Parte do acordo que resultou no apoio do governo de Renato Casagrande (PSB) à reeleição de Erick Musso (Republicanos) ao cargo de presidente da Assembleia Legislativa, o projeto de resolução nº 2/2021, apresentado pela Mesa Diretora em fevereiro deste ano, está parado na Comissão de Justiça há mais de 60 dias. Sem regime de urgência, a matéria parece não figurar nem entre as prioridades dos deputados, nem do governo estadual.
O texto revoga uma alteração, feita em 2019, que permite ao presidente da Casa criar comissões parlamentares de inquérito (CPIs) além das que são autorizadas pelo Regimento Interno. Atualmente, cinco CPIs estão abertas, número máximo permitido. Com a regra atual, Musso poderia, com uma canetada, determinar a abertura de mais colegiados.
Apresentado no dia 22 de fevereiro, o texto foi para a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) no dia 12 de março e, seis dias depois, distribuído para o gabinete do deputado Vandinho Leite (PSDB), escolhido como relator. Desde então, não houve avanço na tramitação.
Questionado sobre o motivo de deixar a proposta na gaveta por mais de 60 dias, o tucano admitiu que pautas do Legislativo "ficaram em segundo plano".
"Devido ao atual momento de pandemia, em que tantos projetos importantes para a sociedade e de extrema urgência para o socorro da população chegaram à Casa, algumas pautas do Legislativo ficaram em segundo plano. No entanto, serão relatadas normalmente, assim que provocadas as devidas discussões", disse, por nota.
Nesta quarta-feira (9), 15 dias após a publicação deste texto, Vandinho Leite enviou novo posicionamento para a reportagem. Informou que os atrasos ocorreram devido ao grande número de projetos sob relatoria dele.
"Diferentemente do que foi informado por sua assessoria, o deputado Vandinho Leite informa que ocorreram atrasos no relatório do projeto por conta do grande volume de matérias que ele tem relatado. No entanto, será solicitada ao presidente a inclusão da matéria na próxima sessão da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), momento em que será relatada", afirmou, na nova nota.
O líder do governo na Casa e primeiro secretário da Mesa, Dary Pagung (PSB), e o secretário da Casa Civil, Davi Diniz – as duas principais pontes entre Casagrande e os deputados – não quiseram se manifestar sobre a demora na tramitação.
A Assembleia afirmou apenas que as informações sobre a tramitação poderiam ser passadas apenas pela Comissão de Justiça.
Quando foi apresentada, a proposta foi apontada por Pagung como um dos acordos fechados entre Musso e o governador para que o chefe do Executivo (e sua grande base aliada na Casa) apoiassem a recondução do republicano ao cargo de presidente, pelo terceiro biênio consecutivo.
Um outro pilar da negociação foi a revogação de uma resolução, também de 2019, que dava "superpoderes" ao presidente da Assembleia, ao concentrar em sua caneta as competências de toda a Mesa. O republicano prometeu que faria a mudança assim que fosse reconduzido ao cargo, mas só cumpriu com o combinado 51 dias após a reeleição.
Logo no início de seu terceiro biênio como presidente, os acenos para o governador eram constantes nos discursos e atitudes de Musso. Na posse, reforçou o compromisso de caminhar com o governo e, em um evento público, afirmou que o socialista poderia contar com ele para "carregar o piano".
Em março, Musso endossou a decisão do governo de implementar a quarentena no Estado, devido ao agravamento da pandemia de Covid-19. Juntamente com os chefes dos outros Poderes, participou da apresentação das medidas restritivas e discursou em apoio às regras. "Uma decisão amarga, mas necessária para o atual momento", disse na ocasião.
No mês seguinte, no entanto, o republicano assumiu um discurso desalinhado ao do Palácio Anchieta. Reuniu-se com representantes do comércio e de escolas e publicou vídeos em redes sociais defendendo que os estabelecimentos "precisavam funcionar diariamente". O movimento foi encarado por interlocutores do governo como uma tentativa de assumir um protagonismo político, o que não significaria uma ruptura, mas poderia afastar as duas lideranças.
O parlamentar ainda apareceu em um vídeo do prefeito de Vitória, Lorenzo Pazolini (Republicanos), endossando a decisão do correligionário de anunciar a volta às aulas presenciais antes da liberação pelo governo do Estado, que é responsável por estabelecer as medidas de enfrentamento à pandemia no Estado.
O movimento foi visto por articuladores políticos como uma tentativa do partido Republicanos de se diferenciar da imagem do governador e assumir protagonismo político, em um momento em que as medidas restritivas atraíram críticas de diversos setores da sociedade.
Mais recentemente, após a integração de comarcas do Tribunal de Justiça do Estado (TJES) voltar a pauta de julgamento do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o chefe do Legislativo voltou a atenção para o tema, posicionando-se contra a decisão do Judiciário e convocando, para uma reunião na Assembleia, prefeitos, vereadores e sindicalistas como uma forma de pressionar contra a medida.
A reunião foi marcada após o procurador-geral do Estado, Jasson Amaral, fazer uma sustentação oral, no julgamento, defendendo a decisão do TJES de integrar as 27 comarcas no interior. Até então, o Estado estava neutro na questão.
Após a publicação deste texto, a assessoria do deputado Vandinho Leite, relator do projeto na Comissão de Constituição e Justiça da Assembleia, entrou em contato para afirmar que a nota enviada para a reportagem não havia passado pelo crivo do parlamentar. O novo posicionamento enviado pela equipe de Vandinho foi acrescentado a este conteúdo.
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