O prefeito de Fundão, Gilmar Borges, o Gil (PSB), nomeou como secretária municipal de Governo a própria esposa, Luzia Grazziotti Borges. Ela será responsável por ajudar a coordenar as ações da administração e terá salário de R$ 8 mil. Desde 2008, o Supremo Tribunal Federal (STF) proíbe a indicação de parentes até o terceiro grau para cargos públicos. Apesar disso, há um entendimento da própria Corte que permite a nomeação de familiares em cargos de agentes políticos, como o de secretário, desde que seja comprovada aptidão técnica por parte do nomeado.
Luzia Grazziotti é ex-servidora da Cesan, onde atuou como contadora e educadora ambiental. Ela deixou a autarquia, segundo o Portal da Transparência, em 2017. Nas redes sociais, ela se apresenta como empreendedora individual e conta com um perfil de vendas por encomenda de comidas saudáveis.
Gil tomou posse no dia 1º de janeiro. No dia 6, publicou a nomeação de Luzia.
Apesar do parentesco, a prefeitura alega que não há irregularidade na nomeação, valendo-se da brecha interpretativa adotada em alguns casos pelo STF. Especialistas, contudo, avaliam que a questão é subjetiva e casos como o de Fundão podem, sim, ser considerados nepotismo. O advogado Eduardo Sarlo, especialista em Direito Público, diz que a doutrina jurídica tem evoluído para considerar nepotismo todas as situações onde um gestor que beneficia um parente.
"É uma situação que possui interpretação diversa. Juridicamente, o nepotismo é quando você privilegia alguém próximo. Existe essa brecha para agente político? Existe. Mas conceitualmente, independentemente de ser uma nomeação para assessor ou secretário, entende-se como nepotismo. Além do mais, a Constituição fala que o exercício da gestão pública deve se valer de impessoalidade, moralidade e eficiência. Nomear parentes coloca em risco a eficiência da máquina, em nome de alguém próximo", argumenta.
Nas últimas decisões do STF sobre o assunto, os próprios ministros têm reforçado que a indicação de parentes deve ser analisada caso a caso. Recentemente, a Corte analisou dois casos que ganharam repercussão. Em 2019, quando se levantou a possibilidade de o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) nomear o filho, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL), para o cargo de embaixador nos Estados Unidos, o Supremo foi acionado pelo partido Cidadania. O ministro Ricardo Lewandowski rejeitou barrar a indicação de Eduardo, mas o partido entrou com um recurso para que o tema fosse analisado pelo plenário. O próprio Bolsonaro desistiu da indicação.
Em 2018, a nomeação de Marcelo Hodge Crivella – filho do então prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella – para o cargo de secretário-chefe da Casa Civil da prefeitura do Rio chegou a ser suspensa pela Justiça Comum, mas foi revogada pelo Supremo, como recorda o advogado Marcelo Nunes.
"A principal questão analisada nesses casos é se os parentes nomeados têm qualificação compatível com o cargo que vão assumir. A nomeação de familiares para cargos de agentes políticos pode ter posicionamentos isolados, tem uma corrente que defende que é nepotismo e outra que acha que para estes casos é uma exceção. Para todos os outros cargos, como assessores, coordenadores ou gerentes, aí, sim, há uma unanimidade em se considerar nepotismo", sustenta.
No caso de Fundão, a nova secretária Luzia Grazziotti Borges, de acordo com a prefeitura, tem formação em Pedagogia e Ciências, além de pós-graduação em Administração Pública. Antes de ser nomeada, ela era servidora da Cesan, atuava como educadora ambiental, mas já trabalhou na contabilidade da autarquia. Segundo o prefeito, a nomeação da mulher dele foi uma decisão que levou em conta a capacidade dela de tornar a gestão mais eficiente.
"Se ela não tivesse capacidade para ocupar o cargo eu não teria nomeada. A única coisa que pesou na minha decisão foi melhorar a eficiência da gestão do município e acredito que ela tenha experiência para isso", pontuou.
Outros casos de nepotismo também já renderam problemas judiciais para prefeitos. Em 2016, o então deputado federal Sergio Vidigal (PDT), hoje prefeito da Serra, foi condenado por nepotismo por ter empregado a irmã como assessora na administração. Em 2019, o ex-prefeito de Viana Gilson Daniel (Podemos) empregou pelo menos seis pessoas de seu núcleo familiar na prefeitura.
Em 2013, em uma situação semelhante à de Fundão, o então prefeito de Linhares, Nozinho Correa, nomeou a esposa como secretária de Assistência Social e a filha para a Secretaria de Planejamento.
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