Apontado pela Polícia Federal (PF), no relatório que culminou no indiciamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e de outras 36 pessoas, como um dos responsáveis por atrapalhar as investigações que miram tentativas de golpe de Estado iniciadas após a eleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 2022, o senador Marcos Do Val (Podemos) citou filme estrelado pelo ator Will Smith como referência para sua atuação nas ações investigadas pela PF.
As ações de Marcos Do Val são citadas em 53 das 884 páginas do documento da PF, mas o parlamentar não está entre os indiciados. O contexto em que o senador faz referência ao filme com o astro de Hollywood acontece durante troca de mensagens entre o político capixaba e a deputada federal Carla Zambelli (PL-SP).
No diálogo anexado pela polícia no relatório que embasou o indiciamento dos investigados por tentativa de golpe à democracia, o parlamentar celebra o fato de uma revelação sua à revista Veja, no início de fevereiro de 2023, ter causado grande repercussão na imprensa, abrindo caminho para abertura da CPMI visando à apuração dos atos golpistas de janeiro do ano passado.
Na entrevista, Do Val sustentou ter sido coagido por Bolsonaro, em dezembro de 2022, a gravar de maneira ilegal uma possível conversa com o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, então presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O ex-deputado federal Daniel Silveira também teria participado do plano.
A ideia, segundo o senador, era tentar chegar a um ponto do diálogo em que o magistrado, sem saber da gravação, fizesse alguma declaração comprometedora e que pudesse ser usada em seguida para questionar o resultado das eleições de 2022. Objetivo principal era anular a eleição de Lula.
A Polícia Federal afirma no relatório que nas mensagens trocadas com Zambelli, Marcos Do Val sustenta ter usado "a história de gravar Alexandre de Moraes" para chamar a atenção da imprensa e, com isso, conseguir aprovar a CPMI do 8 de janeiro.
A troca de mensagens entre os dois parlamentares ocorreu em 26 de fevereiro de 2023, segundo a PF. No texto das conversas, o contato atribuído a Do Val chama atenção para a repercussão de suas declarações sobre o plano para gravar Alexandre de Moraes na imprensa.
"Bom, acho que consegui chamar a atenção da imprensa, né? Agora vamos para a CPI", afirma o senador em uma das mensagens enviadas para a deputada bolsonarista. Em seguida, Do Val explica a Zambelli, ainda de acordo com o documento da PF, ter feito uso de técnica chamada de "Reação de Goche". O método é associado a técnica de manipulação e priming (relacionado ao modo como um estímulo inicial pode afetar as respostas de um indivíduo a estímulos subsequentes, sem existir consciência do mesmo sobre tal influência).
A Polícia Federal pontua, no relatório, que após explicar seu método, o senador pede para que a deputada assista ao filme "Golpe Duplo", com o ator Will Smith, onde é demonstrada a utilização da técnica.
No filme, o personagem Nicky, interpretado por Will Smith, utiliza uma técnica semelhante para "programar" mentalmente uma pessoa, fazendo-a escolher o número 55. Durante o dia, ele expõe a pessoa repetidamente ao número 55, através de vários estímulos visuais e auditivos — desde placas até diálogos, de forma que, ao final, a escolha parece ser do próprio alvo, mas, na verdade, foi manipulada.
Por fim, a polícia destaca que em 1 de março de 2023, o senador envia para a deputada diversas capturas de tela de matérias jornalísticas relacionadas aos atos de 8 de janeiro de 2023, reiterando a estratégia que teria utilizado (Reação de Goche) para chamar atenção da imprensa.
“A grande maioria de vocês não estavam entendendo nada do meu comportamento, mas foi feito tudo propositalmente”, teria escrito o senador na mensagem enviada Zambelli.
Marcos Do Val foi procurado para comentar o relatório. Em conversa com a reportagem de A Gazeta, o senador disse que nunca atuou para interferir nas investigações da PF e que, à época, possuía prerrogativa para convocar autoridades e políticos para prestar esclarecimentos sobre os atos do 8 de janeiro, por meio da CPMI.
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