A Polícia Federal (PF) prendeu na tarde desta quarta-feira (31), em São Paulo, o doleiro Dario Messer, que estava foragido desde o ano passado.
Acusado de ser o mentor de um esquema de evasão de divisas e lavagem de dinheiro que movimentou mais de R$ 5 bilhões entre 2011 e 2017, ele foi detido nos Jardins (zona oeste de São Paulo), de acordo com a Polícia Federal.
Messer foi localizado no apartamento da amiga Myra Oliveira Athayde, com uma aparência distinta da que apresentava em seus eventos sociais: agora, tem a barba e os cabelos ruivos. Ele tinha um RG falso, com o nome de Marcelo de Freitas Batalha.
A PF vinha monitorando seus passos por meio de interceptações telefônicas de algumas amigas que mantém no Brasil. Um telefonema feito nesta terça (30) auxiliou os policiais a identificarem o local em que o doleiro poderia estar escondido. O juiz Marcelo Bretas, juiz federal no Rio de Janeiro, expediu mandado de busca e apreensão na casa de Athayde.
"Messer é o cabeça de uma grande rede de doleiros que trabalhava no submundo para lavar dinheiro de empreiteiras, políticos e sonegadores. Sua prisão representa um marco no combate ao crime organizado", disse o procurador Eduardo El Hage, coordenador da força-tarefa da Lava Jato no Rio.
O doleiro foi transferido na noite desta quarta-feira para o Rio de Janeiro.
O advogado Átila Machado já havia solicitado anteriormente ao STF (Supremo Tribunal Federal) e ao STJ (Superior Tribunal de Justiça) habeas corpus para o doleiro, sob alegação de que seu cliente era coagido e de que o pedido de prisão preventiva não se justificava. Segundo a defesa, as acusações se referem a fatos passados e não havia risco de destruição de provas.
"Tivesse o paciente praticado supostos crimes na condição de líder ou de subordinado da imaginada organização criminosa, a ausência de contemporaneidade continuaria a obstar sua segregação cautelar a título de risco à ordem pública", disse o advogado à época.
Os pedidos foram negados pelos ministros Gilmar Mendes, do Supremo, e Rogério Schietti Cruz, do STJ.
"O recorrente está foragido há mais de 13 meses e, atualmente, não sofre nenhum cerceamento à sua liberdade", disse Schietti, refutando que tenha havido coação do doleiro.
"Não há falar em falta de urgência da medida [de prisão], principalmente ante a notícia de fuga e a natureza permanente do crime de organização criminosa. É preciso salientar que o dinheiro movimentado ilicitamente permanece oculto, a denotar que não houve cessação das atividades delitivas", afirmou o ministro.
Alvo de investigações desde a década passada, ainda no caso Banestado, ele ganhou o apelido de "doleiro dos doleiros". Foi delatado na Lava Jato do Rio pela dupla Vinicius Claret e Cláudio Barboza, que tinha sido detida no Uruguai em 2017 e mais tarde se tornou colaboradora da Justiça.
Os dois eram funcionários de Messer e operaram um sistema de dólar-cabo que movimentou cerca de US$ 1,6 bilhão (o equivalente a cerca de R$ 5,3 bilhões) envolvendo mais de 3.000 offshores em 52 países.
Mais de 50 doleiros usavam o esquema montado por Messer para atender seus clientes no Brasil e no exterior. A estrutura dele era uma das poucas que conseguia operar as duas pontas do dólar-cabo: ao mesmo tempo, oferecer dinheiro vivo no país e ter caixa disponível em contas no exterior, em paraísos fiscais.
Segundo as investigações, Messer era o lastro financeiro da dupla, bem como o responsável por avalizar a confiança dos dois em sua rede de contatos no país e no exterior. Claret e Barboza operavam o sistema --os dois atualmente ensinam suas técnicas a procuradores federais, como parte do acordo de delação.
Dario também é apontado como o controlador do banco Evergreen (EVG) em Antígua e Barbuda, no Caribe. Uma lista de mais de 400 clientes está nas mãos do Ministério Público Federal para apurar quais casos envolvem crime --o banco misturava negócios legais e ilegais.
A atuação da família Messer no câmbio ilegal remonta à década de 1980, pelas mãos do patriarca Mordko Messer, espécie de mentor do esquema mantido por Dario, Claret e Barboza.
