O Partido Socialista Brasileiro (PSB), do governador Renato Casagrande, está promovendo uma autorreforma para modernizar seu programa partidário. A proposta é buscar um socialismo "mais criativo" e "menos soviético". Entre as novas orientações, que ainda precisam ser debatidas em congressos internos, a sigla defende a valorização da livre iniciativa e o afastamento do "estatismo que rondou algumas práticas socialistas, como a soviética".
Os termos são do livro "Autorreforma do PSB, um passo adiante", organizado pelo presidente nacional do partido, Carlos Siqueira (PSB). A mudança deve ter início em setembro, a partir de congressos nos municípios e no Estado, com a expectativa de ser finalizada em novembro, pouco menos de um ano antes das eleições de 2022. A pavimentação de um novo caminho, com alguns desvios da rota original traçada na fundação do PSB, em 1947, visa contemplar o que defendem os filiados atualmente, em 2021.
Siqueira, em entrevista ao jornal O Globo, não descarta que a mudança pode facilitar o flerte do partido com perfis mais liberais economicamente, como a empresária Luiza Trajano – dona do Magazine Luiza – e o apresentador de TV Luciano Huck.
"Não faz mais sentido nesta altura dos acontecimentos falar de socialização dos meios de produção. Isso é anacrônico e não corresponde ao nosso pensamento atual", defendeu. Foi Siqueira quem apontou, ainda, Casagrande como um dos pré-candidatos à Presidência da República em 2022.
No Espírito Santo, o presidente do diretório estadual, Alberto Gavini, será um dos coordenadores dos debates que levará a construção da redação final do novo estatuto do partido. Ele afirma que a legenda não vai mudar de nome e nem deixar de ser de centro-esquerda, mas que é preciso "ampliar a capacidade de debate com a sociedade".
"Nos últimos anos, muitas coisas mudaram. É claro que nenhum partido precisa perder seus princípios básicos, mas precisa atualizar algumas posturas para ajustar à nossa vida contemporânea. Os partidos precisam ser mais acolhedores, mais light, mais atrativos e receber mais pessoas. O Brasil perdeu a discussão política", explica.
Para o cientista político João Gualberto Vasconcellos, a mudança do PSB demonstra uma tentativa do partido de ocupar um vácuo deixado pela polarização política do país, "dando um passo atrás" para se afastar da imagem do ex-presidente Luíz Inácio Lula da Silva (PT), que volta a ganhar força após ter suas condenações anuladas pelo Supremo Tribunal Federal (STF); e do presidente Jair Bolsonaro (sem partido).
"As candidaturas de centro sofreram um grande impacto, com Lula de volta ao jogo. O PSB já está em um movimento de tentar ocupar essa lacuna que fica entre Lula e Bolsonaro, recuando um pouco e buscando esses nomes mais palatáveis (como o de Luiza Trajano e Luciano Huck). É normal um partido se atualizar, o que não é normal é uma agremiação ficar pinçando nomes, em vez de construir suas próprias lideranças, que surgem naturalmente dos debates internos", analisa.
Além de ser o partido que elegeu o governador, o PSB é, atualmente, a sigla com maior representação no Espírito Santo, com o maior número de vereadores e prefeitos eleitos no último pleito, uma das maiores bancadas na Assembleia Legislativa e com duas entre as 10 cadeiras do Estado na Câmara dos Deputados.
Em terras capixabas, a autorreforma passa por uma tentativa de aproximação, também, de eleitores com perfis mais conservadores, como admite o próprio Gavini. Na base do governo do Estado, o partido mantém alianças com membros de partidos de orientação ideológica bem distante dos ideais socialistas da fundação do PSB.
O Republicanos – do presidente da Assembleia Legislativa, Erick Musso; e do prefeito de Vitória, Lorenzo Pazolini – são parceiros do partido e de Casagrande. Nacionalmente, o Republicanos apoia o governo Bolsonaro e abriga dois dos filhos do presidente, o vereador do Rio de Janeiro Carlos Bolsonaro e o senador Flávio Bolsonaro. O PSB e Casagrande têm se posicionado de maneira crítica ao governo federal.
Gavini conta que há, sim, alguns filiados ainda resistentes às mudanças, que se darão em cinco eixos: reforma do Estado, Economia e Igualdade, Economia Verde, Políticas Sociais e Socialismo Criativo. O dirigente aponta que a abertura do diálogo visa, inclusive, a aproximação com o eleitorado mais alinhado a grupos conservadores.
"A autorreforma busca estabelecer novas bases para que a gente possa ajudar a discutir o desenvolvimento do Brasil em todas as áreas. A gente quer ampliar a capacidade de debate do partido, precisamos atualizar esses temas a partir desse movimento. Evidentemente, como toda agremiação, tem gente que pensa diferente, o que é salutar. Mas todos são favoráveis ao debate", explica.
Na Câmara dos Deputados, Ted Conti, um dos parlamentares capixabas do PSB, aponta que o partido deve acompanhar as mudanças dos tempos e que a atração de novas lideranças – como Luiza Trajano ou Luciano Huck – não é o principal objetivo da mudança no estatuto.
"Vivemos em uma era na qual as pessoas querem participar das decisões partidárias e nossa intenção é dar mais voz a todos. O PSB sempre esteve e sempre estará aberto a todos que respeitam e defendem a democracia", diz.
Na Assembleia Legislativa, o deputado estadual Freitas (PSB) destaca que a autorreforma está em curso desde 2019, iniciada na Conferência Nacional do partido. “Só é duradouro o que se renova, a nossa autorreforma é necessária para acompanhar a evolução dos tempos e a renovação do partido, apresentando novas propostas para ajudar na superação das dificuldades do nosso país, principalmente com o ‘novo normal’ que estamos vivendo devido à pandemia do novo coronavírus”, observa.
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