Um acordo entre governo do Estado e Assembleia Legislativa permite, todos os anos, que deputados estaduais destinem recursos de emendas ao Orçamento às suas bases eleitorais. Para 2019, cada um dos 30 parlamentares pode destinar até R$ 1 milhão. Em geral, eles enviam o dinheiro para prefeituras comprarem equipamentos, como ambulâncias e tratores, ou para instituições filantrópicas pagarem seus custeios. Também mandam dinheiro público para escolas de samba, eventos religiosos e até para competições de cavalo.
Ao distribuir as emendas dos deputados em mapas, é possível constatar quais regiões o parlamentar mais quis agradar. Afinal, o recurso, quando finalmente liberado pelo governo, gera um impacto na comunidade e o remetente pode colher frutos políticos e eleitorais com a benesse.
A distribuição dos recursos pelo Estado fica conforme mostra o mapa a seguir. Apesar da capilaridade da influência dos deputados, as emendas ficam concentradas na Grande Vitória. Vitória, Vila Velha, Cariacica e Serra são o destino de R$ 10,4 milhões que os deputados pretendem encaminhar. O valor representa cerca de 35% da fatia orçamentária de R$ 30 milhões reservada aos deputados. A região, com cerca de 909 mil eleitores, concentra 33% do eleitorado do Espírito Santo.
Quanto mais escuro o município, maior o volume de emendas a serem destinadas para ele:
As 701 emendas apresentadas pelos deputados foram publicadas no Diário Oficial do Legislativo no dia 14 de janeiro. A reportagem considerou desconsiderou aquelas que tem o "Estado" como destino. Foram analisadas apenas aquelas que especificam os municípios. São 688 nessa condição. Somam R$ 29,8 milhões.
"Os deputados estão em contato direto com as comunidades. Sabem melhor do que ninguém as necessidades delas. E as emendas podem ajudar, depois do apontamento das lideranças, nas mais diversas áreas, como saúde, educação, assistência social. Recomendo o diálogo permanente entre parlamentares e sociedade", afirmou o presidente da Assembleia Legislativa, Erick Musso (PRB).
Apenas Dores do Rio Preto não receberá, diretamente, nenhum real em emendas parlamentares. Este levantamento considera apenas os municípios especificados nas emendas.
Os destinos foram escolhidos pelos deputados da legislatura que acaba nesta quinta-feira (31). Foram eles que analisaram e aprovaram o Orçamento para 2019. Os novatos, que tomarão posse na sexta (1º), negociam com o governo um valor para destinarem ainda neste ano. Em tese, eles só teriam acesso às emendas de 2020.
Apesar da livre indicação, cabe ao Executivo executar as emendas. A ação depende, também, de certidões regulares e contabilidade em dia das entidades. Em lista, as cidades que podem esperar dinheiro de emendas parlamentares são as seguintes:
O levantamento minucioso de cada uma das quase sete centenas de emendas possibilita algumas leituras. É curioso, por exemplo, que elas variam, individualmente, de R$ 1 mil a R$ 500 mil.
A menor é de Theodorico Ferraço (DEM). Ele indicou o valor para obras grandes em Cachoeiro de Itapemirim, Alegre, Piúma, Iúna e Nova Venécia. Esse dinheiro, claro, não pagaria nem o salário dos pedreiros. Theodorico faz isso apenas para "abrir rubrica", ou seja, para sinalizar ao Estado que essas obras são importantes e devem ser abraçadas.
A maior é de Bruno Lamas, para a revitalização da Avenida Abdo Saad, em Jacaraípe, Serra. Não custa lembrar que o recurso é liberado pelo governo, que depende de regularidade das instituições recebedoras. De acordo com o chefe da Casa Civil, Davi Diniz (PPS), 67% das emendas foram executadas em 2018.
Também chama a atenção como os deputados "picotam" o milhão a que têm direito para agradar mais entidades. Eis os números:
Cada um tem a própria estratégia. Uns preferem usar todo o milhão para menos finalidades. Assim, conseguem colocar mais dinheiro. Outros fazem exatamente o contrário. Pulverizam bastante as alocações. Dessa forma, impactam mais instituições, em mais cidades. Porém, vai menos dinheiro para cada uma.
Na primeira situação, enquadram-se Esmael Almeida (PSD) e Marcos Bruno (Rede). Ambos repartiram as emendas para apenas três das 78 cidades do Estado. No caso de Esmael, mais de 90% dos recursos são para entidades que funcionam em Vitória, onde ele e o filho dele, o vereador da Capital Davi Esmael (PSB), têm base eleitoral. Graficamente, as emendas dele podem ser apresentadas assim:
Já Sergio Majeski (PSB) é o deputado que mais pretende distribuir recursos. Ao todo, suas emendas, se executadas pelo Poder Executivo, irão para 31 cidades. Professor, ele é de Santa Maria de Jetibá, mas os alunos dele são da Grande Vitória. A visualização da divisão do R$ 1 milhão dele é a seguinte (ao final da matéria, mapas interativos):
Os critérios de definição das entidades e das cidades beneficiadas não são restritos à simpatia dos deputados para com elas. Outra leitura é possível e necessária. Os endereços das emendas correspondem aos locais onde os deputados pretendem buscar votos. Eles sabem onde têm mais ou menos inserção.
