> >
Sem coligação, eleição pode ter mais candidatos e eleger com menos votos

Sem coligação, eleição pode ter mais candidatos e eleger com menos votos

Uma das mudanças para a eleição deste ano é o fim das coligações na eleição proporcional, que elege vereadores. Para conseguir eleger parlamentares, partidos apostam em aumentar o número de candidatos, tanto a prefeito quanto a vereador

Publicado em 26 de janeiro de 2020 às 17:18

Ícone - Tempo de Leitura 0min de leitura
Urna eletrônica durante teste nas eleições de 2016. (Agência Brasil)

Os eleitores do Espírito Santo devem ver crescer o número de candidatos nas eleições de 2020 em comparação com os pleitos de anos anteriores. Especialistas e líderes partidários veem o lançamento de mais candidaturas tanto para vereador quanto para prefeito como consequência do fim das coligações na eleição proporcional — para escolha de deputados e vereadores —, que entra em vigor neste ano. Na disputa de outubro, os partidos não poderão concorrer em blocos para as Câmaras municipais. 

Tradicionalmente, a chapa majoritária conquista votos para as candidaturas proporcionais. Isso porque o eleitor escolhe o vereador votando na legenda do candidato a prefeito ou em alguém alinhado a ele. Por outro lado, as siglas com candidatos a prefeito conseguem atrair mais interessados em disputar a eleição para vereador. 

Aspas de citação

Há uma máxima de que candidato a prefeito puxa candidato a vereador. Ou seja, ao aparecer mais, o candidato a prefeito traz maior visibilidade para o partido apresentar seus candidatos a vereador. Teremos um aumento gigantesco de candidaturas

Humberto Dantas
Cientista político e professor da Fesp-SP
Aspas de citação

Ele estima que sejam lançados algo em torno de um milhão de candidatos em todo o país, mais do que o dobro de registrados nas últimas eleições municipais, em 2016, quando 496.892 colocaram seus nomes nas urnas.

Com um número maior de possibilidades nas urnas, como preveem os analistas, mais pulverizados ficam os votos, fazendo com que os eleitos representem, proporcionalmente, menos eleitores, explica Dantas.  

Eleitor é abordado durante campanha eleitoral. (Bruno Miranda/Arquivo)

“Teremos também votos mais pulverizados entre candidatos, sendo que os eleitos não terão um grande percentual de votos. A tendência é que menos partidos atinjam o quociente eleitoral, o mínimo para se eleger. Vai ser uma disputa pelas sobras (veja o quadro abaixo). É um teste para o sistema, que não foi pensado para escolher individualmente, entre os mais votados. É um sistema pensado para representar os grupos mais escolhidos.”

No partido do governador, Renato Casagrande (PSB), a ordem é definir os nomes que vão disputar prefeituras o quanto antes. Para o presidente da sigla, Álvaro Gavini, esse movimento pode atrair mais filiados interessados a disputar o cargo de vereador.

“Essa é uma estratégia que os partidos estão tendo: quanto mais candidatos a prefeito e até a vice-prefeitos, maior a entrada de interessados a disputar o cargo de vereador. Agora, isso não será feito de maneira descuidada. Queremos trazer muitos candidatos, mas queremos trazer pessoas com qualidade, que vão pensar em melhorias para a população”, afirma.

A previsão de que mais candidatos concorrerão em outubro não é unanimidade. Presidente do partido com maior número de filiados no Espírito Santo, o MDB, Lelo Coimbra acredita que a quantidade de postulantes aos cargos tende a ser menor. Para ele, quanto mais candidatos, maior a disputa pelos recursos do fundo eleitoral.

 “Para além da questão dos recursos, que vão ser mais disputados, poucos partidos vão conseguir montar uma chapa inteira. Muitas siglas menores têm dificuldade para alcançar o mínimo de 30% de candidaturas femininas, por problemas de organização. Com isso, poucos vão conseguir fechar uma lista robusta para se lançar. Deve ficar entre quatro e cinco chapas no interior e, talvez, umas dez chapas de candidatos a vereador nas grandes cidades”, calcula. 

Como funciona a eleição proporcional?

• Na eleição proporcional, são somados os votos válidos e divididos pelo número de cadeiras na Câmara municipal. O resultado será o quociente eleitoral, o número mínimo para um partido ter uma vaga no Legislativo.

