Ministro da Educação cantando para rebater críticas, parlamentares quase chegando a trocar socos em plenário, procurador-geral da República revelando que planejou matar um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), ex-presidente preso, ex-presidente solto e o atual presidente comprando briga até com astros de cinema. O ano de 2019 foi, no mínimo, atípico até para os padrões da política brasileira.
A polarização política que ganhou corpo durante as eleições de 2018, continuou crescendo em 2019 e resultou em ataques cada vez mais agressivos na classe política, até mesmo entre aqueles que até outrora eram aliados. O núcleo do presidente Bolsonaro não resistiu ao primeiro ano de mandato e levou o mandatário a romper com o próprio partido, o PSL, levando alguns líderes que estiveram ao seu lado durante a campanha eleitoral como o presidente do PSL, Luciano Bivar, e os deputados federais Joice Hasselmann e Alexandre Frota para o time dos seus adversários políticos.
O clima de dias atípicos não ficou só no clã Bolsonaro. Seu antecessor, Michel Temer (MDB), foi levado à prisão duas vezes, em março e em maio, acusado de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e desvio de dinheiro público durante a construção da usina nuclear de Angra 3, no Rio de Janeiro. Temer foi liberado quatro dias depois de sua prisão e responde em liberdade.
Quem também estava preso e ganhou liberdade foi o ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva (PT), após um ano e sete meses na carceragem da Superintendência de Polícia Federal do Paraná. O petista foi beneficiado pela decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que decidiu derrubar a possibilidade de prisão de condenados em segunda instância.
O ano ainda contou com o vazamento de conversas da força-tarefa da Lava Jato, que expuseram a intimidade entre procuradores e o então juiz Sergio Moro, que colocam em cheque a imparcialidade do juiz ao orientar as ações do Ministério Público Federal (MPF).
Reunimos as notícias mais importantes e as mais surreais que aconteceram no Brasil neste ano. Relembre:
2 de janeiro: Mal o presidente tomou posse e a primeira polêmica de seu governo ganhou as redes sociais. A ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, que é pastora evangélica, disse em um grupo de amigos que o Brasil estava em uma nova era, onde menino veste azul e menina veste rosa. A ministra afirmou que a afirmação foi uma metáfora contra o que ela chama de ideologia de gênero e defendeu que a identidade biológica das crianças seja respeitada. Famosos, como Luciano Huck e Caetano Veloso, publicaram fotos vestidos de rosa e houve críticas também de movimentos LGBTI.
18 de janeiro: A primeira dor de cabeça que o presidente Jair Bolsonaro teve que enfrentar, e ainda enfrenta, foi com as suspeitas da prática de rachid no gabinete do filho, o senador e ex-deputado estadual do Rio de Janeiro, Flávio Bolsonaro. A investigação começou em janeiro de 2018, no âmbito da Lava Jato no Rio de Janeiro, mas, uma operação realizada pelo Ministério Público do Rio de Janeiro apontou que imóveis no nome de Flávio Bolsonaro podem ter sido usados para lavagem de dinheiro. A denúncia era de que o ex-assessor Fabrício Queiroz, amigo da família Bolsonaro, cobrava parte do salário dos funcionários de gabinete. Saiba mais.
24 de janeiro: Com medo de ameaças feitas a ele e a sua família, o ex-deputado federal Jean Wyllys (PSOL) abriu mão de seu terceiro mandato na Câmara e decidiu viver fora do país. O anúncio foi feito em entrevista à Folha de S.Paulo. O parlamentar não divulgou o país em que vive, mas disse que iria se dedicar à carreira acadêmica. Preservar a vida ameaçada é também uma estratégia da luta por dias melhores, resumiu o ex-parlamentar em um post de despedida nas redes sociais. O vereador Carlos Bolsonaro escreveu em suas redes Vá com Deus e seja feliz para Wyllys.
