que"a pior das condutas — embora todas estejam no mesmo patamar — foi fazer com que servidores comandassem audiências".
Para se dedicar às atividades empresariais, em muitas oportunidades, Valeriano teria designado servidora comissionada para conduzir audiências no Fórum de Venda Nova. "Perde toda a condição de exercer a magistratura", acrescentou Brasil.
Em sessão anterior, o desembargador Pedro Valls Feu Rosa, decano do Tribunal — desembargador que está há mais tempo em atuação lá —, considerou o uso de espaço dentro do fórum como moradia e para a realização de encontros íntimos do juiz como a conduta mais grave.
Outra situação avaliada no PAD foi o uso do cargo de juiz para obter vantagem ou benefício particular. Nesse ponto, foi mencionada a realização de melhoria em estrada rural que dá acesso à granja Viva Frangos promovida pela Prefeitura de Brejetuba, que disponibilizou patrol, caçamba e carregadeira para aplicação de um revestimento na estrada que fica em Muniz Freire. O maquinário teria ficado, inclusive, nas granjas do juiz.
Esse fato causou muita divergência no julgamento e foi um dos pontos que motivaram os cinco votos divergentes apresentados ao longo da votação, em que os desembargadores defenderam a aplicação da pena de remoção compulsória do juiz, ou seja, que ele fosse transferido de Venda Nova para outro município.
O primeiro voto divergente foi do desembargador Telêmaco Antunes, no último dia 5. Também votaram nesse sentido os desembargadores Dair Bregunce e Eliana Munhós, na mesma sessão, e nesta quinta o desembargador Sérgio Ricardo de Souza. O desembargador Robson Albanez, que havia pedido vista na sessão do último dia 5, declarou-se suspeito e não votou, assim como outros quatro desembargadores.
Último a votar, o presidente do Tribunal, desembargador Fabio Clem, também divergiu do relator. Ele chegou a afirmar que o magistrado estaria sendo punido "pelo conjunto da obra", pois "nenhuma conduta isolada pode resultar na punição máxima" e destacou que ele "é um dos magistrados mais produtivos" do Judiciário capixaba.
O presidente do TJES votou pela aplicação da remoção compulsória ao magistrado, principalmente pelas infrações relacionadas à designação de servidor para realizar audiência no Fórum de Venda Nova, e por descumprir decisão da presidência do Tribunal que determinou que não houvesse apartamento funcional dentro do fórum.
O advogado do juiz afastado Valeriano Cezário Bolzan, Flávio Cheim Jorge, afirmou que "sob o olhar da defesa, a valoração das provas deveria conduzir a um resultado diverso".
Em nota, o advogado disse que "restou comprovado que o Dr. Valeriano Bolzan, além de ser um dos magistrados mais produtivos do Espírito Santo, possui um histórico irretocável de dedicação ao serviço público e ao Poder Judiciário. Assim, ainda que pudessem considerar presentes eventuais irregulares, a conclusão, em nosso sentir, não seria a imposição da penalidade máxima”.
No início do julgamento, em julho, Cheim Jorge chegou a pedir aos desembargadores para que, se o Tribunal entendesse pela aplicação de alguma punição, que fosse a remoção.
Sobre a possibilidade de eventual recurso do juiz contra a pena aplicada, o advogado afirmou que "a decisão é muito recente para essa definição".
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta