A Câmara dos Deputados aprovou na madrugada desta quinta-feira (4), em primeiro turno, o texto-base da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos Precatórios. O placar foi apertado, de 312 votos a favor da proposta, 144 contrários e 57 deputados não votaram. Foram somente quatro votos a mais que o necessário para a aprovação.
Eram necessários 308 votos para que a PEC recebesse o aval da Casa. Os deputados que votaram "Sim" foram a favor da PEC, e os que votaram "Não" foram contrários à proposta.
Dos 10 deputados federais que representam o Espírito Santo no Congresso, seis votaram a favor da PEC. Três votaram contra e uma deputada se ausentou. Veja como votou cada deputado:
A PEC é a principal aposta do governo para viabilizar o programa social Auxílio Brasil — anunciado pelo governo para suceder o Bolsa Família. A proposta adia o pagamento de precatórios (dívidas do governo já reconhecidas pela Justiça), a fim de viabilizar a concessão de pelo menos R$ 400 mensais aos beneficiários do novo programa no ano eleitoral de 2022.
O plenário ainda precisa analisar os destaques, que são tentativas de mudança em pontos do texto. Segundo o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), deve haver uma reunião na manhã desta quinta para decidir sobre o tema, mas o mais provável é que a votação dos destaques e do segundo turno fique para terça (9).
A proposta também passará por votação em segundo turno na Câmara. Depois, o texto seguirá para o Senado, onde precisa do apoio de 49 dos 81 senadores em dois turnos.
Para aprovar a proposta que dribla o teto de gastos (regra que limita as despesas públicas), o governo teve de ceder à pressão de partidos políticos, modificar o texto, e chegou a ameaçar retaliar as emendas de deputados que votassem contra o plano do Palácio do Planalto.
Aliado do governo, Lira flexibilizou algumas regras e editou um ato para permitir que deputados que estão em viagem autorizada pela Câmara pudessem votar remotamente. Isso beneficiou o plano patrocinado por Bolsonaro.
A oposição se dividiu na votação. O PDT trocou de lado e passou a apoiar a PEC nesta quinta.
O presidente Jair Bolsonaro determinou, em outubro, o aumento do Auxílio Brasil para R$ 400, deflagrando uma crise entre as alas política e econômica do governo.
A solução para atender à demanda do presidente foi driblar o teto de gastos, propondo alteração no cálculo da regra fiscal na PEC dos Precatórios.
Essa PEC, que já estava na Câmara, prevê um limite para pagamento de precatórios (dívidas da União reconhecidas pela Justiça), o que libera mais espaço no Orçamento.
As duas mudanças previstas na PEC -envolvendo o teto de gastos e os precatórios- têm potencial de abrir uma folga superior a R$ 90 bilhões no próximo ano, garantindo recursos para o Auxílio Brasil e um auxílio para caminhoneiros e compensar o aumento de despesas vinculadas à alta da inflação.
O aumento de gastos na área social é uma aposta de Bolsonaro e aliados para tentar fortalecer o presidente na disputa à reeleição de 2022.
Um dos pontos de divergência tratava da garantia do pagamento de dívidas de repasses do Fundef (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério). Há cerca de R$ 15,6 bilhões em precatórios desse tema para Bahia, Pernambuco, Ceará e Amazonas.
Diante da resistência, inclusive em partidos de centro e da base do governo, Lira e o relator da proposta, deputado Hugo Motta (Republicanos-PB), costuraram um acordo contestado por parlamentares contrários à PEC.
Motta apresentou uma nova versão do projeto às vésperas da votação no plenário. A mudança prevê que os precatórios ligados à área da educação sejam parcelados em três anos.
Com isso, as dívidas da União vinculadas ao Fundef seriam pagas da seguinte forma: 40% no primeiro ano, 30% no segundo ano e outros 30% no ano seguinte.
O parcelamento foi visto por integrantes da bancada de educação como um avanço na negociação, pois antes não havia uma perspectiva de quando os recursos seriam pagos.
A quitação desses débitos, segundo o texto, fica dentro do teto de gastos. A equipe econômica apoiou a modificação na versão da PEC.
No entanto, a estratégia costurada por Lira foi chamada de manobra pela oposição e deputados contrários à proposta, como o partido Novo.
Críticos do acordo argumentaram que a mudança no texto da PEC só poderia ser feita se houvesse alguma emenda (sugestão apresentada por parlamentares) com o mesmo teor. "Não tem emenda a ser aglutinada", disse a deputada Adriana Ventura (Novo-SP).
Vice-líder da minoria, o deputado Henrique Fontana (PT-RS) afirmou que o ato do relator foi ilegal. "Não existe essa emenda anterior. Se a PEC for aprovada pelo Congresso, vamos recorrer ao Supremo [Tribunal Federal]".
Lira negou irregularidade na alteração feita de última hora na PEC. A mesma estratégia já foi usada em demais votações apertadas na Câmara.
O governo sofreu um revés na semana passada, quando teve que adiar por três dias a votação da proposta. Sem acordo e por falta de votos, o Palácio do Planalto precisou de mais tempo para negociar a aprovação da PEC.
"Irresponsabilidade fiscal é vocês ficarem preocupados com a reeleição do presidente Bolsonaro, e não com o bem estar do mais humilde brasileiro", disse o deputado Luiz Lima (PSL-RJ), ex-aliado de Bolsonaro.
Motta rejeitou as críticas. "Estamos fazendo um trabalho que procura ser justo com quem mais precisa, que precisa ser fiscalmente responsável, e ele está sendo, porque estamos tendo aqui a manutenção do teto de gastos", afirmou o relator.
Apesar de trabalhar com um "plano B" de prorrogar o auxílio emergencial, o plano principal do governo é concluir a aprovação da PEC. O gasto com precatórios passou de R$ 54 bilhões neste ano para R$ 89 bilhões no ano que vem.
O ministro Paulo Guedes (Economia) classificou o comportamento da despesa como um meteoro. O cálculo do limite para pagamento de sentenças judiciais dentro do teto usa como base o montante pago em sentenças judiciais em 2016 (ano de criação do teto) e o corrige pela inflação.
No caso da flexibilização do teto, a contabilidade do limite das despesas é retroativa a 2016. Isso autoriza uma ampliação do valor máximo a ser usado pelo governo.
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