Fevereiro de 2019: A Polícia Federal e o Ministério Público Federal (MPF) começaram a apurar denúncias de uso de candidatos laranjas no PSL para desviar recursos eleitorais. As investigações analisavam conversas entre líderes do partido e mulheres que disputaram vagas no Congresso. O caso atingiu em cheio o ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, e o ex-ministro da Secretaria-geral da Presidência, Gustavo Bebianno, que acabou exonerado do cargo. Bebianno era um dos coordenadores da campanha de Bolsonaro. Durante as investigações, o vereador do Rio de Janeiro Carlos Bolsonaro (PSC) usou as redes para criticar Bebianno e expôs a primeira crise interna no núcleo de Jair Bolsonaro.
21 de março: Acusado de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e desvio de dinheiro público na construção da Usina Angra 3, em Angra dos Reis, o ex-presidente Michel Temer (MDB) foi à prisão duas vezes em 2019. A primeira vez foi em 21 de março, quando o juiz Marcelo Bretas determinou sua prisão no âmbito da Lava Jato no Rio de Janeiro. Temer ficou quatro dias preso, antes de conseguir um habeas corpus no Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2), por decisão do desembargador Ivan Athié. Em maio, o colegiado reviu o habeas corpus, que havia sido concedido por decisão monocrática. A Primeira Turma do TRF-2 revogou a decisão, ao considerar que a prisão de Temer era necessária para garantir a ordem pública. Ele ficou mais dois dias preso e saiu da cadeia após uma liminar do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
30 de maio: Para negar que tenha reduzido verbas para o Museu Nacional, que pegou fogo em 2018, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, divulgou um vídeo nas suas redes sociais performando a cena clássica do filme Cantando na Chuva. Com um guarda-chuva em mãos, o ministro disse que estava chovendo fake news e apontava que o corte de verbas tinha sido motivado por uma redução de emendas da Bancada do Rio de Janeiro na Câmara, em uma decisão dos próprios parlamentares. Relembre o episódio.
9 de junho: O site The Intercept Brasil, do jornalista norte-americano Gleen Greenwald, passou a publicar conversas entre o coordenador da força tarefa da Lava Jato em Curitiba, Deltan Dallagnol; o então juiz Sergio Moro e o grupo de procuradores envolvidos na operação. O conteúdo mostrava que Deltan procurava Moro para pedir orientações e revela momentos em que o juiz até mesmo sugeriu os rumos das fases da Operação Lava Jato. Supostos hackers acusados de invadir as contas de Moro e Deltan foram presos pela Polícia Federal. O STF acionou a PGR para atestar a autenticidade dos dados vazados.
20 de agosto: Em meio a um sequestro a um ônibus em cima da ponte Rio-Niterói, no Rio de Janeiro, uma equipe de atiradores de elite foi chamada para tentar conter o criminoso. Ao sair do ônibus, o responsável pelo sequestro foi atingido pelos disparos de um sniper, matando o homem e dando fim a uma manhã tensa. O governador Wilson Witzel (PSC) chegou à ponte Rio-Niterói de helicóptero, logo depois da ação. Ao pousar, ele desembarcou com o punho cerrado e dando socos no ar, comemorando o fim da operação. O festejo repercutiu mal nas redes sociais e Witzel foi duramente criticado. Ele disse que comemorou a vida e negou ter festejado a morte do sequestrador.
