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Só 15% das ruas de Vitória têm nomes de mulheres; veja quais

Só 15% das ruas de Vitória têm nomes de mulheres; veja quais

Nomes femininos estão em 468 placas de ruas e avenidas da Capital contra 2.020 masculinos. Levantamento mostra que batizar vias homenageando mulheres é fenômeno relativamente recente

Publicado em 7 de junho de 2019 às 18:26

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A discrepância entre os espaços preenchidos por homens e mulheres na sociedade também é retratada nos nomes que batizam ruas, avenidas e praças da cidade. Um levantamento feito pelo G.Dados, o núcleo de Jornalismo de Dados da Rede Gazeta, revela que apenas cerca de 15% dos 3.019 logradouros de Vitória têm nomes relacionados ao gênero feminino, enquanto o gênero masculino é representado em 66%.

Nomes femininos estão em 468 placas. Os masculinos em 2.020. As outras 531 não são nomes de pessoas (Avenida Maruípe, Praça dos Namorados, Rua Treze de Junho...) ou, com base apenas nas informações disponíveis, não foi possível classificá-las, com precisão, como homem ou mulher (Rua Jacy Gomes, Rua Lair Soares Nogueira...). 

(No celular, use os dedos em "pinça" para aproximar o mapa. Pressione sobre os logradouros para ter mais informações sobre o local. Os locais azuis são os batizados com nomes de homens. Os vermelhos, com nomes de mulher. Os escurosaqueles sem gênero. E os verdes  não tiveram nomes identificados)

As homenagens aos homens notórios do Espírito Santo e do Brasil estão estampadas por todo lugar em Vitória. São políticos, militares, magistrados, empresários. E a eles foram destinados os locais de mais destaques: nomes masculinos batizam 82% das avenidas, enquanto apenas 6,3% (6 das 94 existentes) levam nomes femininos - considerando as com nomes de santas, como a Nossa Senhora da Penha.

Em 1.541 ruas, mulheres nomeiam 13% delas. Homens, 72,6%. A proporção delas em logradouros aumenta nos espaços menos nobres. Dos 399 becos de Vitória, 15,7% foram batizados com nomes de mulheres. Das 494 escadarias oficiais, as mulheres dão nome a 23% delas. 

Bairro que leva o nome da heroína responsável por expulsar holandeses de invasão a Vitória no século XVII, Maria Ortiz é aquele com a maior quantidade de logradouros com nomes de mulheres: 32 dos 90, o que representa 35% do total. Proporcionalmente, apenas Santos Dumont tem mais mulheres representadas nas placas de logradouros: 36%, ou em 9 das 25.

O levantamento mostra também que batizar ruas com nome de mulheres é um fenômeno relativamente recente. Cerca de 80% das ruas com nomes femininos foram batizadas a partir da década de 1980, ou seja, nos últimos 40 anos, em uma cidade que completa em setembro 468 anos.

Os nomes dos locais públicos de uma cidade são definidos por leis municipais, elaboradas por vereadores. Em Vitória, dos 15 parlamentares, apenas uma é mulher, Neuzinha Oliveira (PSDB). "Até podemos mexer nos nomes que já têm. Mas não há porque mudar uma coisa que não tem interesse social local", frisou.

RESTRITAS AO DOMÉSTICO

A explicação para a carência de mulheres homenageadas em ruas e avenidas passa pelo espaço social historicamente destinado a elas. "Existe uma dualidade entre espaço doméstico e espaço público. E o objetivo do patriarcado é que as mulheres fiquem a maior parte do tempo renegadas ao espaço doméstico", afirma a pesquisadora Gabriela Santos Alves, professora do Departamento de Comunicação da Ufes.

Em outras palavras, é o mesmo que dizer que as mulheres vinham sendo silenciadas na história, pontua a socióloga e professora da UVV Maria Angela Rosa Soares.

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las não silenciaram. Foram silenciadas. Os grandes feitos das mulheres ao longo da história não tiveram o mesmo significado que os dos homens. A história dos homens é feita pelos homens. Somos valorizadas como mães, esposas e donas de casa. O mundo público é masculino e o doméstico é feminin

Maria Angela Rosa Soares, socióloga e professora da UVV
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Gabriela destaca que não são apenas os nomes de ruas e avenidas que ilustram invisibilidade feminina, mas também outros equipamentos da cidade, como bustos e estátuas.

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o Centro de Vitória, os bustos são todos homenagens a homens, e homens brancos, porque os negros e índios raramente aparecem. Então onde está a nossa representatividade? Isso demonstra que o espaço público é excludente para nós, mulhere

Gabriela Santos Alves, professora do Departamento de Comunicação da Ufes
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NOS BAIRROS

Para classificar os logradouros por bairros, consideramos 3.547 nomes, mais do que os 3.019. É que algumas ruas, travessas e avenidas percorrem mais de uma comunidade. A Rodovia Serafim Derenzi, por exemplo, passa por 19 bairros, segundo as informações oficiais da prefeitura. Portanto, a contabilizamos, como via com nome de homem, em cada um dos 19.

Serafim Derenzi foi um construtor italiano que veio para o Brasil na década de 1930 e que foi responsável pelo aterro do Parque Moscoso e do bairro Jucutuquara, além de construir linhas férreas no Estado.

As relações de poder expressas nos nomes das ruas são as mesmas observadas no mercado de trabalho e em outros campos da vida.

"Nascer, viver e morrer, para mulheres, têm um papel secundarizado. Para ter visibilidade, representatividade, estamos lutando até hoje, em todos os campos. No campo do trabalho, estamos em desvantagem salarial, em cargos de menor prestígio. Nas bancas de mestrado e doutorado também", salientou a professora da UVV.

COMO FIZEMOS?

A partir da relação oficial de logradouros de Vitória, passamos a classificar cada nome. Alguns são óbvios, como Fernando Ferrari, Araceli Cabrera Crespo e Dante Michelini. Também consideramos como masculino e feminino alguns nomes religiosos, como Nossa Senhora dos Navegantes, São João e São Jerônimo.

Por se tratar de uma clara referência às mulheres que produzem um dos ícones da cultura do Estado, também consideramos a Rua das Paneleiras como um logradouro com "nome de mulher", embora não seja referência a uma única mulher.

Para análise de outros nomes, menos populares, consultamos os projetos de lei que propuseram os batismos dos espaços públicos. A Câmara de Vitória, no entanto, não disponibiliza, em seu site, todos os arquivos mais antigos. Evitamos classificar como de homem ou de mulher os nomes para os quais não foi possível atribuir uma classificação precisa.

O mapa de cores foi criado a partir de um arquivo de mapa disponibilizado pela Prefeitura de Vitória que geolocaliza cada logradouro. Em seguida, com os nomes já classificados, aplicamos as cores ao mapa.

Conseguiu identificar a pessoa que dá nome a algum logradouro não identificado ou algum erro no mapa de cores? Entre em contato com os autores da reportagem pelos e-mails [email protected] e [email protected].

O QUE É O G.DADOS?

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