Entre outubro de 2018 - quando ocorreram as eleições gerais - e outubro deste ano, mais de 21 mil capixabas se desfiliaram de seus partidos. Foi a primeira vez em dez anos que o número de filiados deixou de crescer no Espírito Santo. Quem puxou a fila para fora da vida partidária foram ex-filiados do PP, MDB, PDT, PTB e PPS, que mesmo com os desfalques ainda figuram entre as maiores siglas do Estado.
O levantamento feito por A Gazeta, com base nos dados de filiação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Em outubro de 2018, o número de filiados no Estado era de 343.725, já em outubro de 2019, ficaram nos partidos 322.215 pessoas, uma queda de 6%.
O encolhimento da militância das legendas não é exclusivo do Espírito Santo. No cenário nacional também houve redução de filiados. Dos 16,8 milhões de fiéis às suas siglas em 2018, seguiram na atividade partidária 15,7 milhões, ou seja, redução de 6,49%.
Para o cientista político João Gualberto Vasconcellos, o fenômeno de fuga de filiados acompanha um movimento semelhante ao que vem ocorrendo na Europa, com a queda na confiança das pessoas nos instrumentos políticos.
"O mundo ocidental como um todo está sofrendo este processo. Os partidos aqui no Brasil ganharam muita força na época da redemocratização, PDT, PT, PSDB e MDB foram grandes mobilizadores das campanhas das Diretas Já e do impeachment do Collor, anos mais tarde. No entanto, a mobilização hoje ocorre mais pelas redes sociais. A queda da presidente Dilma Rousseff, os protestos contra o Michel Temer e a Greve dos Caminhoneiros foram movimentos organizados por meio das redes e não pelos partidos", destaca Vasconcelos.
João Gualberto afirma, ainda, que a queda no número de filiados e o descrédito da sociedade com os representantes políticos não é a "morte da política", mas, sim, um "processo estrutural" dela, que passa também pelo modelo dos partidos. "Vemos crescendo dentro da política brasileira os movimentos cívicos, que são organizações, mas não são partidos. Acho que o maior deles é o RenovaBR, que vem sendo capitaneado por lideranças com o Luciano Huck; o Agora; o Livres; o Politize. É uma redefinição", completa.
O consultor em marketing político Darlan Campos também afirma que há uma crise de representação em jogo, e não uma crise da política. Para ele, o brasileiro tem se engajado mais, em um novo formato de organização.
"Penso que nunca houve um engajamento tão alto do brasileiro, seja nas redes, seja em associações de classe, em ONGs ou em movimentos sociais. O brasileiro nunca se organizou tanto. Agora a vida partidária foi impactada na última década, com os protestos de 2013 e com a Lava Jato que atingiu em cheio a imagem dos partidos. O descrédito com a política aumentou e é preciso entender como os partidos vão agir daqui para frente. O desafio é de se reinventar, trazer lideranças novas e militantes que mobilizem mais pautas. Vejo que o interesse hoje é mais por pautas do que por siglas. Eu consigo mobilizar pessoas para promover as dez medidas contra a corrupção, por exemplo, mas não consigo equacionar isso em um evento partidário. É esse o fenômeno que estamos vivendo hoje", conta.
Apesar da queda, em um recorte maior, o número de filiados ainda é considerável. De 2009 a 2019, a população capixaba, segundo dados do IBGE, cresceu 15%, até alcançar o atual número de 4 milhões de pessoas no Espírito Santo. O número de filiados cresceu em uma velocidade mais do que duas vezes maior, saindo de um patamar de 240 mil membros de partidos para 322 mil, um aumento de 33%.
Nestes dez anos, os que mais ganharam adeptos no Estado foram o PSDB (11.650), o MDB (10.723) e o PSL (5.372). Ainda no recorte de toda a década, apenas três siglas tiveram redução de filiados, o PSTU (-113), o PCB (-78) e o PCO (-48).
Essas siglas foram dissolvidas com a Ditadura Militar, quando foi adotado o sistema bipartidário, com o Arena para quem era a favor do governo e o MDB para quem era contra. A forma como os partidos funcionam hoje teve início a partir da redemocratização e com a Constituição de 1988, que marcou o retorno do pluripartidarismo e deu às siglas a autonomia administrativa e financeira.
Para o professor de Direito Eleitoral Adriano Pedra, a importância dos partidos em um sistema democrático é unir pessoas que defendem bandeiras em comum e fazer essas ideologias serem representadas nos poderes.
O que difere os partidos de um agrupamento político, na minha opinião, é que os partidos possuem estatutos, com uma série de diretrizes sobre posicionamentos sobre diversos temas, como aborto, legalização de drogas, propostas econômicas, entre outras. Já os movimentos políticos, se caracterizam por terem uma única pauta e ter como interesse influenciar governos a aceitarem essa pauta. Os partidos tem como objetivo chegar ao poder e não influenciar quem está lá, define.
Segundo Pedra, as candidaturas avulsas não são aceitas porque se parte do pressuposto que o partido tem uma coesão maior de pautas e permite ao eleitor conhecer melhor no que pensa o representante que ele está escolhendo. A questão está sendo discutida no Supremo Tribunal Federal (STF) e deve ser abordada 2020.
A tendência não é acabar com os partidos, mas fazer eles se reinventarem. Acredito que o que esteja faltando é uma democracia interna dentro dos partidos, permitindo que lideranças jovens surjam. O que vemos é os espaços ainda sendo controlados pelos velhos caciques, que são quem decide onde o dinheiro do fundo partidário deve ser usado. É preciso discutir regras que garantam essa democracia nas siglas. O futuro, acredito, é ver um número menor de partidos e com ideologias melhor definidas, analisa.
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