22 de agosto: A política de Meio Ambiente de Bolsonaro foi alvo de críticas internacionalmente e isso o colocou em rota de colisão com políticos de outros países, atores de cinema e até com uma ambientalista sueca de 16 anos. A primeira treta a ganhar os holofotes internacionais foi entre Bolsonaro e o presidente francês Emmanuel Macron, em agosto. O brasileiro não ficou feliz após Macron usar as redes para chamar a atenção para as queimadas na Amazônia e contra-atacou. A crise piorou quando um seguidor fez um comentário comparando as esposas de Bolsonaro e Macron, insinuando que o francês tinha inveja do brasileiro. Bolsonaro curtiu a postagem e comentou não humilha cara. kkkkk. Um mês depois, em setembro, foi a vez da ex-presidente do Chile Michele Bachelet ser criticada após demonstrar preocupação com a situação na Amazônia. Bolsonaro a acusou de se intrometer nos assuntos internos e na soberania brasileira e fez elogios a ditadura de Augusto Pinochet, que prendeu e torturou o pai da chilena, Alberto Bachelet, que morreu na prisão. Também entrou na mira de Bolsonaro o ator Leonardo DiCaprio, acusado pelo presidente de financiar ONGs responsáveis por tacar fogo na Amazônia, o que foi desmentido pelo astro. Por fim, a ativista Greta Thumberg, de 16 anos, que lamentou a morte de dois caciques no Maranhão, foi chamada por Bolsonaro de pirralha. Em deboche, a sueca usou o termo para atualizar sua descrição no Twitter. No dia seguinte, a ativista foi escolhida a pessoa do ano pela revista Time.
5 de setembro: O prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella, foi as redes sociais criticar a HQ Vingadores - A cruzada que trazia um beijo gay e estava sendo vendida na Bienal do Livro no Rio de Janeiro. No dia seguinte, fiscais foram até a feira para apreender títulos que fossem considerados impróprios. O youtuber Felipe Neto comprou 14 mil cópias do livro e distribuiu na feira com uma embalagem em que estava escrito livro impróprio para pessoas retrógradas. O STF, dias depois, derrubou uma liminar do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro que permitia o recolhimento do livro.
26 de setembro: Em entrevista à Folha de S.Paulo, o ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot disse que entrou uma vez no Supremo Tribunal Federal (STF) armado com uma pistola, com a intenção de matar o ministro de Gilmar Mendes. O caso aconteceu em 2017, quando Mendes teria feito insinuações sobre a filha de Janot. Contudo, os relatos só foram feitos este ano, durante a divulgação do livro recém lançado escrito pelo ex-procurador. Nada menos que tudo, nome do seu livro de memórias, relata ainda que Janot planejava se suicidar após matar o ministro.
8 de outubro: O ano também foi de conflitos internos no próprio partido de Jair Bolsonaro, o PSL. A disputa interna pelo comando da sigla começou a ruir a permanência do presidente na legenda. Em outubro, ao atender um apoiador na saída do Palácio da Alvorada, Bolsonaro disse para o homem, que se apresentou como pré-candidato do partido em Recife, que esquecesse o PSL e que o presidente da sigla, Luciano Bivar, já estava queimado. O caso acirrou ainda mais o racha no partido, que terminou com uma disputa pela liderança do PSL na Câmara, com Eduardo Bolsonaro tomando o cargo que antes pertencia ao deputado Delegado Waldir. A então líder do governo na Câmara, Joice Hasselman (PSL), apoiou Waldir no conflito e acabou sendo retirada do cargo. A liderança do PSL ainda seguiu em disputa na Justiça, que concedeu a Eduardo Bolsonaro a permanência no cargo pouco antes do Natal.
23 de outubro: Após tramitar por oito meses no Congresso, entre a Câmara e o Senado, a Reforma da Previdência foi aprovada. A proposta do governo previa economia de R$ 1,2 trilhão em 10 anos, mas, com alterações feitas, caiu para R$ 800 bilhões em 10 anos. As principais mudanças foram a implantação de uma idade mínima, de 62 anos para mulher e 65 anos para homem; tempo de contribuição mínimo de 15 anos para mulher e 20 anos para homem; além de novas fórmulas de cálculo dos salários. Veja a calculadora para saber quando poderá se aposentar.
28 de outubro: Um vídeo publicado pelo presidente Jair Bolsonaro, onde ele aparece como um leão acossado por hienas representadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF), Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Organizações das Nações Unidas (ONU), entre outras instituições, também foi um dos fatos que comprovam o surrealismo de 2019. No vídeo, o leão Bolsonaro é salvo, ao fim do vídeo, por um novo leão, que representa o conservador patriota. O vídeo gerou uma crise da presidência com o STF. Bolsonaro apagou a postagem e se desculpou pela divulgação.
29 de outubro: Registros da portaria do condomínio Vivendas da Barra, onde mora o principal suspeito de matar a vereadora Marielle Franco e o motorista Anderson Gomes, Ronnie Lessa, mostraram que Élcio de Queiroz, um dos apontados como autores do crime, foi até o condomínio horas antes do assassinato e pediu para ir à casa do então deputado federal Jair Bolsonaro. Apesar disso, a Câmara registrou que Bolsonaro estava em Brasília naquele dia. O caso foi exposto pelo Jornal Nacional. Bolsonaro, que estava na Arábia Saudita, reagiu à reportagem em um vídeo, acusando o governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, de vazar documentos sigilosos para a emissora. Ele também disse que o porteiro foi coagido a mentir. Witzel negou envolvimento.
31 de outubro: Durante uma entrevista, o deputado federal Eduardo Bolsonaro afirmou que se a esquerda radicalizar, uma das respostas do governo poderia ser via um novo AI-5, relembrando o Ato Institucional 5 baixado durante a Ditadura Militar e considerado um dos atos de maior repressão durante o período, por resultar na cassação de mandatos políticos e suspensão de garantias constitucionais. A afirmação repercutiu mal no Brasil e no mundo, fazendo com que o Zero Três, como Eduardo é chamado pelo presidente Jair Bolsonaro, voltasse atrás ao dizer que talvez tenha sido infeliz com a afirmação.
8 de novembro: Um dia depois de o Supremo Tribunal Federal (STF) decidir, por 6 votos a 5, derrubar a possibilidade de prisão de condenados em segunda instância, o ex-presidente Lula deixou sua cela após um ano e sete meses encarcerado. Ao sair da Superintendência da Polícia Federal em Curitiba, onde ficou preso, o petista foi recebido por militantes que ficaram em vigília durante 580 dias. Em seu discurso, Lula agradeceu aos apoiadores e criticou procuradores da Lava Jato e o ex-juiz Sergio Moro.
19 de novembro: O deputado federal Coronel Tadeu (PSL-SP) arrancou da parede, rasgou e pisou em uma imagem que estava exposta na Câmara em uma mostra sobre o racismo no Brasil, em comemoração ao Dia da Consciência Negra. A imagem era uma charge do cartunista Carlos Latuff, em que um policial, com uma arma fumegante na mão, aparece ao lado de um rapaz negro caído no chão, com algemas e uma camisa do Brasil. O parlamentar alegou que a imagem mostrava policiais como assassinos.
4 de dezembro: Os deputados Arthur do Val, o Mamãe Falei (DEM), e Enio Tatto (PT) protagonizaram uma das cenas mais grotescas da temporada de 2019 na política. Durante a votação da reforma da previdência na Assembleia Legislativa de São Paulo, Arthur do Val chamou os servidores contrários a reforma que estavam na galeria de vagabundos, provocando a ira de Tatto, que subiu na Tribuna para tirar satisfações. Houve ameaça de socos e empurra-empurra. A sessão precisou ser suspensa.
11 de dezembro: O principal projeto do ministro da Justiça, Sergio Moro, foi aprovado no Congresso já no final do ano. A proposta de Moro, contudo, foi desidratada no Legislativo. Entre os principais pontos defendidos por ele que foram retirados do texto aprovado está o excludente de ilicitude para casos em que uma pessoa matou alguém em razão de escusável medo, surpresa ou violenta emoção. Outro ponto polêmico do pacote aprovado foi a emenda do deputado federal Marcelo Freixo (PSOL) que cria a figura do juiz de garantias, que é responsável por acompanhar o processo e autorizar as etapas, mas não dá a sentença. A emenda, a contragosto de Moro, foi sancionada pelo presidente Bolsonaro e gerou críticas de grupos lavatistas.
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