Apesar de Walter Delgatti Neto, preso na terça (23), ter confessado ser o hacker que invadiu contas de autoridades da Lava Jato, a Polícia Federal vê contradições em seu depoimento. Uma nova oitiva havia sido marcada para falar sobre pontos descobertos pela investigação.
Delgatti é chamado internamente por investigadores de "contador de histórias", característica considerada típica de estelionatários. Ainda assim, a PF diz que o suspeito tem colaborado com a apuração.
Um dos exemplos principais de sua boa vontade, segundo policiais, foi o fato de ter fornecido senhas de seu celular e de serviços que armazenam dados nas nuvens da internet.
Entre as contradições, investigadores dizem que Delgatti faltou com a verdade sobre o número de autoridades que atacou. O suspeito limitou sua atuação a pouco mais de dez pessoas públicas.
O suspeito disse não ter sido o autor de invasões das contas do ministro Paulo Guedes (Economia) e da deputada Joice Hasselman (PSL-SP).
Policiais apontam que a investigação tem um número muito maior de vítimas do que o Delgatti confessou, conforme trabalho da perícia.
Há mais de 5.000 ligações feitas de um canal vinculado a ele para tentativas de invasão, com cerca de mil alvos. Outro episódio de contradição apontado pela polícia ocorreu no dia da busca e apreensão, na última terça.
Segundo informações do Instituto Nacional de Criminalística, um dos celulares de Delgatti estava aberto na conta de Guedes no momento da operação. O telefone ainda iria passar por perícia, mas a questão já é tratada como certa.
A PF também tem na investigação mais detalhes de como o hacker começou a fazer as invasões. Alguns dos pontos apurados são diferentes daqueles declarados por ele em depoimento na última terça.
A política quer saber ainda quantas vezes o grupo se passou por autoridades nas trocas de mensagens pelo aplicativo Telegram.
Os investigadores buscam descobrir quais dos integrantes do Executivo, Legislativo e Judiciário tiveram conversas conduzidas pelos invasores dos telefones celulares.
De acordo com informações iniciais, os ataques aos celulares começaram em fevereiro deste ano, o que descartaria a possibilidade de terem se passado pelos alvos em mensagens anteriores ao período.
Até agora, a PF já contabiliza pelo menos quatro casos em que o autor ou os autores das invasões deram início ou continuaram diálogos fingindo ser o dono do telefone.
A polícia apura se o telefone do presidente Jair Bolsonaro, também alvo dos hackers, sofreu esse tipo de ação por parte deles. Investigadores dizem que isso ocorreu, por exemplo, com o ministro Sergio Moro (Justiça).
O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, foi alvo de uma tentativa de ataque no aplicativo em abril, mas os hackers não conseguiram acessar as informações do celular.
O ministro foi informado do ataque pelo próprio Telegram, mas não foi comunicado oficialmente pelo Ministério da Justiça de estar entre as autoridades hackeadas.
Moro tem avisado as autoridades vítimas das invasões que as mensagens capturadas pelo grupo serão destruídas.
O descarte de material apreendido em operações, no entanto, é uma decisão que cabe à Justiça e pode ocorrer somente com decisão do juiz.
O plano da PF agora é descobrir quantas contas o grupo conseguiu de fato se infiltrar.
De acordo com pessoas envolvidas na investigação, há um padrão que caracteriza sucesso e fracasso, o que ajuda no trabalho em andamento.
A expectativa é que vítimas dos grampos sejam chamadas para prestar depoimentos. Um laudo está sendo finalizado e deve ser entregue até o início da semana que vem.
O depoimento de Delgatti, cujo teor completo foi revelado nesta sexta (26), pela GloboNews, inclui ainda a afirmação do suspeito de que ele seria o responsável por passar mensagens da Lava Jato para The Intercept Brasil, de forma anônima, voluntária, como revelou a Folha de S.Paulo, e sem edição.
O suspeito diz ter procurado Glenn Grennwald, fundador do site, por conhecer sua atuação no vazamento de documentos secretos dos EUA, no caso de Edward Snowden.
Ele afirmou que obteve o contato do jornalista por meio da ex-deputada Manuela D'Ávila (PC do B).
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