> >
Julgamento sobre 2ª instância: teses em jogo e o debate no STF

Julgamento sobre 2ª instância: teses em jogo e o debate no STF

STF começou a discutir nesta quinta-feira (17) o momento em que um condenado deve ser preso. Saiba o posicionamento dos ministros e o que dizem especialistas sobre as teses que estão na mesa

Publicado em 17 de outubro de 2019 às 22:27

Ícone - Tempo de Leitura 0min de leitura
O relator das ações, ministro Marco Aurélio, leu o resumo dos pedidos. Ele será o primeiro a votar na próxima sessão. (Reprodução/TV Justiça)

A primeira etapa do julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF), que vai decidir se a prisão deve ocorrer após condenação em segunda instância ou só quando se esgotarem todos os recursos possíveis, o trânsito em julgado, foi realizada nesta quinta-feira (17) ainda sem a manifestação dos ministros. Foram ouvidos somente os autores das ações e entidades interessadas, que se inscreveram para apresentar argumentos.

O debate será retomado na próxima quarta, dia 23, e o tema deve dividir mais uma vez o plenário do Supremo, opondo, de um lado, o grupo que defende resposta rápida da Justiça no combate à corrupção e, do outro, os que defendem o princípio constitucional da presunção de inocência e os direitos fundamentais dos presos.

A expectativa é de que o placar permaneça apertado e que haja uma mudança no entendimento hoje vigente, de acordo com especialistas. Principalmente por conta do ministro Gilmar Mendes, que em 2016 votou a favor da prisão em segunda instância, mas já indicou que deve mudar de posição. Além dele, a ministra Rosa Weber tem voto decisivo, por ter decidido contra o pedido de Lula de habeas corpus ano passado. Entretanto ela ressaltou que esse voto pode mudar quando se trata do mérito e não de um caso isolado. O presidente da Corte, Dias Toffoli, também tem voto decisivo.

Se mudar de posicionamento, Gilmar se alinharia aos ministros Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio Mello (relator das três ações que serão analisadas pelo plenário) e Celso de Mello, pela execução da pena após o trânsito em julgado. A expectativa de ministros é a de que Rosa Weber também integre essa corrente contra a execução antecipada de pena, totalizando cinco votos com este entendimento.

De outro lado, ficariam os ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Luiz Fux, Luís Roberto Barroso e Cármen Lúcia, que defendem a possibilidade de prisão após condenação em segunda instância. Há ainda uma tese, defendida por Toffoli, de que a pena poderia ser cumprida depois de uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), como uma espécie de terceira instância.

A mudança de entendimento poderia beneficiar 4.895 presos, pois, segundo o CNJ, esse é o número pessoas que tiveram mandados de prisão expedidos pelo segundo grau (Tribunais Regionais Federais e dos Tribunais de Justiça) no país. O CNJ não possui dados detalhados por Estado.

MOMENTO

Nos últimos dez anos, o plenário do Supremo enfrentou esse tema ao menos cinco vezes, na maioria delas ao analisar casos concretos de pessoas condenadas, e o último foi o do ex-presidente Lula. Agora, o tribunal vai julgar o mérito de três ações que tratam do assunto de maneira abstrata, sem estar atrelado a um determinado réu.

Para o professor de Direito Penal da Universidade Presbiteriana Mackenzie, Marco Aurélio Florêncio, um dos principais pontos que precisam ficar claros com esse julgamento são os efeitos dessa decisão, ou seja, se valerá para todos ou não. Isso porque a prisão em segunda instância deveria ser entendida como uma possibilidade que precisa de uma decisão fundamentada do juiz para ser adotada. Porém, alguns tribunais de segunda instância, como o TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região), que analisa os recursos da Lava Jato, têm determinado a prisão indiscriminada de todos os condenados em segundo grau, o que estaria extrapolando o entendimento do STF sobre o tema.

Para ele, apesar de dificilmente haver modificação das condenações no STJ - o mais comum é somente uma redução da pena - , esperar o trânsito em julgado dá mais segurança jurídica ao réu. "Se é aplicada uma pena de 6 anos e o STJ reduz para 4, significa que vai cumprir pena restritiva de direitos, e não de privação de liberdade. Nesse tempo em que ficou presa, quem vai reparar o dano? No final das contas, será o Estado. Hoje em dia, a maioria das decisões do STF e STJ não demoram tanto a sair, a maioria pode ser tomada monocraticamente. Então, argumentar o aumento de demanda nas Cortes não é uma afirmação verdadeira", avalia.

Florêncio também rebate o argumento de que os maiores beneficiados seriam os réus poderosos, como os da Lava Jato, por terem condições de recorrer até a última instância. "Na Lava Jato, muitas penas se deram através de acordos da delação premiada, fechados entre o réu e Ministério Público, e homologados pelo juiz, sem apresentar recursos."

INTERPRETAÇÕES

Já o doutor em Direito Constitucional e professor de Direito Penal da Ufes, Pedro Ivo de Sousa, defende que não seja adotada uma decisão que foca somente na consequência, como por exemplo, a Lava Jato. Ele pontua que da forma como está hoje, os princípios constitucionais não estão sendo desrespeitados.

Este vídeo pode te interessar

"No 2º grau, há o esgotamento da análise dos fatos, e na maioria das vezes isso é o suficiente para iniciar a execução. É diferente de definir o que é o direito: o que é crime torpe, por exemplo. Quando se prega o respeito à presunção da inocência para o trânsito em julgado, é importante entender sua aplicação. Pois se pensarmos que essa é uma presunção absoluta, ninguém poderia ser preso nem preventivamente, por exemplo. Mas o sistema não é assim, ele é dinâmico. Nenhum sistema é perfeito, mas como está hoje, está adequado à Constituição", avalia.

Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem

Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta

A Gazeta integra o

The Trust Project
Saiba mais