Por cinco votos a dois, os membros do Tribunal Regional Eleitoral do Espírito Santo (TRE-ES) acataram recurso do prefeito de Itaguaçu, Uesley Corteletti (Republicanos), e da vice-prefeita do município, Ana Brígida Fraga Sad (Republicanos), e decidiram reformar a sentença da Justiça Eleitoral de Itaguaçu que determinou a cassação da chapa dos dois por gastos ilícitos de recursos eleitorais na campanha de 2020. A Corte Eleitoral entendeu que faltam provas que confirmem as irregularidades apontadas na denúncia da coligação adversária.
A votação foi concluída na sessão desta segunda-feira (15) do Tribunal, quando votaram a juíza Isabella Naumann e o desembargador José Paulo Calmon, presidente do TRE-ES, acompanhando voto divergente feito pelo juiz eleitoral Renan Sales na sessão do dia 15 de março deste ano. Além deles, já haviam votado para reverter a cassação do prefeito e da vice-prefeita de Itaguaçu os juízes do TRE-ES Rogério Moreira Alves e Eduardo Xible Salles Ramos, em sessões ocorridas no mês de abril .
"O conjunto probatório não permite concluir pela existência de conduta que teriam o condão de ofender a lisura da campanha e a igualdade de chances entre os candidatos", concluiu a juíza Isabella Naumann em seu voto.
O julgamento do recurso teve início em fevereiro, quando a relatora do caso, Heloísa Cariello, votou para manter a sentença de abril de 2022 que cassou a chapa de Corteletti e Ana Sad e ainda declarou o prefeito inelegível por oito anos, a contar do pleito de 2020, por gastos eleitorais ilícitos. Para a relatora, "as condutas apuradas estão em desacordo com as normas de arrecadação de recursos e os gastos eleitorais comprometeram a isonomia e a higidez do pleito eleitoral". O voto dela foi seguido pelo desembargador Telêmaco Antunes de Abreu Filho, após pedido de vista.
Depois disso, Renan Sales pediu vista e apresentou o voto divergente que conduziu a votação final favorável ao recurso do prefeito e da vice-prefeita de Itaguaçu.
Na ação proposta pela coligação "União para o progresso de Itaguaçu" contra a chapa liderada por Corteletti, foram apontadas contratação de grupo paramilitar com o fim de coagir os candidatos de oposição e irregularidades nas propagandas realizadas ao longo da campanha eleitoral de 2020 (contratação ilegal de minitrio e veículos de som), violando o artigo 30-A da Lei das Eleições em razão de irregularidade na arrecadação e gastos ilícitos de recursos.
Em abril de 2022, o juiz eleitoral de Itaguaçu, Marcelo Soares Gomes, deu sentença julgando improcedentes as alegações de irregularidades nas propostas, mas entendeu que a contratação de pessoas com a finalidade de coibir a compra de votos por parte da chapa de Corteletti tornou a corrida eleitoral desigual. O magistrado citou a ocorrência de evento intimidatório praticado em favor do atual prefeito e em desfavor da candidatura adversária, concluindo pela existência de "caixa 2" na campanha eleitoral. Com isso, ele declarou nulos os votos recebidos pela chapa de Corteletti e Ana Sad.
Em seu voto, Renan Sales destacou que a ação se difere daquelas que apontam ilícitos como abuso de poder econômico, coação, fraude e corrupção, que dependem de ações específicas. Nesse caso, como foi apontada a captação ou gastos ilícitos de recursos, é preciso que haja gravidade que comprometa a prestação de contas e tenha dimensão para tornar desigual a correlação de forças entre os concorrentes na disputa eleitoral.
O juiz do TRE-ES frisou que o ponto principal gira em torno da origem e destinação da quantia de R$ 8.800,25 em dinheiro vivo, apreendida com Valdecir Chieppe Filho, que teria sido contratado para atuar na segurança do então candidato a prefeito pelo Republicanos, e se esse valor dizia respeito a gasto eleitoral e se tal gasto teria prejudicado a igualdade entre os candidatos.
