O senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e os deputados federais Tabata Amaral (PDT-SP) e Felipe Rigoni (PSB-ES) apresentaram nesta segunda-feira (01) alterações no texto do projeto da Lei das Fake News. Entre as mudanças sugeridas está a retirada de definições de termos como desinformação, o que vinha sendo amplamente criticado por especialistas e parlamentares por colocar em risco a liberdade de expressão dos usuários. A nova versão do texto foi encaminhada para o relator do projeto no Senado, o senador Ângelo Coronel (PSD-BA). A proposta deve ser votada nesta terça-feira (02).
O projeto de Lei 2630/2020, de autoria de Alessandro Vieira, cria a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet, mais conhecida como "Lei das Fake News". O objetivo principal é impedir a disseminação de desinformação nas redes sociais e por meio de aplicativos de mensagens, como o WhatsApp, algo que tem se tornado frequente em meio à pandemia de coronavírus e também se fez presente nas eleições de 2018. Tabata e Rigoni possuem um projeto semelhante na Câmara dos Deputados.
Para combater a circulação de conteúdos falsos, o projeto inicial estabelecia a criação de canais de denúncia, dentro das plataformas, além de uma equipe para checagem de fatos que, ao identificar conteúdos falsos, deveria avisar os usuários. Parte da proposta, contudo, foi alvo de críticas no Congresso e também por especialistas, já que não há um consenso técnico para a definição do que é desinformação, o que poderia gerar censura aos usuários.
Para reduzir os questionamentos e a resistência do Congresso, os parlamentares apresentaram uma sugestão de alteração no texto do projeto.
A versão original conceituava desinformação como "conteúdo, em parte ou no todo, inequivocamente falso ou enganoso, passível de verificação, colocado fora de contexto, manipulado ou forjado, com potencial de causar danos individuais ou coletivos, ressalvado o ânimo humorístico ou de paródia". O texto, contudo, não especificava quem ou qual instituição determinaria se o conteúdo é "falso ou enganoso". Apenas estabelecia que as empresas criassem equipes para verificação das mensagens.
Na nova versão, o PL deixa de tratar de temas como desinformação e processo de verificação e foca o combate a contas falsas e robôs usados para disseminar conteúdo na internet.
O novo texto não proíbe a moderação de conteúdo, mas prevê que isso seja feito de forma transparente, dando o direito de recurso ao usuário e vetando a exclusão de qualquer mensagem, mesmo que ela venha a ser rotulada como "fake news".
"Temos uma preocupação grande com transparência e proteção ao usuário, principalmente a liberdade de expressão. Ele precisa ser notificado antes da moderação de conteúdo, para que ele possa recorrer dessa decisão possa e questionar, dizer que a plataforma está equivocada. A lei proíbe a excluir qualquer publicação alegando fake news, isso é prejudicial à liberdade do usuário. Caso a informação seja rotulada dessa forma, o usuário precisa ser notificado", afirma a deputada federal Tabata Amaral.
Vieira, Rigoni e Tabata concederam entrevista coletiva virtual, nesta segunda, sobre o tema. Eles elaboraram as mudanças no texto em conjunto. Alessandro Vieira é autor do projeto no Senado. Já na Câmara, Tabata e Rigoni possuem um PL semelhante. As alterações serão incorporadas nas duas propostas.
Algumas regras para identificação dos responsáveis por impulsionar conteúdos e anúncios nas redes sociais também foram incorporadas no texto. O projeto determina que os usuários das contas sejam identificados, assim como sua localização. Além disso, deixa de limitar o compartilhamento de mensagens em aplicativos, passando a apenas recomendar que isso seja feito por meio de políticas nas plataformas.
"A gente reforça a necessidade de o usuário apresentar algum tipo de identificação e recomenda a limitação de contas por usuário. As pessoas precisam saber se elas estão conversando com outras pessoas ou robôs, é preciso transparência", ressalta Tabata.
As sanções previstas no projeto vão desde advertência, com indicação de prazo para adoção de medidas corretivas; multa; suspensão temporária das atividades da plataforma e até proibição de exercício das atividades no país.
"A responsabilização das plataformas não é pelo conteúdo, até porque o marco civil nos proíbe disso. As plataformas são responsáveis na lei por um processo de transparência em todas as moderações que fazem e também por combater contas falsas e automatizadas. É por isso que elas serão responsabilizadas e não por alguém postar ou não conteúdo falso", finaliza Tabata.
Com a retirada da definição do que é desinformação do texto, o projeto sugere que seja criado um grupo, organizado pelo Comitê Gestor de Internet no Brasil, para debater o conceito do termo e as formas de combate. Resultados deste trabalho devem ser apresentados dentro de um ano.
De acordo com os parlamentares, as alterações no texto já foram encaminhadas ao relator do projeto e não devem interferir no trâmite no Congresso. Eles acreditam que, com as mudanças, o projeto será aprovado sem grandes dificuldades.
"Existe um consenso no Congresso que é preciso enfrentar essa questão. Estamos fazendo um trabalho colaborativo com o relator, as mudanças trazidas no texto não são novas, mas um compilado de críticas e questões técnicas que já haviam sido estabelecidas", diz Vieira.
"Na Câmara a gente tem conversado sobre o assunto com vários parlamentares e todos muito conscientes do grande problema que é a desinformação. Tirando a crítica da definição do termo, fica ainda melhor. Acredito que não tenhamos maiores dificuldades para isso [aprovação do projeto de lei]", destaca Rigoni.
O projeto de lei 2630/2020 ganhou o apelido de "lei das fake news". O termo fake news (notícias falsas) é amplamente usado para definir conteúdos falsos ou enganosos compartilhados via redes sociais e aplicativos de mensagens. No entanto, a utilização dele é criticada por estudiosos da área, que preferem usar a palavra desinformação. A expressão, de acordo com a pesquisadora britânica Claire Wardle, líder da iniciativa First Draft, não explica a complexidade de todas as formas de mentira que existem hoje. "Muitas das informações mais poderosas têm a forma visual. Não são sites que parecem notícias. Além disso, muito conteúdo problemático não é falso. É genuíno, mas usado fora de contexto", explicou para A Gazeta em 2018. Outro problema é que o termo fake news já serviu ao discurso de líderes autoritários de todo o mundo como arma, afirmou a pesquisadora. O objetivo é desacreditar o trabalho da imprensa quando não gostam de alguma notícia (tipo de texto jornalístico).
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