O deputado estadual Sergio Majeski (PSB) virou réu em uma ação de improbidade administrativa proposta pelo Ministério Público do Espírito Santo (MPES). O MP acusa Majeski de enriquecimento ilícito ao permitir que um de seus assessores de gabinete, que é advogado, atuasse em processos que, para o promotor de Justiça Rafael Calhau Bastos, são de cunho pessoal.
Ao receber a ação, a juíza Heloísa Cariello, da 4ª Vara da Fazenda Pública Estadual, registrou que a prova documental sobre as supostas irregularidades é suficiente para a abertura do processo. Ela pontua que, nesta fase, não cabe à Justiça analisar o mérito – a questão principal – da ação. Somente no decorrer da tramitação e, principalmente, no momento da sentença, é que vai ser definido, pela magistrada, se houve ou não irregularidade.
"A petição inicial é acompanhada de prova documental suficiente à demonstração preliminar de que tem arrimo em supostas ilegalidades perpetradas pelos requeridos, especialmente no que tange à utilização das instalações e estruturas da Assembleia Legislativa para a formulação de petições iniciais, propostas e assinadas pelo requerido Rafael Carvalho Junqueira, em favor do requerido Sergio Majeski", escreveu a juíza.
O ex-técnico sênior de gabinete de representação parlamentar Rafael Junqueira, que trabalhava com Majeski, também é réu no caso. Alegando questões pessoais, ele pediu para ser exonerado no último dia 2 de fevereiro. Por decisão judicial, ele estava impedido de atuar como advogado enquanto permanecesse no escritório do deputado.
De acordo com a denúncia do Ministério Público, Rafael Junqueira atuou em um processo movido pelo deputado contra o ex-presidente da Prodest (Instituto de Tecnologia da Informação e Comunicação do Estado) Renzo Colnago, acusado de usar perfis falsos nas redes sociais para publicar mensagens difamatórias contra o parlamentar.
Junqueira também atuou em uma ação contra o governo estadual, apontando irregularidades na seleção para a contratação de professores em designação temporária (DT). Para o Ministério Público, como era servidor comissionado, Junqueira estava submetido ao regime de trabalho em tempo integral na Assembleia. O órgão ainda acusa Majeski de permitir que o advogado produzisse as peças jurídicas em horário de trabalho e utilizasse as dependências do Legislativo estadual.
Nos autos, a defesa do deputado e do ex-assessor pontua que há diferença entre exercício do regime de dedicação exclusiva, quando não é permitido o trabalho em outra ocupação, e de dedicação integral, como estabelece a regra estadual, em que os servidores devem cumprir todas as horas de contrato a que são submetidos. Ou seja, é permitido o exercício da advocacia, desde que fora do horário de trabalho.
A defesa dos dois ainda alega que cabe, exclusivamente, à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) a aplicação de sanções ao exercício da advocacia. Eles também negam que tenha havido enriquecimento ilícito ou dano ao erário na conduta de Majeski e do ex-assessor. Além disso, eles argumentam que os dois casos em que Rafael Junqueira atuou eram de interesse do mandato do deputado e não eram de cunho pessoal.
Por meio de nota enviada à reportagem, a assessoria de imprensa do deputado ressaltou, nesta segunda, que o recebimento da ação apresentada pelo MPES, ou seja, o fato de Majeski ter se tornado réu, não quer dizer que a Justiça tenha considerado, de pronto, que ele fez algo errado. "Informamos que o recebimento da inicial se dá como formalidade na qual o Juízo concede ao Ministério Público o direito de provar suas alegações. Não há juízo de culpabilidade nesta fase", diz o texto.
A Gazeta também tentou, sem sucesso, contato com Rafael Junqueira.
Atuações como a do ex-assessor de Majeski não são incomuns na Assembleia Legislativa do Espírito Santo. Reportagem publicada por A Gazeta, em maio de 2020, mostrou que ao menos dez assessores atuaram nos últimos anos como advogados de deputados estaduais em processos que poderiam ser considerados de cunho pessoal.
Entre os casos, há ações de inventário e partilha de herança, cobrança de contratos, pedido de indenização, contratos de locação de imóveis, crimes contra a honra, entre outros. Segundo especialistas, não há irregularidade neste tipo de atuação desde que ocorra fora do horário de serviço e com pagamento aos advogados-assessores.
No levantamento, foram identificados casos nos gabinetes de Carlos Von (Avante), Euclério Sampaio (DEM), Fabrício Gandini (Cidadania), Hércules Silveira (MDB), Hudson Leal (Republicanos), Iriny Lopes (PT), Marcelo Santos (Podemos), Rafael Favatto (Patriota), Torino Marques (PSL) e Vandinho Leite (PSDB).
A partir de 2017, o Ministério Público Estadual também deu início a uma investigação sobre suspeitos de atuar como servidores fantasmas, ou seja, que recebiam salários sem trabalhar. Em suma, o órgão apontava como frágil o sistema de "comprovação de atividades" na Casa, que impossibilitava a fiscalização externa do trabalho dos assessores e cobrou, em 2019, que a Assembleia publicasse relatórios mensais sobre a atuação dos servidores externos.
Naquele mesmo ano, o Legislativo estadual aprovou, em sessão extraordinária, uma resolução que afrouxava a regra e revogava a obrigação dos assessores externos entregarem relatórios mensais. Desde então, não há mais nenhuma determinação que os impeça de exercer outras funções remuneradas durante o horário em que são pagos para prestar serviços aos parlamentares.
No mesmo dia em que a resolução foi aprovada, os deputados estaduais deram aval para a criação de 307 cargos de assessores no Ministério Público. Majeski, na época, votou contra os novos cargos e fez críticas ao órgão ministerial. O então procurador-geral do MPES, Eder Pontes, acionou o Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES) para cobrar explicações do deputado após as críticas e apontou possível quebra de decoro parlamentar. Majeski disse "achar estranho" o fim dos relatórios mensais – que era uma cobrança do MP – ser aprovado no mesmo dia em que a Assembleia autorizava a criação de cargos no órgão ministerial. Para o parlamentar, a ação do procurador foi vista como uma "retaliação".
Majeski voltou a falar sobre o assunto durante pronunciamento na sessão desta terça-feira (23). Ele criticou, mais uma vez, o Ministério Público por fazer acordo com um servidor fantasma, como mostrou o colunista Vitor Vogas, para não denunciá-lo – o servidor vai devolver parte do salário e pagar multa –, ao mesmo tempo que "se preocupa" e adota "preciosismo" ao analisar a atuação de um assessor dele.
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