Seja pelo vínculo com a cidade natal, seja em função da perda do prazo para transferir o título para o novo domicílio eleitoral, muitas pessoas precisam viajar para exercer seu direito de votar. Nas eleições de 2020, porém, a pandemia do novo coronavírus tem se mostrado um obstáculo e alguns desses eleitores estão repensando ou já desistiram mesmo de comparecer às urnas no domingo (15).
Capixabas como o bancário Paulo Roberto Ringuer, que mora no Rio de Janeiro e vota em Cachoeiro de Itapemirim, no Sul do Espírito Santo, não vão votar devido aos riscos de contaminação e também aos problemas decorrentes da pandemia. No caso dele, pesaram a preocupação com o coronavírus, o possível trânsito nos 400 quilômetros de estrada e a escala apertada de voos em função da crise sanitária.
Paulo, que se mudou de Cachoeiro de Itapemirim há mais de 10 anos, conta que chegou a visitar a cidade durante a campanha, ouviu as propostas de alguns candidatos, mas acabou desistindo de comparecer nestas eleições. Ele explica que continua votando no município por questões pessoais e diz se interessar por política.
"Os políticos fazem o lugar andar ou regredir. Por isso, é preciso se envolver e saber escolher porque as propostas geram impactos na sociedade e na economia", avalia. Mesmo com a intenção de retornar ao Espírito Santo, Paulo não deverá voltar a morar em Cachoeiro. O vínculo com a cidade, porém, será mantido como eleitor.
A situação é similar à da cineasta Claudiana Braga, que saiu de Venda Nova do Imigrante, na região Serrana, para estudar em Vitória, em 2015. Ela revela que, devido à pandemia, é muito provável que não participe das eleições deste ano. A minha avó tem 66 anos e, se eu for, tenho medo de deixá-la exposta, argumenta.
O contato com a família era um dos motivos que incentivava Claudiana a fazer o trajeto de 111 quilômetros de ônibus até sua terra natal. Ela saía da Capital na sexta-feira à noite e ficava na sua antiga cidade até segunda pela manhã. No entanto, este ano a cineasta está pensando em justificar a ausência para não colocar em risco a saúde de todos. Estou desde janeiro sem visitar minha família; tenho receio de ir num período como este."
De acordo com o artigo 42 do Código Eleitoral (Lei 4.737/1965), o domicílio eleitoral é o lugar de residência ou moradia do requerente à inscrição para eleições.
No entanto, morar numa cidade e votar em outra é algo normal e, segundo o Tribunal Regional Eleitoral (TRE-ES), não se constitui um problema, uma vez que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) já se manifestou em decisões que uma pessoa pode votar no lugar em que tenha vínculos políticos, sociais, patrimoniais e de negócios."
O cientista político Paulo Edgar Resende, porém, avalia que o fato de votar significa escolher o destino daquele lugar e, por isso, é interessante que a pessoa seja impactada pelas políticas feitas na região. É possível que a pessoa esteja bem informada, mas ela não será diretamente afetada pela decisão, analisa.
Resende pondera ainda que o eleitor precisa avaliar a importância social do seu voto, se ele volta em um município diferente do que reside. Se esse indivíduo pode melhorar as condições sociais daquela cidade, e analisa que são mais emergenciais que as do local onde vive, acho que o voto se faz de maneira assertiva, ressalta.
Mas, mesmo com a pandemia de Covid-19, há quem ainda faça questão de exercer o direito ao voto. Gutierri Andreza tem tudo organizado para visitar Itaoca Pedra, distrito de Cachoeiro de Itapemirim, no fim de semana da eleição. Ele mora em Vitória há 12 anos e já tem como hábito sair de onde estiver para depositar o voto na cidade onde cresceu. Para ele, votar em seu município é como manter um vínculo afetivo.
Gutierri, que também é bancário, conta que os planos para votar já foram feitos. Nesta sexta-feira (13), ele e uma amiga sairão de Vitória rumo a Itaoca. Até o dia das eleições, eles pretendem organizar um churrasco na casa da tia e visitar os antigos amigos da cidade. Já a volta está programada para depois que forem divulgados os vencedores.
Ele destaca que faz pesquisas sobre os candidatos que estão na disputa e questiona seus projetos nas transmissões virtuais, especialmente nesta campanha. Ele foi chefe de zona eleitoral e diz ver o dia do pleito como uma festa.
Já Pedro Henrique, que reside em Vitória e tem título registrado em Nova Venécia, no Norte do Estado, vai votar nessas eleições por uma coincidência. Morador de Vitória, o cineasta já havia planejado uma visita aos pais para novembro. Ele conta que não vê a família desde janeiro e o feriado da Proclamação da República, que cai justamente no domingo do primeiro turno, foi a data encontrada para o retorno à cidade natal.
Pedro Henrique mora em Vitória desde 2015, quando ingressou na universidade. Por morar em república e não ter emprego fixo, sempre teve dificuldades financeiras para se deslocar e participar das eleições. São 251 quilômetros até Nova Venécia.
A rotina corrida, de faculdade e estágio, acabou sendo um obstáculo para a troca do domicílio eleitoral. Pedro revela que votou nas eleições de 2018, no segundo turno, mas que em outros pleitos, inclusive municipais, acabou justificando a ausência.
Mesmo estando distante, Pedro diz que as discussões com a família o ajudam a conhecer e escolher os candidatos de sua cidade de origem. Mas, como não tem pretensões de voltar a morar em Nova Venécia, o cineasta pretende mudar o título para Vitória por entender a importância de participar da decisão da cidade na escolha dos governantes.
Para aqueles que não poderão comparecer aos locais de votação, o TRE-ES informa que neste ano, devido à pandemia, a justificativa de voto para esses eleitores pode ser realizada pelo aplicativo e-Título.
Para as próximas eleições, quem desejar alterar a cidade de votação deve comparecer aos cartórios eleitorais a partir de 30 de novembro, ou seja, primeiro dia após o segundo turno.
* Israel Zuqui é aluno do 23º Curso de Residência em Jornalismo da Rede Gazeta, sob supervisão do editor Geraldo Campos Jr. e de Aline Nunes
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