O Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES) decidiu, à unanimidade, abrir um Processo Administrativo Disciplinar (PAD) para investigar a conduta do juiz de Direito Marcos Horácio Miranda, titular da 9ª Vara Cível de Vitória. A decisão foi publicada no Diário da Justiça nesta quinta-feira (17).
A suspeita é de que o magistrado tenha nomeado, de forma irregular, pessoas com quem tinha vínculos familiares e de amizade como peritos judiciais para atuar em processos.
Entre as nomeações apuradas está a do cunhado do juiz. O magistrado também teria escolhido o pai e o marido de uma assessora para a função de perito. Os dois, de acordo com apuração preliminar da Corregedoria Geral de Justiça, também são sócios do magistrado em uma empresa.
Além disso, durante passagem pela 13ª Vara Cível de Vitória, o magistrado trocou o administrador judicial do processo de recuperação judicial do grupo Itapemirim. A nomeação envolveu uma empresa de outro Estado, e, segundo o corregedor, "alterou o curso da ação". Uma pessoa do núcleo familiar da esposa do magistrado teria participado do processo.
O PAD tem duração de 140 dias, prorrogáveis, e pode ser arquivado ou resultar em penas que variam de advertência a aposentadoria compulsória. O magistrado tem direito a defesa e o que foi apurado preliminarmente pode ou não ser confirmado.
Em suas considerações, o corregedor-geral, desembargador Ney Batista Coutinho, apontou que as nomeações realizadas pelo juiz não teriam obedecido critérios técnicos, atendendo a "interesses particulares" do magistrado em três diferentes núcleos: familiar, profissional e societário.
No círculo familiar, pelo menos duas pessoas foram nomeadas. Uma delas é o cunhado, que realizou perícias em quatro processos, entre 2017 e 2018, com honorários que variaram entre R$ 4 mil e R$ 8.500. A outra é o concunhado, designado para atuar em processos entre 2014 e 2016, com honorários fixados em R$ 8 mil.
Nos núcleos profissional e societário, o corregedor citou a nomeação do pai e do marido da assessora do magistrado, que, por si só, já configuraria vínculos de amizade. Os dois, contudo, vieram a se tornar sócios do juiz em uma empresa, estabelecendo também uma relação de negócios, "conduta que não é recomendada", destacou o corregedor.
Nesse mesmo núcleo, destaca-se um outro perito, que chegou a ser designado para atuar em 44 processos, tendo honorários que atingiram um montante de 50 salários mínimos em apenas um deles.
De acordo com o corregedor, no curso da apuração preliminar, verificou-se que o perito usava uma das salas do imóvel comercial onde funciona a sede de uma empresa da qual o magistrado é sócio-proprietário e um de seus filhos é administrador.
Essa expressiva atividade empresarial do magistrado chama a atenção do corregedor. Em suas considerações, ele pontou que, na declaração de Imposto de Renda, "foi constatada uma elevação de patrimonial do juiz incompatível com a renda". De acordo com ele, "são fatos que exigem melhor apuração".
O desembargador Ney Batista Coutinho votou pela abertura do PAD e considerou a situação como muito grave. Ele também pediu que o caso tivesse uma investigação mais aprofundada.
O corregedor entendeu não ser necessário determinar o afastamento do magistrado durante a apuração do processo administrativo, dado o "inexistente o risco de comprometimento ao exercício da jurisdição".
Entendo que a postura adotada pelo magistrado sugere favorecimento a interesses particulares, não condizentes com os princípios constitucionais da impessoalidade e da moralidade administrativa, pontuou.
O voto foi acompanhado por todos os membros da Corte, que classificaram como lamentáveis os fatos narrados.
Tomei conhecimento dos fatos e fiquei perplexo. É lamentável, disse o desembargador Willian Silva. A nomeação de pessoas tão próximas ao magistrado, do núcleo familiar, de amizade, e trabalho, levanta questionamentos, acrescentou.
Manifesto minha profunda tristeza pela abertura de mais um PAD contra um magistrado, conhecido, que tenho como amigo. Mas nessa altura dos acontecimentos, é inevitável, disse o desembargador Carlos Simões.
Procurada pela reportagem, a defesa do juiz Marcos Horácio Miranda, representada pelo advogado Raphael Câmara, afirmou que respeita a decisão do tribunal, mas afirmou que "o magistrado não praticou qualquer ilicitude, o que será comprovado no curso do processo disciplinar".
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