Após a Operação Volátil, da Polícia Federal, que apura possível superfaturamento e fraude na aquisição de R$ 6,3 milhões em álcool gel pelo governo do Espírito Santo, o presidente da Assembleia Legislativa, Erick Musso (Republicanos), quer que o secretário de Economia e Planejamento, Álvaro Duboc, vá à Casa dar explicações sobre a compra.
Duboc é o responsável pelo Centro Integrado de Comando e Controle (CCC) de gastos do governo do Estado durante a pandemia de Covid-19. Ele não é citado no procedimento aberto pelo Tribunal de Contas da União (TCU) para apurar irregularidades no contrato e a Polícia Federal não indicou, até o momento, participação de agentes públicos.
Após a publicação da reportagem, a Secretaria de Economia e Planejamento informou, por meio de nota, que o centro coordenado por Álvaro Duboc "não atuou e não atua compra de equipamentos, substâncias e materiais destinados ao enfrentamento à pandemia", mas à organização do plano de logística para recebimento e distribuição. Confira a nota completa no fim da reportagem.
A ida do secretário à Assembleia não é uma convocação, mas um convite costurado pelo líder do governo, deputado Dary Pagung (PSB) após a sessão desta segunda-feira (14).
Na tribuna da Casa, Erick Musso subiu o tom ao falar sobre Duboc e solicitou que a Mesa Diretora o convocasse para explicar a compra realizada.
Isso após a maioria dos deputados terem indicado que votariam contra requerimento protocolado por Sergio Majeski (PSB) e Theodorico Ferraço (DEM) para convocar o secretário de Saúde, Nésio Fernandes, e outros envolvidos na aquisição de álcool gel para prestar esclarecimentos.
“Não é o secretário Nésio que tem que responder sobre compra de álcool em gel, mas o secretário Álvaro Duboc. Ele era o presidente do comitê de controle e acompanhamento de gastos do governo do Estado para aquisição de qualquer ferramenta, material, durante a pandemia. Já peço à secretaria geral da Mesa que já possa providenciar, neste momento, o seu comparecimento à Assembleia Legislativa”, afirmou Erick Musso.
A convocação de um secretário de Estado só pode ser feita por deliberação em plenário ou pela Mesa Diretora. No caso de o pedido vir da presidência, ele precisa ser chancelado pelo 1º ou 2º secretários, que são, respectivamente, Dary Pagung e Alexandre Quintino (PSL), ambos da base do governo.
A Mesa não chegou a deliberar o pedido. Em vez disso, foi feito um acordo para que Pagung convide o secretário de governo Álvaro Duboc a ir à Assembleia, em uma data que ainda vai ser definida. Como não se trata de uma convocação, mas um convite, Duboc não é obrigado a comparecer.
Ainda na sessão desta segunda, Erick Musso disse que o posicionamento dele não é “nenhum tipo de confronto ou ataque direto ao governador do Estado”, Renato Casagrande (PSB). No início da sessão, contudo, o presidente da Casa havia ironizado o fato de o governo não ter se manifestado sobre o pedido de explicações que ele havia feito.
“Eu fico feliz quando o deputado Dary Pagung explana todas essas questões porque era exatamente isso que a Assembleia havia solicitado ao governo do Estado. Acredito que não quiseram mandar nominalmente ao Erick”, disse, em referência à nota que foi enviada pelo governo e lida por Dary em plenário.
Há cinco meses, Erick Musso disse que ajudaria Casagrande a “carregar o piano”. E se reelegeu presidente com o apoio do governador. Apesar disso, Erick tem adotado ações dissonantes das do Palácio Anchieta. Articulou, por exemplo, conversas com representantes de escolas e comércios e defendeu a volta das atividades quando elas ainda estavam proibidas pelo governo do Estado, que segue a Matriz de Risco de contágio pelo novo coronavírus.
O principal debate da sessão desta segunda-feira (11) foi sobre a convocação do secretário de Saúde, Nésio Fernandes, e de outros servidores envolvidos no contrato investigado pela Polícia Federal na compra de álcool gel, além de representantes da empresa que vendeu o produto.
O pedido foi protocolado pelos deputados Majeski, que é do mesmo partido do governador, e Theodorico Ferraço. Eles são membros da Frente Parlamentar de Fiscalização dos Recursos Federais, Estaduais e Municipais Empregados pelos Poderes Executivos Estadual e Municipais na Execução de despesas para o Combate à Pandemia do Covid-19.
“Fica claro que na mesma ocasião que essa empresa ofereceu álcool à Sesa, ela ofereceu a um município de Rio Janeiro pelo menor preço. Não há o menor cabimento nessa diferença de preço. Além disso, existem outros pontos que se não forem ilegais, eles precisam ser esclarecidos. Quando o governo do Estado chegou a uma empresa que não é do ramo?”, questionou Majeski.
Antes da votação, os deputados se manifestaram sobre o assunto. A oposição pressionou pela convocação do secretário de Saúde e até pleiteou a abertura de uma CPI. Enquanto os deputados da base saíram em defesa do governo do Estado, argumentando que o momento da compra era de escassez e que haveria uma motivação política no pedido.
A maioria dos parlamentares rejeitou o requerimento. Foram 20 votos contra e seis a favor. Apenas parlamentares de oposição e os autores do pedido votaram pela convocação.
