O Ministério Público do Espírito Santo (MPES) entrou com uma ação de improbidade administrativa contra o prefeito de Afonso Cláudio, Luciano Pimenta, o secretário municipal de Agricultura, Anderson Pagotto de Moura, e a empresa Cia Brasil de Rodeios. Em outubro de 2023, o município contratou a empresa sem licitação para executar o rodeio na 30ª Expo Afonso Cláudio por R$ 350 mil. O órgão questiona a legalidade da contratação e pede que sejam bloqueados R$ 95 mil em bens para garantir o reembolso aos cofres públicos e pagos ainda R$ 50 mil em danos morais coletivos.
A festa foi alvo de disputas judiciais antes e depois da sua realização. Inicialmente, o MPES recomendou o cancelamento do contrato com a Cia Brasil de Rodeios porque não houve processo licitatório, ou seja, situação em que várias empresas concorrem e vence a proposta com menor valor. Diante do prosseguimento da contratação, a Promotoria de Justiça da cidade entrou na Justiça para que fossem bloqueados R$ 95 mil das contas da prefeitura, pedido que foi aceito.
Dessa vez, o promotor Valtair Lemes Loureiro requer a condenação do prefeito, do secretário e da empresa de rodeios por improbidade administrativa. Na petição, protocolada em 15 de dezembro, ele afirma que o município deveria ter licitado o serviço de rodeio e não o fez, mesmo havendo outras empresas que poderiam realizar o evento por preços mais baixos.
Segundo a lei, a contratação de atividades desse tipo até pode ser feita com dispensa de licitação, mas é preciso ficar demonstrado que o serviço contratado é prestado exclusivamente por aquela empresa e que se trata de atividade artística consagrada pela mídia ou pela opinião pública. De acordo com o Ministério Público, esse não é o caso da Cia Brasil de Rodeios.
O entendimento é baseado, entre outros pontos, em um parecer da Federação Capixaba de Rodeios, que disse que a empresa contratada não presta serviço em regime de exclusividade, ou seja, atua como outras do ramo.
A prefeitura, ainda de acordo com a petição, justificou a contratação afirmando que a Cia Brasil de Rodeios já tinha atuado na festa da cidade no ano anterior, "onde obteve excelente conceito e aceitação popular, dando um verdadeiro show na arena em todas as atrações", conforme destaca o texto. Esse argumento, porém, não foi considerado suficiente para o MPES.
"[...] As premissas utilizadas pelo gestor no procedimento administrativo para contratação direta da empresa são absolutamente genéricas e poderiam ser utilizadas para a contratação direta de qualquer outra empresa com qualidades semelhantes. Por isso, a contratação direta onerou indevidamente o patrimônio público e caracteriza ato de improbidade administrativa", diz a petição do MPES.
O órgão relata que a empresa Produções TR ME, que também promove rodeios, chegou a protocolar na prefeitura uma proposta para a realização do rodeio na Expo Afonso Cláudio por R$ 255 mil, ou seja, R$ 95 mil a menos que o valor pago pela prefeitura pelo serviço. Mas o contrato acabou sendo firmado com a Cia Brasil de Rodeios.
A Produções TR ME levou o assunto à Justiça, por meio de um mandado de segurança, e a prefeitura obteve decisão favorável em primeira e segunda instância, mantendo-se assim a contratação sem licitação.
Além do não preenchimento dos requisitos para a contratação sem licitação, o Ministério Público afirmou ainda que há um inquérito civil que apura irregularidades na execução do contrato entre a Prefeitura de Afonso Cláudio e a Cia Brasil Rodeios referente ao rodeio de 2022. Naquela ocasião, tendo sido contratada por licitação, a empresa não teria cumprido a totalidade dos serviços que constavam no edital.
"[...] A empresa (Cia Brasil Rodeios) já sofreu diversas sanções administrativas de multa pela Controladoria-Geral da União, Controladoria-Geral do Rio de Janeiro, pelo Ministério da Fazenda, pela Secretaria Municipal de Justiça de São Paulo, dentre outros órgãos fiscais. A empresa também figura como devedora em dívida ativa de diversos débitos (previdenciário, Cofins, CSLL e IRPJ)", acrescenta o promotor.
O Ministério Público entende que houve dano aos cofres públicos e que os alvos da ação devem promover a restituição de R$ 95 mil, referentes à diferença entre o preço pago à Cia Brasil Rodeios e o valor que havia sido proposto à prefeitura pela outra empresa, a Produções TR ME. Para garantir o pagamento, o órgão pede que haja indisponibilidade de bens dos réus.
Além disso, pediu que eles paguem, juntos, R$ 50 mil em danos morais coletivos. "Entende-se que a lesão ao erário, decorrente de conduta que caracteriza improbidade administrativa, implica grave repercussão social" e que, por isso, promove dano à coletividade, diz o MPES. Além disso, o órgão afirma que o valor deve servir como "reprimenda" para inibir novas condutas irregulares na administração municipal.
A prefeitura foi demandada por A Gazeta para comentar a ação do MPES, mas não respondeu até a conclusão deste texto. O espaço segue aberto para manifestações.
Em 18 de outubro, antes da festa, a prefeitura afirmou em nota que "todo o procedimento administrativo ocorreu dentro da legalidade, inclusive em consonância com pareceres do Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo. No questionamento judicial, houve no dia 16/10 decisão judicial reconhecendo a legalidade dos atos praticados. Também saiu ainda há pouco (18/10) o resultado da decisão do Agravo de Instrumento, onde o Tribunal de Justiça do Espírito Santo entendeu que está tudo dentro da legalidade e indeferiu o pedido".
A respeito dos benefícios que o município teria com um evento tão custoso, a prefeitura afirmou que "está cumprindo sua obrigação constitucional de promover a cultura e o lazer aos seus munícipes".
Disse ainda que o rodeio promoveu vantagens para a cidade, com alta ocupação de hotéis e movimentação no comércio. E acrescentou que todo o lucro da festa será revertido para três instituições do município, sendo elas o Hospital São Vicente de Paulo, a Apae e o Projeto Resgate.
No Instagram do prefeito Luciano Pimenta, há um vídeo de um discurso feito por ele o último dia do rodeio em questão. Nele, o chefe do Executivo municipal agradece aos servidores da prefeitura, em especial ao "setor de licitação", pela realização do evento. Ele atribui à oposição os questionamentos levantados a respeito do evento. "Tinha Ministério Público, vereadores, tinha muita gente da oposição querendo fazer com que a festa não acontecesse. E nós trabalhamos muito para essa festa acontecer e vai acontecer ano que vem se Deus quiser", disse.
A reportagem procurou a Cia Brasil de Rodeios para comentar a ação do MPES, mas não houve retorno até a publicação deste texto.
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