A sete meses das eleições, líderes partidários estão desempenhando a todo vapor uma tarefa que vai interferir diretamente na lista de candidatos à disposição dos eleitores em outubro. Trata-se da articulação para definir as filiações antes do fechamento da janela partidária, em 7 de abril, e para rascunhar as chapas que disputarão vagas na Assembleia e na Câmara Federal.
Não raro, mais do que ideologias e propostas, as definições se dão a partir contas matemáticas. É por isso que, nesta fase de pré-eleição, entram em cena os fazedores de cálculo da política. Em alguns casos, são figuras desconhecidas do grande público, mas com atuação determinante no cenário eleitoral.
É um trabalho difícil. Todo candidato acha que tem voto para ganhar. Não tem. E essas pessoas conseguem fortalecer o partido e enfraquecer o outro, disse um experiente político.
Nos últimos dias, a reportagem entrevistou dirigentes, deputados e especialistas. Eles dizem que o que torna esses matemáticos tão relevantes nesta etapa é a capacidade de prever, com precisão, as votações dos candidatos e de calcular quocientes e sobras. Têm convicção ao afirmar vou fazer dois deputados e mais um na sobra. As contas prévias vão batendo com o resultado das urnas e eles ganham credibilidade no bastidor político (entenda na página 17).
Não é questão só de saber. É de ter paciência para fazer, afirmou o deputado estadual Amaro Neto (PRB), eleito em 2014 pelo SDD, partido que era comandado pelo deputado federal Carlos Manato (PSL), um dos políticos mais citados nos bastidores pelo gosto e habilidade nos cálculos.
É tudo matemática, pesquisa, não tem nada ilegal ou imoral. Não tem compra de votos, não tem nada. Eu faço contas, explicou Manato.
IMORALIDADES
Não faltam, contudo, relatos de imoralidades para que os cálculos dos dirigentes correspondam com as urnas. Antes de citá-los, porém, é necessário explicar como os calculadores raciocinam.
Suponha-se que partidos se juntam em fazem cinco grandes coligações para disputar as 30 vagas da Assembleia. Esses matemáticos mapeiam os candidatos de todas elas e preveem quantos deputados cada uma tem condições de eleger apenas alcançando o chamado quociente eleitoral. Para isso, levam em conta a trajetória do candidato, a estrutura partidária e financeira e o empenho que terá na campanha. Depois, mapeiam os que podem entrar com os votos da sobra. Ou seja, antes da população ir às urnas sabem quem tem ou não chance de vitória.
Se um deputado terá algo perto de 40 mil votos e o quociente eleitoral do Estado é de 60 mil, ele precisará de mais 20 mil votos do partido ou da coligação. Precisa estar junto de candidatos que poderão dar a ele essa margem. Alguns sabem que serão usados como burros de carga, nas palavras de um entrevistado.
Ele sabe que perde a eleição, mas os caras de cima oferecem isso ou aquilo. Cargo para a mulher e para o filho dele. Aí o voto dele vai para o cara que vai ganhar a eleição, contou Marcus Alves (ex-PRP), outro recorrente contador dos bastidores. Ele nega usar do expediente.
As contas de Alves fizeram do insignificante PRP a segunda maior bancada da Assembleia, em 2014. A façanha o fez ganhar o apelido de mago da política. Na eleição de 2018, ele trabalha na construção da chapa de deputados estaduais do PR, embora sem ser filiado ao partido.
Esse sistema valoriza quem sabe fazer contas. Se não, o cara tem um monte de voto e não ganha a eleição, contou outro conhecido matemático da política local.
OS LEMBRADOS
Nos bastidores, outros políticos citados como detentores de habilidade para desenvolver as contas e favores os próprios partidos e aliados são o deputado estadual Hudson Leal (Podemos), o secretário estadual de Esportes, Roberto Carneiro (PRB), o deputado federal Sérgio Vidigal (PDT), o ex-vereador Ademar Rocha e o presidente do PSB estadual, Luiz Ciciliotti.
"MATEMÁTICA" É UMA ESTRATÉGIA NATURAL, AFIRMAM ESPECIALISTAS
Analistas explicam que regra eleitoral permite prática e não pode ser considerada ilegal
É uma estratégia estranha, aplicada longe dos olhos dos eleitores e, aparentemente, capaz de definir favoritos e até favorecer determinados candidatos nas eleições para deputado estadual e federal. No entanto, faz parte do jogo e das regras políticas e não é, por si só, antiética ou imoral.
Essa é a avaliação de dois cientistas políticos consultados. Para eles, a regra eleitoral permite a estratégia. Por mais experientes que sejam os políticos por trás delas, qualquer previsão pode cair por terra em razão da imprevisibilidade humana e da diversidade de fatores que os eleitores consideram até o momento de ir às urnas escolher os candidatos nas eleições.
Diretor do Instituto de Estudos Estratégicos da Universidade Federal Fluminense (UFF), o professor Eurico Figueiredo avalia como natural a absorção de novas técnicas e novas tecnologias em todos os campos da atividade humana. Na política, não pode ser diferente.
Para ele, as inovações aumentam a qualidade das análises e das previsões, mas não são determinantes.
As máquinas ou os especialistas, por experiência acumulada, não são determinantes no resultado. As pesquisas de opinião, por exemplo, são importantes, usadas a partir dos anos 1940, de maneira cada vez mais sofisticada. Elas ajudam na análise, mas não são determinantes. Tem precisão razoável, mas acontece de serem desmentidas pelos números das eleições. Elas acertam, mas furam também. Quem está na frente tem mais chance de ganhar. Não quer dizer que vai, comentou.
Professor da UVV, Vitor Amorim de Angelo também avalia a matemática política como natural.
Eles jogam com as regras do jogo. Têm capacidade de conhecer as regras, os efeitos que elas produzem e se antecipam a isso, obtendo melhores resultados. Não é questão de ser bom ou ruim. É funcional, comentou.
CHANCES
Os políticos também negam que os cálculos sejam uma maneira de desequilibrar o pleito. Pelo contrário, acham que o tornam mais justo. Esse sistema valoriza quem se preparou para disputar a eleição. E para se preparar tem que ver as estatísticas, afirmou o presidente do PSD estadual, Neucimar Fraga.
Presidente do PSB no Estado, Luiz Ciciliotti também nega que as contas prévias influenciem no resultado. Não sabemos quem vai ganhar. Claro que quem tem mandato tem vantagem. Mas algum companheiro sempre pode entrar e despontar, disse.
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