A relação entre a Câmara da Serra e o prefeito Audifax Barcelos (Rede) hoje passa longe das altas confusões protagonizadas por vereadores. O próprio chefe do Executivo já chegou a apontar que o crime organizado tentava tomar o poder na cidade. Mas uma trégua foi instaurada.
Um decreto assinado pelo prefeito, suspendendo a eficácia de uma emenda à Lei Orgânica Municipal aprovada pelos vereadores, entretanto, pode acirrar os ânimos.
Os parlamentares querem que as emendas parlamentares - por meio das quais eles indicam como a prefeitura deve gastar parte dos recursos do orçamento - sejam obrigatórias. Ou seja, que a prefeitura tenha que fazer a obra definida por um vereador ou destinar dinheiro a uma entidade definida por ele, por exemplo.
É isso que está previsto na Emenda 34, de fevereiro deste ano. Um decreto de Audifax, datado do último dia 28, alega a inconstitucionalidade da norma por ferir a independência dos Poderes e porque somente o Executivo poderia propor algo do tipo. Assim, suspende a eficácia/aplicação do texto.
Hoje cada vereador pode apresentar emendas no valor total de R$ 300 mil. Mas a prefeitura não tem que executá-las, na prática. Se a alteração na lei orgânica passasse a ser aplicada, o valor seria fixado no equivalente a 1,2% da receita corrente líquida em relação ao conjunto dos parlamentares e de forma impositiva.
"Nenhuma lei pode ser revogada por decreto. A lei é de fevereiro e até então estava tudo certo. Talvez ele (Audifax) tenha esperado a calmaria. Houve uma trégua. O que assusta é que depois dessa trégua ele baixa o decreto. O que me leva a crer é porque está chegando o final do ano e ele teria que cumprir a lei (o orçamento de 2020 é elaborado no final de 2019). O prefeito não gosta de pagar emenda de vereador", afirma Pastor Ailton (PSC). "Uma Câmara que gasta R$ 34 milhões a e a lei que vota não é respeitada ... então pode fechar a Câmara", complementa.
Apesar do tom, ele avalia que não será pelo episódio que a trégua entre Executivo e Legislativo chegará ao fim. "Vai gerar um mal estar, mas não acredito que possa voltar a confusão".
Pastor Ailton calcula que o valor das emendas para 2020, no total, chegaria a R$ 12 milhões, ou cerca de R$ 520 mil para cada vereador. Mas a conta, considerando a Emenda 34, precisa ser feita com base na receita corrente líquida do ano que vem, que ainda não foi oficialmente estimada.
Líder do prefeito na Câmara, Luiz Carlos Moreira (MDB) diz que votou contra tornar as emendas parlamentares obrigatórias, mas, inicialmente, concorda que a inconstitucionalidade da medida não poderia ser definida por decreto. "Esse momento (entre Executivo e Legislativo) está apaziguado agora e até fico assustado", afirmou. Moreira diz que não conversou com o prefeito e ainda iria estudar o assunto.
Guto Lorenzoni (Rede), da base do prefeito, ressalta que quem define o orçamento é o Executivo e há pouca margem para os parlamentares nesta seara. Ele se diz contrário às emendas obrigatórias da forma como foram definidas na Lei Orgânica - mas avalia que seria possível um acordo em outros termos com o prefeito - e considera que Audifax seguiu entendimento da área jurídica da prefeitura para baixar o decreto.
Lorenzoni diz que as emendas, mesmo sem obrigatoriedade, são, sim, cumpridas. "Dentro da regularidade as emendas são executadas. Eu, como vereador, coloquei em 2018 emenda para dez escolas, para comprar computador, ar-condicionado em salas de aula em 2019. Já estão fazendo a instalação elétrica", exemplifica.
Enquanto isso, o presidente da Câmara, Rodrigo Caldeira, que apesar de ser do mesmo partido do prefeito estava no campo oposto até pouco tempo atrás, contemporiza: "Já passei para a Procuradoria, eles estão estudando. Eu acho que, opinião minha, decreto não sobrepõe lei. Acho que o correto seria ele (Audifax) entrar com Adin (Ação Direta de Inconstitucionalidade), se não concorda (com a obrigatoriedade de pagamento das emendas). Mas acredito que vamos chegar a um acordo".
Caldeira diz que Audifax não tem executado as emendas de vereadores. "Até porque não tem obrigação, né?. Votei favorável (a tornar as emendas obrigatórias)", complementa. "Hoje as Casas (prefeitura e Câmara) se respeitam e conversam. Estamos para trabalhar em prol da cidade, tanto o Legislativo quanto o Executivo", conclui.
Por meio de nota, a Prefeitura da Serra informou que "os investimentos do município são discutidos com a população. Respeitamos o orçamento participativo. Nem o prefeito, nem os vereadores definem as obras. Os valores destinados a investimentos no município são decididos pela população".
"O decreto é suficiente para suspender a emenda, uma vez que o parecer jurídico tem base em decisões do STF e do STJ que garantem que os chefes dos Poderes Executivos podem deixar de cumprir lei que seja entendida como inconstitucional. A Procuradoria Geral do Município trabalha para adotar outras medidas judiciais cabíveis", diz, ainda, a nota.
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