O deputado Dary Pagung leu, durante a sessão, uma nota enviada pelo governo do Estado, dando explicações sobre a aquisição de álcool gel, e pedindo que os parlamentares votassem contra o requerimento de convocação do secretário de Saúde. Segundo Dary, a compra foi feita em um momento de escassez e não havia uma única empresa que conseguisse vender toda a quantidade solicitada pelo governo do Estado.
“O momento era de desabastecimento no mercado e o Espírito Santo teve êxito em adquirir o volume máximo que cada um dos fornecedores poderia entregar. Em função disso, ocorreu o parcelamento de quantidade por fornecedores, dados estes que estão no processo de compra. O alerta quanto a possíveis irregularidades partiu da própria Sesa, em junho de 2020, sem, contudo, interromper a aquisição, dada sua importância para aquele momento crítico da pandemia, em que álcool e máscaras eram imprescindíveis para frear o avanço do vírus”, dizia a nota.
“A informação de que a aquisição da empresa desclassificada geraria economia de R$ 3 milhões ao Estado não é factível, visto que o governo do Estado não poderia adquirir os produtos das empresas citadas, seja porque as mesmas não tinham a quantidade requerida, seja porque era exigido pelos fornecedores citados o pagamento antecipado, condição não aceita pelo governo do Espírito Santo”, completou.
O parlamentar também afirmou que a possibilidade de fraude foi identificada pelo governo do Estado e está em apuração. Caso seja comprovada qualquer irregularidade, os responsáveis vão ser punidos.
"A aquisição da Sesa passou por análise da Secretaria de Estado Controle e Transparência (Secont), que identificou a possiblidade de fraude relacionada ao atestado de capacidade técnica, entre outros indícios não relacionados a sobrepreço. O processo está em curso e, confirmada a irregularidade, as empresas serão punidas com base na Lei Anticorrupção Empresarial", finalizou.
A reportagem procurou o secretário Álvaro Duboc, via assessoria de imprensa, para saber se ele pretende ir à Assembleia Legislativa e prestar esclarecimentos. O questionamento, contudo, não foi respondido.
Por meio de nota, a Secretaria de Economia e Planejamento limitou-se a dizer que a atuação de Duboc no Centro de Comando e Controle não envolve compra de equipamentos ou quaisquer materiais relacionados ao enfrentamento à pandemia de Covid-19. Confira a nota completa:
Instalado em 21/03/2020, pelo Governo do Espírito Santo, o Centro Integrado de Comando e Controle (CCC), coordenado pelo secretário de Economia e Planejamento, Álvaro Duboc, não atuou e não atua na compra de equipamentos, substâncias e materiais destinados ao enfrentamento à pandemia do novo Coronavírus (Covid-19), limitando-se, nesse caso, à organização do plano de logística para recebimento e distribuição. O CCC coordena ações e esforços desenvolvidos pelo Governo do Estado no enfrentamento à Covid-19, com foco nas áreas da Saúde, Proteção Social e Economia, para a retomada gradual das atividades. Organiza e monitora informações, com vistas à elaboração de linhas de ação que subsidiam o processo decisório do governador, em relação à pandemia. Atua promovendo e coordenando um conjunto de ações de diagnóstico de situação e elaboração de planos de resposta, restabelecimento e recuperação dos danos sociais e econômicos causados pela pandemia do novo Coronavírus, realizadas de forma sistêmica e articulada entre as instituições, agências, atores e organismos sociais para o enfrentamento à Covid-19, visando a efetivação de medidas voltadas ao bem-estar da população do Espírito Santo.
A Operação Volátil o teve início após a análise de relatórios da Superintendência da Controladoria Geral da União no Espírito Santo (CGU-ES) e do Tribunal de Contas do Espírito Santo (TCES). Os documentos apontaram para irregularidades na compra de álcool gel pela Sesa, em processo de compra com dispensa de licitação nos meses de março e abril de 2020.
Foram adquiridos 400 mil frascos de 500 ml cada um de álcool gel pela Secretaria de Estado da Saúde a um custo total de R$ 6,3 milhões.
As auditorias realizadas pelos órgãos de controle e as investigações conduzidas pela PF indicam que a empresa que forneceu o álcool para a Sesa foi criada com a finalidade de participar do certame, sem qualquer histórico de atuação no fornecimento desse tipo de material. Há ainda indícios do uso de documento falso para comprovar a capacidade técnica de fornecimento do produto, assim como o indicativo de superfaturamento.
Durante as investigações foi possível constatar que os empresários envolvidos movimentaram os recursos recebidos com a venda do álcool para o governo do Espírito Santo para outras empresas do grupo, parentes e empresas em nome de terceiros, em operações financeiras típicas da prática de lavagem de dinheiro.
O mesmo grupo criminoso também é investigado no Rio de Janeiro e seus integrantes, de acordo com a Polícia Federal, foram alvo da Operação Chorume, da Polícia Civil do Rio de Janeiro e do Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ), deflagrada em março deste ano. A Polícia Federal e os órgãos responsáveis pela operação fluminense compartilharam informações que culminaram na Operação Volátil.
A reportagem foi atualizada com a resposta enviada pela Secretaria de Economia e Planejamento (SEP), coordenada por Álvaro Duboc.
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta