Em tempos de descrédito com a classe política brasileira, a destinação de verbas públicas para partidos e campanhas eleitorais é um tema espinhoso de ser tratado. Na Câmara dos Deputados, tramita uma proposta que prevê o aumento do fundo eleitoral, criado para substituir o financiamento de empresas para campanhas. O pedido dos líderes de 13 partidos, endossado pelo relator do Orçamento de 2020, é de elevar o gasto de R$ 2 bilhões para R$ 3,8 bilhões para custear as eleições municipais do próximo ano. A maioria da bancada do Espírito Santo, diga-se de passagem, é contra a proposta.
Outra origem de financiamento público da política vem do fundo partidário, criado para sustentar a atividade dos partidos, como pagar contas e materiais de divulgação de suas propostas. O dinheiro deste fundo, que é pago mensalmente às legendas, também pode ser usado em campanhas eleitorais. Em 2019, por exemplo, o montante destinado para as legendas foi de R$ 947 milhões.
Para explicar como funciona cada um destes fundos, para que servem e se o pedido de aumento é válido ou não, A Gazeta ouviu três especialistas, dois advogados eleitorais e um cientista político.
O fundo partidário é utilizado para custear as atividades das siglas: pagamento de funcionários, divulgação, aluguel, conta de luz, água, entre outros. Também pode ser usado pelas legendas para ajudar nos custos de campanha. Entre os recursos utilizados para formar o fundo estão as multas pagas à Justiça Eleitoral, como a taxa para regularizar o título de eleitor após faltar a uma votação, por exemplo; as doações particulares; e os recursos da União. O montante é dividido da seguinte forma: 5% são distribuídos igualmente, enquanto 95% são pagos proporcionalmente de acordo com os votos obtidos pelos partidos durante a última eleição para a Câmara dos Deputados. O Tesouro Nacional deposita o dinheiro para o fundo mensalmente em uma conta do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que faz a divisão e repassa para os partidos.
Já o fundo eleitoral, criado em 2017, é pago a cada eleição e foi criado para suprir os custos eleitorais após o fim da permissão para doações de empresas nas campanhas. A origem do recurso é toda vinda do Tesouro Nacional e é dedicado exclusivamente para os partidos divulgarem suas propostas durante o período eleitoral. Do recurso disponível, 48% são divididos proporcionalmente ao número de deputados eleitos por cada partido; 35% para os partidos que elegeram ao menos um deputado; 15% proporcionalmente ao número de senadores eleitos por partido; e 2% divididos igualmente entre as siglas.
O custo para uma eleição mais democrática não é barato, principalmente no Brasil, onde há um grande número de municípios (5.570) e também de partidos (34). De acordo com o advogado especialista em Direito Eleitoral Ludgero Liberato, o investimento é necessário, mas a discussão do quanto é destinado e como é distribuído também deve ser levada em consideração.
Uma eleição demanda muitos recursos, os candidatos precisam ter condições iguais para levar suas propostas aos eleitores. A eleição municipal é ainda mais custosa, já que são mais de 5 mil cidades, ou seja, se cada município tiver quatro candidatos a prefeito, já são 20 mil candidaturas que precisam de dinheiro para apresentar minimamente suas ideias. O modelo atual está em teste. Nossa democracia é jovem, já testamos financiamento de campanha por empresas, sem empresas e com recursos públicos e sem recursos públicos. O ano de 2020 terá a primeira eleição municipal neste modelo por financiamento público. Será uma experiência a ser analisada, afirma.
O cientista político Fernando Pignaton se diz a favor do financiamento público de campanha. No entanto, ele defende que a discussão sobre a redução das despesas com as eleições deve começar não pelos cortes de gastos, mas na redução do número de partidos.
Imagina dirigir um carro, onde você pilota por um volante, em que você pode ir muito para a direita, muito para esquerda, levemente para uma das direções ou se manter no centro. Esse é o modelo político das democracias europeias e da americana. São poucos partidos. Já no Brasil, o eleitor, para mudar a direção do país, é como se dirigisse um avião, com 34 partidos, ou melhor, 34 botões, em que você precisa estudar muito o sistema para conseguir se movimentar. O que quero dizer é que quanto mais partidos, mais se pulveriza os gastos e mais se desperdiça dinheiro. Em vez de votar em bandeiras: o conservadorismo, o liberalismo, estatismo ou o comunismo, por exemplo, estamos votando em indivíduos. Isso incentiva uma lógica de empreendedorismo político, onde a política gira em torno de candidatos, um sistema de pirâmide, onde vence quem tem mais aliados. Desse jeito, as mudanças, seja para a direita ou esquerda, ficam mais difíceis de acontecer, explica.
Quem também defende o financiamento público é o advogado eleitoral Danilo Carneiro. Para ele, as campanhas eleitorais, por conta dos interesses dos grupos políticos, vão acontecer com ou sem o financiamento público de campanha. Cabe ao Estado garantir que os candidatos tenham condições iguais de apresentar suas propostas.
As pessoas estão impacientes com os representantes políticos, mas é preciso se ter em mente que as campanhas vão acontecer de um jeito ou de outro. Se não for feita com recursos lícitos, vão ser utilizados recursos ilícitos, com campanhas sendo feitas pela milícia, pelo jogo do bicho e por aí vai. Não se pode demonizar a presença do dinheiro na política. A democracia é, sim, um artigo de luxo que a gente precisa sustentar. Mas, é claro, é preciso estar de olho nas candidaturas 'laranjas', na transparência do uso dos recursos, na forma como eles são distribuídos entre os candidatos dentro do partido. Este é um tema que deve ser estudado com racionalidade, sem a inflamação da polarização que vivemos, analisa.
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