Segundo Sales, a coligação autora acusa o atual prefeito de contratação de organização paramilitar, na tentativa de enquadrar a quantia apreendida em posse de Valdecir como gasto ilícito de campanha. A coligação alega que Valdecir e outras três pessoas teriam agido como grupo paramilitar sob as ordens de Corteletti com o objetivo de ameaçar eleitores e integrantes do grupo político adversário nas eleições 2020 para prefeito de Itaguaçu, e argumenta que a apreensão do dinheiro com Valdecir seria "pagamento pelos serviços ilícitos prestados à campanha" do então candidato do Republicanos.
Diante dos depoimentos prestados ao longo do processo na Justiça Eleitoral e de boletins de ocorrência registrados na Polícia Militar durante a campanha eleitoral, o juiz do TRE-ES Renan Sales entendeu que houve contradição nas informações prestadas sobre o suposto evento intimidatório que serviu de base para a sentença, pois em um momento afirmam que Valdecir e outra pessoa que o acompanhava "estavam portando arma de fogo" e depois dizem que permaneciam no recinto segurando a cintura “dando a impressão de que estavam armados”. O grupo também usou como comprovação captura de tela de grupos de conversa de Whatsapp.
Para Renan Sales, os argumentos utilizados na fundamentação da sentença estão equivocados. "Em nenhum momento dos autos falou-se em restrição ao exercício do sufrágio de eleitores, porquanto a ação intimidatória, ainda que tenha efetivamente ocorrido, indiscutivelmente direcionou-se exclusivamente a membros da coligação adversária, no desiderato de coibi-los a se absterem de comprar votos", ressaltou.
Ele acrescentou que a polícia não encontrou arma de fogo em poder da pessoa que teria feito as ameaças, Valdecir, com quem foram encontradas duas armas de air soft. O juiz do TRE-ES adicionou que não é possível verificar da prova dos autos "nenhuma ameaça que tenha sido feita a qualquer eleitor" e "em nada sugere a existência de grupo paramilitar".
Para o juiz Renan Sales, o que parece é que "houve um acirramento exacerbado dos ânimos, muito além da normalidade e do aceitável para uma disputa eleitoral, havendo, sim, a possibilidade de terem sido cometidos crimes de ameaça, constrangimento ilegal ou de exercício arbitrário das próprias razões, por exemplo, o que poderá ser analisado na seara penal".
"Contudo, o fato de ter sido supostamente praticado crime pelo representado ou pelas pessoas por ele contratadas não significa, necessariamente, que essa conduta maculou o resultado da eleição, até porque, repise-se, a teor das provas produzidas, a única exigência que os agentes fizeram às vítimas foi para que elas não praticassem ato ilícito, consistente na compra de votos", completou.
Por se tratar de uma representação eleitoral em que se deve analisar se os atos praticados foram capazes de alterar o resultado das eleições, Sales entendeu que não houve ilícito eleitoral previsto no artigo 30-A da Lei das Eleições. Com isso e diante do depoimento de Valdecir de que o dinheiro apreendido seria utilizado para pagamento de fornecedores de comércio que mantém, ele concluiu que não existe prova de que a quantia apreendida com Valdeir tenha pertencido ao candidato a prefeito em algum momento.
O voto de Renan Vanderlei foi seguido por outros quatro membros do TRE-ES, concluindo a votação em favor do recurso do prefeito de Itaguaçu e da sua vice e reformando a sentença de primeiro grau. A coligação autora da ação ainda pode recorrer da decisão.
O advogado do prefeito, Rodrigo Fardin, comemorou a decisão. "O sentimento da defesa é de dever cumprido. A cassação de um mandato obtido nas urnas é uma medida extrema que somente é possível quando comprovada através de prova robusta. No caso de Itaguaçu nós conseguimos demonstrar que as alegações dos autores não se sustentam e que não houve nenhuma irregularidade", afirmou Fardin.
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