A Câmara e a Prefeitura da Serra elaboraram projetos de lei para reduzir, durante o período de calamidade provocado pelo novo coronavírus, os salários de prefeito, vice-prefeita, vereadores e secretários. Uma das propostas, protocolada na última quinta-feira (14) por um grupo de 14 parlamentares, propõe o corte linear de 30%, que alcançaria também subsecretários e assessores especiais.
Já nesta segunda-feira (18), o prefeito Audifax Barcelos (Rede), informou que vai enviar um projeto à Câmara propondo a redução de 30% em seu salário e no de sua vice, Márcia Lamas (PSB), além do corte de 10% no subsídio de secretários.
Segundo o presidente da Câmara da Serra, Rodrigo Caldeira (Rede), a proposta dos parlamentares terá prioridade para ser votada, já que foi protocolada primeiro. A previsão é que a matéria seja analisada na próxima quarta-feira (20), em sessão legislativa. Uma emenda deve ser inserida no projeto, excluindo da redução salarial servidores que tiverem seus salários regulados pelo teto municipal, que é o subsídio do prefeito. Para estes casos, vai valer a remuneração integral do prefeito.
"Construímos uma proposta na semana passada, que conta com a assinatura de 14 vereadores, mas que já tem o aval de todos, por isso vamos votar primeiro. O prefeito está querendo protocolar esse projeto, como se isso tivesse sido uma iniciativa dele, mas a Câmara já tinha dado início a essa discussão", afirma Caldeira.
Pelo projeto anunciado pela prefeitura, subsecretários e assessores especiais não estariam incluídos. A proposta do Executivo ainda fala em redução no salário de cargos de mesma natureza de secretários, além do diretor presidente do Instituto de Previdência da Serra (IPS). O conteúdo divulgado pelo município, contudo, não especifica quais cargos seriam esses.
Outra diferença, em comparação ao projeto dos vereadores, é o que o corte para secretários seria menor, em vez de 30%, 10%.
"Tem secretário que ganha mais do que vereador. Por que o corte deles tem que ser menor? Os assessores especiais que incluímos são aqueles chamados 'secretários sem pasta', existem uns nove deles na folha do município", explica o presidente da Casa.
Atualmente, o prefeito tem uma remuneração bruta de R$ 15,7 mil e a vice-prefeita, de R$ 12,6 mil. Já os secretários recebem, em média, R$ 11 mil. Um vereador da Serra recebe R$ 9,2 mil.
De acordo com o projeto do Executivo, a verba economizada será direcionada exclusivamente para custear ações de combate ao coronavírus, como compra de equipamentos de proteção para os profissionais de saúde e a montagem de mais leitos. A economia mensal projetada é de R$ 42.768,21. Por ano, a previsão é economizar R$ 320 mil.
A aplicação prioritária para Saúde e Assistência Social, segundo a prefeitura, poderá ser acompanhada pelo Portal da Transparência do município.
De acordo com o Executivo municipal, os servidores públicos que recebem benefícios ou gratificações vinculados ao subsídio do prefeito ou dos secretários municipais não serão afetados, obedecendo ao princípio da irredutibilidade salarial.
Até a manhã desta terça-feira (19), o projeto, segundo Caldeira, ainda não havia chegado para a análise dos vereadores. A Prefeitura da Serra, contudo, informa que a proposta de redução de salários feita pelo município foi protocolada na segunda-feira.
A legislação determina que servidores municipais não podem ter subsídios maiores que o do prefeito. Assim, categorias de cargos superiores dentro das prefeituras têm seus salários, benefícios e gratificações equiparados aos vencimentos do chefe do Executivo. Se o valor acumulado ultrapassar esse limite, incide o chamado abate-teto. Neste caso, uma redução no salário do prefeito poderia incindir no corte da remuneração destes trabalhadores.
Contudo, os projetos de redução de salários elaborados pelos vereadores e pela prefeitura excluem a possibilidade de diminuição dos subsídios dos servidores que obedecem esse regra. Ou seja, eles devem continuar recebendo os valores limitados ao salário integral do prefeito, sem o corte de 30%.
Especialistas explicam que a Constituição veda, via de regra, a redução de salário dos servidores, pelo princípio da irredutibilidade de vencimentos. A norma foi construída, como explica o professor de Direito e advogado Caleb Salomão Pereira, para evitar perseguições políticas dentro do funcionalismo. A exclusão destes servidores do projeto, para ele, pode ter sido construída dessa forma para dar maior segurança jurídica para a lei, mas ele alega que, em tempos de pandemia, a redução de salário de outras categorias pode ser reavaliada posteriormente.
"Para mim, a irredutibilidade de salários não é uma cláusula pétrea (que não pode ser alterada). É uma norma que deve, sim, ser seguida, mas em tempos de normalidade. Como estamos vivendo um período de pandemia e com condição econômica adversa, acredito que ela pode ser discutida. Agora, isso não quer dizer que o primeiro passo é reduzir salário de servidores. Me parece imoral diminuir a remuneração de concursados sem antes cortar cargos comissionados, muitos deles de cunho político, uma mera barganha eleitoral de muitos políticos", opina.
O advogado e professor de Direito Administrativo Diego Moraes explica que o próprio Tribunal de Contas do Espírito Santo (TCES) possui um entendimento de que a redução salarial, feita de maneira voluntária por agentes políticos, não pode acarretar prejuízos para servidores.
"Se não houvesse esse trecho fazendo essa ressalva [nos projetos], certamente isso seria questionado pelos próprios servidores que se sentiriam lesados. Mas como é algo voluntário dessas categorias descritas, ou seja, se não tem ninguém sendo lesado, a chance da norma ser questionada judicialmente é menor. Isso não impede, contudo, que o Ministério Público, ou outros órgãos de controle possam exigir que a redução atinja a todos e que o teto seja a nova remuneração", analisa.
Serra é a cidade capixaba com maior número de mortes por coronavírus. Dos 285 óbitos registrados em todo o Espírito Santo até o último domingo (17), 78 eram do município. A cidade já registrou 1333 casos da Covid-19, segundo última atualização da Secretaria de Estado da Saúde, a Sesa.
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