Após o Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES) ter decidido, em setembro deste ano, desativar 51 cartórios, em 30 comarcas do Estado, por identificar que eram unidades que estavam em déficit, o deputado estadual Enivaldo dos Anjos (PSD) apresentou um projeto de Decreto Legislativo para anular o ato. O texto já entrou na pauta do plenário da Assembleia Legislativa em regime de urgência nesta segunda-feira (11), para ser apreciado pelas comissões.
A decisão de desativar os cartórios foi por meio de um ato da Corregedoria do TJES. Foram atingidos cartórios apontados com "absoluta inviabilidade econômico-financeira". De acordo com o Justiça Aberta, base de dados disponibilizada no site do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), os cartórios desativados arrecadaram de R$ 129 a R$ 66,8 mil em todo o primeiro semestre de 2019. Após a abertura de prazo para pedidos de reconsideração, foram desatifados, de fato, 40 cartórios.
Outra razão para a extinção foram os cartórios que constavam como "vagos", ou seja, com um responsável não concursado, há mais de cinco anos. Os últimos concursos foram realizados pelo Tribunal em 2006 e 2013. Com a desativação dessas serventias extrajudiciais, os serviços oferecidos, como a emissão de escrituras, certidão de nascimento, casamento e óbito, deveriam ser transferidos do cartório que foi fechado para outro que exercesse as mesmas atividades na sede no município. Todos os afetados estão no interior do Estado.
De acordo com o projeto de Enivaldo, o ato da Corregedoria deve ser anulado pois contraria a Constituição Federal, a "Lei dos Cartórios", e também a orientação do CNJ. Isso porque as alterações só poderiam ser feitas por meio de lei, e não por ato normativo. Além disso, segundo orientação do CNJ, o projeto de lei de reestruturação deveria ser apresentado ao Poder Legislativo em um prazo de 90 dias. Por fim, cita que a lei federal dos cartórios prevê que cada sede municipal ou distrital deve dispor de no mínimo de um registrador civil das pessoas naturais.
Além dos argumentos jurídicos, o deputado afirma que a extinção dos 40 cartórios afeta diretamente a vida de milhares de capixabas que deixarão de ter a prestação do serviço em seus distritos de residência, os obrigando a se deslocarem para as sedes dos municípios, impondo mais despesas a esses cidadãos. "Foram fechados cartórios com mais de 90 anos de funcionamento. Há serventias que tinham escrevente efetivo. Esses funcionários vão para onde?", afirma.
Enivaldo também questiona a avaliação dos cartórios como "deficitários". De acordo com a legislação estadual, 40,5% das taxas pagas nos cartórios são destinadas ao dono, e são esses recursos que ele deve utilizar para os custos operacionais e para sua renda. Outros 27,5% vão para o pagamento de imposto de renda, e o restante é dividido entre 5 fundos, entre eles, 10% vão para o Fundo Especial do Poder Judiciário do Estado do Espírito Santo (FUNEPJ).
"Não se justifica haver déficit. Uma das obrigações do fundo é custear os cartórios deficitários. Esses recursos já estão sendo pagos pela população, por meio das taxas, e o tribunal fica com esses recursos, para destinar a outras áreas. Há mais de R$ 200 milhões em caixa no Fundo", afirma Enivaldo.
Durante o início da tramitação do projeto, nesta segunda, o presidente da Comissão de Justiça, Fabrício Gandini (Cidadania), pediu prazo regimental para analisá-lo. Ele tem três sessões para a avaliação.
Procurada, a Corregedoria do Tribunal de Justiça explicou que a desativação do serviço não pode se confundir com a extinção da serventia. "As serventias não foram extintas, mas apenas desativadas por absoluta inviabilidade de funcionamento e nos limites da estrita competência do TJES", disse, por nota. A Corregedoria acrescentou que recebeu o apoio de diversos setores, inclusive daqueles ligados aos cartórios extrajudiciais, todos favoráveis à desativação. Além disso, concedeu prazo para que qualquer cidadão pudesse justificar a manutenção dos cartórios. Poucos pedidos de reconsideração foram feitos e quase todos acolhidos.
"Dentre as 51 serventias originariamente desativadas pelo ato normativo, foram reativadas 4 serventias extrajudiciais e foram suspensas a desativação de outras 7 serventias, em razão de relevantes argumentos que serão devidamente analisados. Foram mantidos os atos de desativação imediata de todas as outras 40 serventias cujas desativações não foram impugnadas. Não foram desativados cartórios com titulares, mas apenas aqueles ocupados por interinos, segundo critério estabelecido pelo CNJ".
A Corregedoria também rebateu o argumento de que o ato normativo contraria a Constituição e outras legislações, e frisou que na verdade, a desativação decorre de exigência da Corregedoria Nacional de Justiça. Segundo ela, é a extinção que exige a aprovação de uma lei formal, enquanto a desativação é matéria discricionária do Poder Judiciário, "o qual é responsável por apurar a inviabilidade financeira do funcionamento da serventia". "A Corregedoria Geral da Justiça do Estado do Espírito Santo agiu exclusivamente no âmbito de sua competência exclusiva, não invadindo a competência de outro Poder, que muito respeita e admira", completou.
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