Jamir Malini (PP), por exemplo, conseguiu na Serra 69,33% dos votos que recebeu, em 2014. Nada menos que R$ 500 mil foram para a cidade. Em geral, há "match" na relação de cidade que lhe rendeu melhor desempenho e cidade para a qual mais destina recursos. Uma coisa ajuda a outra.
Emendas parlamentares existem também no Congresso e são realidade em vários Estados. Não se trata de uma jabuticaba capixaba. Mas isso é uma coisa boa? Por que deixar um deputado gerenciar parte do dinheiro público ainda que relativamente pequena da maneira como ele bem entende? Por que não deixar essa tarefa aos técnicos? Essas perguntas foram feitas a Vladimir Feijó, professor de Direito Constitucional do Ibmec.
As respostas passam, obrigatoriamente, por uma das missões constitucionais da Assembleia, que é a de fiscalizar o Poder Executivo. "O que acontece é que o Executivo depende de apoio do Legislativo para passar os projetos que considera importantes. Nas emendas, há interesses próprios dos deputados, e não interesse de Estado. Isso é perigoso, pode alimentar corrupção. Em vez de ser fiscal do Executivo, o parlamentar se torna parceiro", declarou.
Um argumento comum entre deputados é o de que eles são conhecedores de cada metro quadrado do Estado, e conhecem as necessidades mais básicas e imediatas de importantes entidades de interesse público. E, dizem, ajudam a prestação de serviços quando enviam dinheiro.
Feijó considera essa tese, no máximo, razoável. "Em vez de as secretarias do governo definirem todas as verbas, deixam parte para que parlamentares definam. O maior prejuízo é o deputado não estar falando em nome da sociedade como um todo. Pode ser que ele tenha contato próximo com alguma comunidade, mas isso pode também ser uma falácia. Pode haver um segmento atendido e outro, não", acrescentou.
PREFEITURAS
Quem recebe, comemora. Quem não recebe, reclama. Professor Ricardo (PDT), prefeito de Piúma, explica que, embora as emendas parlamentares não sejam enviadas para os cofres da administração, elas aliviam entidades, que costumam depender das prefeituras.
"Para uma época como essa, em que municípios estão arrecadando menos, essas emendas contribuem para fazermos investimentos. Os municípios têm dificuldades, e aí as entidades têm mais dificuldades. Para as entidades, é bom (ter emendas parlamentares). Seria bom que as emendas chegassem com mais agilidade às entidades. Os municípios são onde elas jogam a âncora", afirmou.
A maior parte das entidades beneficiadas e do dinheiro das emendas está em Vitória. São praticamente R$ 4,7 milhões previstos para 2019. "Qualquer ação que fortaleça entidades que tenham o interesse público à frente é bem-vinda. Temos a característica de trabalhar com gestão compartilhada, com vários parceiros. E os resultados são sempre positivos", disse Henrique Valentim, secretário da Fazenda da Capital.
Mas, afinal, para onde cada deputado pretende enviar suas emendas em 2019? Os mapas serão apresentados a seguir, por grupos de parlamentares. Quanto mais forte a cor do município no mapa do parlamentar, mais dinheiro de emendas ele destinou para aquela cidade.
É preciso alterar as camadas do mapa para navegar entre os políticos.
Neste, os destinos das emendas de Amaro Neto (PRB), Bruno Lamas (PSB), Dary Pagung (PRP), Eliana Dadalto (PTC), Esmael Almeida (PSD), Enivaldo dos Anjos (PSD), Cláudia Lemos (PRB) e Erick Musso (PRB):
Confira também a votação desses deputados, por município, referente à eleição de 2014. Foi ela que deu a eles os atuais mandatos. No pleito de 2018, metade dos 30 não foi reeleita:
A seguir, Euclério Sampaio (DC), Freitas (PSB), Gildevan Fernandes (PTB), Gilsinho Lopes (PR), Hércules Silveira (MDB), Hudson Leal (PRB), Jamir Malini (PP) e Janete de Sá (PMN):
Compare a distribuição com a votação desses deputados, por município:
Aqui estão os mapas de José Carlos Nunes (PT), José Esmeraldo (MDB), Da Vitória (PPS), Luiz Durão (PDT), Luzia Toledo (MDB), Marcelo Santos (PDT), Marcos Bruno (Rede) e Marcos Mansur (PSDB):
A seguir, veja como cada um desses foi votado nas cidades:
Finalmente, Padre Honório (PT), Rafael Favatto (Patriota), Raquel Lessa (PROS), Sandro Locutor (PROS), Sergio Majeski (PSB) e Theodorico Ferraço (DEM):
E, por fim, como esses foram votados em 2014:
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta