O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) tem apostado cada vez mais no discurso de governar contra todos. Este é o tom, por exemplo, do vídeo das hienas atacando um leão, publicado em suas redes sociais em outubro, em que ele sugere estar sendo atacado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a imprensa.
Também é este o sentido adotado em recente mensagem enviada a aliados, via WhatsApp, convocando atos contra o Congresso e o STF, em que o presidente é descrito como alguém que sofre e luta pela nação.
Além da tensão com os Poderes, Bolsonaro tem acirrado a relação com os governadores, ao jogar para os Estados a responsabilidade pelos preços altos dos combustíveis, acusando a carga de ICMS no produto, como fator para o seu encarecimento.
Neste ringue, quem sai perdendo? Bolsonaro, por se ver cada vez mais ilhado e sem conseguir aprovar seus projetos? Ou os próprios Poderes, uma vez que o presidente, que tem um considerável apoio popular, joga para as instituições a culpa pelo que não consegue realizar?
Para o cientista político e professor do Insper Leandro Consentino, mais importante que saber quem sai ganhando é observar que o distanciamento de Bolsonaro é reincidente, o que o leva a crer que isso se tornou uma estratégia do presidente para manter seu eleitorado. Consentino acredita que esse modo de atuação, contudo, flerta com o populismo e é uma maneira de o presidente evitar admitir insucesso em suas articulações políticas.
Dificuldade de se articular com o Congresso, pautas emperradas e ameaças de impeachment. O cenário em que Bolsonaro se encontra se assemelha, na visão de analistas, ao de seus dois antecessores: Michel Temer (MDB) e Dilma Rousseff (PT). Para Consentino, a figura do presidente da República continua fragilizada e sem conseguir se movimentar.
Enquanto Dilma viveu seu segundo mandato com a ameaça de um impeachment, Temer, em um mandato tampão, não teve forças para aprovar reformas, principalmente após o vazamento das delação do empresário Joesley Batista.
Bolsonaro, como um presidente legitimado pelas urnas, poderia ter a legitimidade de dialogar com o Congresso e fazer a coalizão. Como ele não tem feito e o poder não aceita vácuos, o Congresso vem crescendo em suas atribuições, analisa.
Para o cientista político, os sinais do crescimento do poder do Congresso podem ser vistos nas derrotas do governo durante a Reforma da Previdência, principalmente no que diz respeito às regras impostas aos militares; a aprovação do orçamento impositivo, medida que aumenta os poderes do Legislativo nos recursos da União; e na proposta já aprovada de se diminuir o prazo de vigência das medidas provisórias, que aguarda a promulgação da Câmara.
Consentino cita outros exemplos de governos que ficaram paralisados, por inabilidade de lidar com outros Poderes, como os dos ex-presidentes Deodoro da Fonseca, Jânio Quadros, Fernando Collor e Dilma, que acabaram deixando os cargos, por renúncia ou por impeachment. "Mas isso não significa que Bolsonaro não terminará seu mandato", alerta.
As manifestações do dia 15 podem ser, para ele, um termômetro para saber se a estratégia de provocar os embates dará resultado.
O que diferencia eles do presidente Bolsonaro é o apoio que ele tem da opinião pública, que não viu essa paralisia no governo dele. É importante ver como vão ser essas manifestações do dia 15, se será uma derrota ou se ele vai sair mais forte desses embates, pontua.
Um dos que protagonizaram embate com o presidente foi o governador do Espírito Santo, Renato Casagrande (PSB). Ele foi um dos 20 governadores que assinaram uma carta contra declarações de Bolsonaro sobre o preço dos combustíveis. Para o presidente, os preços estavam mais altos por conta dos Estados, que não aceitavam reduzir impostos. O próprio governo federal, no entanto, também poderia abrir mão de receita para reduzir o preço.
Para o cientista político Fernando Pignaton, o governador agiu de maneira política no episódio, o que, para ele, é legítimo. Pignaton defende, entretanto, que é preciso manter a relação institucional entre os governos estadual e federal, a fim de evitar prejuízos para o Espírito Santo.
A provocação de Bolsonaro sobre o ICMS foi mais um ato populista do presidente. Ao responder, o governador está chamando por um protagonismo político, não só neste caso, mas na questão dos militares amotinados no Ceará, em que também houve troca de farpas. Casagrande tem adotado um posicionamento político contra o governo Bolsonaro. Ao mesmo tempo, ele precisa ter cuidado e cumprir o papel institucional e defender os interesses do Espírito Santo, comenta.
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