Durante apresentação de 100 dias de gestão, na última terça-feira (13), o prefeito de Vila Velha, Arnaldinho Borgo (Podemos), afirmou que trocaria o nome da Unidade de Pronto Atendimento (UPA) do bairro Riviera da Barra, que é em homenagem à médica pediatra e sanitarista brasileira Zilda Arns, pelo nome de "alguém da Região 5 que tenha batalhado pela saúde dos moradores". O prefeito disse que o local tem o nome de alguém que "ninguém sabe quem é".
Zilda Arns (1934-2010) fundou a Pastoral da Criança e a Pastoral da Pessoa Idosa, organismos de ação social da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), ganhou diversos prêmios nacionais e internacionais e foi indicada ao Prêmio Nobel da Paz em 2006. A declaração do prefeito foi alvo de críticas de líderes da Pastoral da Criança da região, no fim de semana, e do Vicariato para Assistência Social, Política e Ecumênica da Arquidiocese de Vitória nesta segunda-feira (19).
Na prestação de contas transmitida pelas redes sociais da prefeitura, ao lado dos secretários municipais, do vice-prefeito Victor Linhalis (Solidariedade) e do presidente da Câmara Municipal, Bruno Rodrigues Lorenzutti (Podemos), Arnaldinho respondeu a uma pergunta de uma moradora sobre a data de início do funcionamento da UPA. Inaugurada em 31 de dezembro de 2020 pela gestão anterior, de Max Filho (PSDB), a unidade ainda passa por obras.
O prefeito comprometeu-se a liberar o local para o uso da população até julho e adicionou que trocaria o nome que foi colocado na placa da unidade pela gestão passada, "que ninguém sabe quem é", por alguém que tenha lutado pela saúde na região.
"A previsão de colocar para funcionar é julho. Em julho, colocamos a UPA de Riviera da Barra para funcionar, pode ser que aconteça antes. É bom ressaltar que estamos falando de uma obra que foi iniciada há 12 anos (...) Recebemos a UPA no dia 1º [de janeiro de 2021] sem estar pronta, com várias coisas por se fazer dentro dela. Só tinha casca", disse.
"Só colocaram uma placa com um nome que ninguém sabe de quem é. Só vou adiantar, nós vamos trocar o nome da UPA de Riviera da Barra. Vamos fazer uma consulta popular para colocar o nome de alguém da Região 5 que batalhou muito pela saúde daquele seu povo", acrescentou.
A declaração gerou revolta na Pastoral da Criança de Vila Velha e na Arquidiocese de Vitória. Líderes da pastoral da Região 5 publicaram um vídeo nas redes sociais defendendo o nome da unidade e explicando quem é Zilda Arns.
Nota publicada no site da arquidiocese, neste domingo (18), reproduz mensagem encaminhada pelo padre Abel de Andrade, coordenador de Pastoral da área de Vila Velha, ao prefeito, em que considerou "deselegante afirmar que Zilda Arns é uma pessoa que ninguém conhece".
"Lembro que Zilda Arns foi a fundadora da Pastoral da Criança. Assim como em todo o Brasil, também em Vila Velha, há mais de 25 anos ajudou a tirar crianças da desnutrição infantil com o acompanhamento das agentes de Pastoral da Criança. Com certeza nesta região da Upa não foi diferente. Como coordenador de Pastoral da área de Vila Velha, acredito que foi deselegante afirmar que Zilda Arns é uma pessoa que ninguém conhece", afirmou o padre na mensagem enviada a Arnaldinho.
Em carta aberta aos moradores de Vila Velha, divulgada nesta segunda, o Vicariato para Assistência Social, Política e Ecumênica da Arquidiocese de Vitória resgatou a história de Dona Zilda, "mesmo que seja dispensável sua apresentação a todos que tenham o mínimo respeito à história e memória dos que antes vieram e deixaram um legado com suas ações" e considerou a declaração de Arnaldinho um "descaso".
"Ao passo que novos e velhos políticos logo serão esquecidos pela insignificância de suas histórias, Dra Zilda não será, pois deixou um legado para toda a humanidade, reconhecida pela comunidade internacional. Ela vive! Suas ações permanecem!", diz o texto.
Arnaldinho foi secretário municipal de Assistência Social de Vila Velha entre 2014 e 2015, na gestão de Rodney Miranda (então filiado ao DEM). A pasta é responsável pela garantia da proteção social dos moradores e pela promoção da cidadania, com ações para crianças e adolescentes, idosos, pessoas com deficiência, população de rua e vítimas de violência e maus-tratos.
Por nota, o prefeito Arnaldinho Borgo afirmou que a ideia era batizar a UPA com o nome de alguém que tenha lutado pelos moradores da Região 5 de Vila Velha, porque "essa foi uma reinvindicação das comunidades do entorno". Disse ainda que reconhece a importância do trabalho da médica Zilda Arns.
"Reconheço a importância do trabalho que a Dra Zilda Arns desenvolveu em prol dos menos favorecidos, principalmente as crianças. O que a levou a ser uma referência mundial, sendo indicada inclusive, após sua morte, ao Prêmio Nobel da Paz. Em vida, Dra Zilda recebeu diversas honrarias nacionais e internacionais. Todas elas reconhecendo também sua importância na criação da Pastoral da Criança, um dos importantes serviços prestado pela Igreja Católica, da qual faço parte e sou atuante", afirmou.
Arnaldinho informou também, na nota, que manterá o nome da unidade em homenagem à médica pediatra e sanitarista.
"Estou surpreso por ver essa manifestação distorcida politicamente, espalhada erroneamente, mas acredito que o diálogo seja importante e esclarece tudo. Recebi manifestações de integrantes da Pastoral da Criança, dialogamos e mantive o compromisso de manter a homenagem à Dra Zilda Arns Neumann", concluiu.
Nascida em Forquilhinha, Santa Catarina, em 1934, Zilda Arns Neumann se formou em medicina na Universidade Federal do Paraná e se especializou em Pediatria, Saúde Pública e Sanitária. Trabalhou em hospitais catarinenses e foi Secretaria de Saúde do Paraná.
Em 1983, Zilda fundou a Pastoral da Criança, um programa de ação social da CNBB. A médica tinha o apoio de Dom Paulo Evaristo Arns, seu irmão. O programa começou com um pequeno grupo de voluntários paraenses e atualmente a instituição está presente em todo o Brasil e em dezenas de países da África, da Ásia e da América Latina.
Pela atuação, recebeu dezenas de prêmios e menções honrosas dentro e fora do país. Em 2006, foi indicada ao Prêmio Nobel da Paz. Quatro anos depois, no dia 12 de janeiro de 2010, faleceu durante o terremoto em Porto Príncipe, no Haiti. Após 10 anos, a família da pediatra tem a intenção de torná-la santa.
Arns passou pelo Espírito Santo em 2004, quando foi recebida pelo então governador Paulo Hartung e pelo então prefeito da Capital Luiz Paulo Vellozo Lucas e homenageada pela Assembleia Legislativa do Estado.
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