As amizades do doleiro dos doleiros vão desde o ex-atacante Ronaldo Fenômeno até o ex-presidente do Paraguai Horacio Cartes, que o chamou de irmão de alma. O paraguaio foi socorrido pelo patriarca Mordko numa fase de dificuldades financeiras.
Dario chegou a ensaiar uma delação premiada com procuradores federais entre 2017 e 2018. As negociações foram interrompidas quando uma escuta telefônica flagrou um operador financeiro comentando, 20 dias antes da Operação Câmbio, Desligo, a iminência da prisão do doleiro.
Desde a deflagração da operação, em abril de 2019, Dario vinha negociando se entregar às autoridades brasileiras. Ele também era procurado no Paraguai, país onde chegou a ter nacionalidade.
As negociações foram vistas por investigadores como uma forma de alongar seu período de liberdade.
No último dia 9, a PF deflagrou operação no Rio baseada na delação de familiares de Messer. Dois suspeitos foram alvos de mandados de prisão.
Segundo o Ministério Público Federal do Rio, a ex-mulher de Messer, Rosane, e os filhos Dan, Débora e Denise colaboraram com a Justiça.
A ex-funcionária de Messer Elsa Filomena Fernandes dos Santos também colaborou, explicando como ocorria a entrega de dinheiro a suspeitos de integrar o esquema.
Enquanto a sua família negociava a colaboração, o doleiro trocou de advogados e fez os pedidos de habeas corpus.
Os familiares se comprometeram a devolver R$ 270 milhões em dinheiro vivo e o restante em bens.
A Operação Câmbio, Desligo, na qual ele foi o principal alvo, é até hoje a maior fase da Lava Jato em número de presos, com 49 mandados de prisão preventiva expedidos pelo juiz federal Marcelo Bretas.
As suspeitas da Câmbio, Desligo fizeram o Ministério Público do Paraguai, onde Messer vivia, também abrir investigações e obter na Justiça o bloqueio de contas do doleiro e de suas empresas --abertas, segundo as investigações, com dinheiro ilícito.
No país, havia pressão pública para que Messer fosse investigado e processado devido à sua proximidade com o ex-presidente Cartes.
CELEBRIDADES
Dario Messer tem a fama de não perder uma boa festa nem faltar a um grande escândalo.
Desde a década de 1990, o doleiro frequenta as páginas dos jornais. Ora estampando notas em colunas sociais cercado de amigos famosos, outras vezes protagonizando o noticiário policial. Há momentos em que tudo isso se confunde.
Entre as celebridades com quem Messer brindou em badalações exclusivas está o ex-jogador de futebol Ronaldo Nazário, o Fenômeno. Eles se conheceram pelas mãos dos então empresários do craque, Reinaldo Pitta e Alexandre Martins.
A afinidade foi tamanha que em 1998 Ronaldo voltou da Europa, onde jogava pela Internazionale de Milão, para inaugurar no Rio de Janeiro a boate R9, que tinha Pitta, Martins e Messer como sócios.
Ronaldo disse, via assessoria, que apesar de na época ter sido tratado pelos jornalistas que cobriram as três inaugurações estreladas por ele como um dos donos da casa noturna, não participava do negócio, batizado com sua marca.
Em 2002, menos de quatro meses depois da conquista do pentacampeonato da Copa do Mundo, Ronaldo e Dario Messer foram festejar na Rússia. Uma nota do jornal O Globo dizia que a viagem aconteceu em um avião de um genro milionário de Vladmir Putin, presidente do país.
No ano seguinte, porém, a notícia que expunha a relação de Messer com os empresários do jogador foi menos festiva.
Pitta e Martins foram presos pela Polícia Federal acusados de usar funcionários de suas empresas como laranjas em transações que consistiam no envio de milhões de dólares para o exterior com a ajuda de funcionários lotados na Receita Federal do Rio de Janeiro.
Ronaldo nada tinha a ver com o caso. Mas não demorou para os policiais desconfiarem de que Dario Messer tinha participação no esquema. O doleiro não esperou ser chamado a dar explicações. Naturalizou-se paraguaio e mudou-se com toda família para Nova Iorque.
O caso, que ficou conhecido como Propinoduto dos Fiscais, levou Dario Messer a virar alvo também da CPI do Banestado, que apurou um esquema de lavagem de dinheiro por meio de contas CC5, operadas via o Banco do Estado do Paraná.
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