• Em Vitória, por exemplo, este mínimo foi de 12.373 votos em 2016. As coligações, então permitidas, ganharam uma vaga a cada vez que superaram esta cota. Neste ano, como a disputa será entre os partidos, sem coligações, a tendência é que o quociente eleitoral seja menor.

• Como dificilmente todos os candidatos atingem o quociente eleitoral, algumas vagas não são preenchidas e precisam ser distribuídas. Para calcular as sobras, os votos do partido são divididos pelo número de vagas conquistadas com o quociente eleitoral mais um. O resultado é um “ranking” com a média de todos os partidos, e as vagas serão distribuídas uma para cada sigla melhor posicionada até acabar com as sobras.

Dia de eleição: "santinhos" de candidatos enchem as ruas próximas de locais de votação. (Guilherme Ferrari/Arquivo)

FIM DA "ENGENHARIA DA COLIGAÇÃO"

Outro efeito da vedação das coligações nas eleições proporcionais é o fim dos “engenheiros das coligações”, como afirma o cientista político João Gualberto Vasconcellos. Segundo ele, com a permissão dos blocos no pleito para vereador, partidos menores se juntavam num grupo com várias siglas pequenas para montar chapas mais competitivas. 

Assim, com uma grande quantidade de candidatos com poucos votos, eles conseguiam disputar com candidatos com mais votos em siglas com menos pessoas disputando. Do mesmo modo, siglas fortes, com muitos candidatos competitivos, repeliam a adesão de outros partidos.

“Na Grande Vitória, há muitos políticos experientes que se elegiam pela habilidade na montagem de chapas. Em vez de montar uma coligação com candidatos competitivos, montava chapas com vários partidos menores, que só serviam para fazer legenda para os candidatos maiores. O problema era que nem sempre esse agrupamento respeitava barreiras ideológicas entre um partido e outro. Com o fim das coligações, o eleitor vai saber, pelo menos, que o voto dele está indo para o partido e não para uma sigla de espectro ideológico totalmente diferente do candidato que ele escolheu”, afirma João Gualberto. 

Votação em urna eletrônica durante teste nas eleições de 2016. (Agência Brasil)

ARTICULAÇÃO MAIS IDEOLÓGICA E MENOS NEGOCIAÇÕES

Para o presidente do PSB no Espírito Santo, Álvaro Gavini, o fim das coligações também acaba com as excessivas reuniões entre lideranças partidárias. “Era uma dificuldade grande juntar partidos na eleição proporcional, porque era uma dinâmica muito complexa. Se calculava quantas vagas íamos ter e quantas vagas iam sobrar para tal partido. Era uma equação difícil e que gerava muita discussão interna. Sem coligar, fica mais fácil para os partidos melhores estruturados. Para nós, é positivo”, explica.

Lelo Coimbra, líder do MDB estadual, afirma que as legendas menores, ao aceitar fazer parte de coligações que tinham menos chances de eleger deputados ou vereadores, faziam isso em nome de vantagens posteriores. “Antes, os partidos menores sabiam, ao compor com um partido maior, que receberiam votos que não iam necessariamente elegê-los. Já tivemos casos de perder aliados que foram compor em outras chapas, mesmo sabendo que teria menos chances, em troca de promessas de cargos em governos”, diz.

Câmara dos Deputados: nos corredores do Congresso já se discute voltar com as coligações nas próximas eleições. (Cleia Viana/Câmara dos Deputados)

FIM DAS COLIGAÇÕES PODE TER RECUOS

Antes mesmo de ser testada nas urnas, o fim das coligações pode não ser definitivo. Parlamentares apontam que já há discussões no Congresso para voltar atrás na mudança aprovada em 2017 na minirreforma eleitoral. 

“Tem uma movimentação de algumas lideranças no sentido de colocar o fim das coligações em discussão novamente, porque [os blocos] ajudam deputados que estão eleitos a continuarem se elegendo. Espero que não retornem as coligações em 2022. O fim das coligações é o primeiro passo para uma reforma política e para a redução do número de partidos”, opina o deputado federal e presidente do PDT no Espírito Santo, Sérgio Vidigal.

Este vídeo pode te interessar

Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem

Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta

A Gazeta integra o

The Trust Project
Saiba mais