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Vereadores barram instalação de câmeras privadas em ruas de Vitória

Vereadores barram instalação de câmeras privadas em ruas de Vitória

Medida de iniciativa de parlamentar do PL foi declarada inconstitucional pelos membros da Comissão de Justiça, nesta quarta-feira (9)

Publicado em 9 de abril de 2025 às 14:05

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Os vereadores integrantes da Comissão de Justiça, da Câmara Municipal de Vitória, barraram, nesta quarta-feira (9), o Projeto de Lei 99/2025, que previa permitir a qualquer cidadão instalar câmeras privadas e captar imagens em locais públicos da Capital. Chamada de Lei Martini, a iniciativa faz referência ao comerciante obrigado a retirar mais de 200 equipamentos de videomonitoramento do Centro da cidade.

O relator da matéria, Maurício Leite (PRD), votou pela inconstitucionalidade e foi acompanhado pelos demais membros da Comissão de Justiça: Aylton Dadalto (Republicanos), Aloisio Varejão (PSB), Luiz Emanuel (Republicanos) e Karla Coser (PT).

“É uma matéria muito discutida, polêmica. Eu quero dizer bem claro nesta Casa que a matéria é de suma importância, mas carece de estudos maiores e, como membros da Comissão de Justiça, a gente vê ilegalidade no projeto de lei. Esse tipo de matéria vem com vícios de iniciativa”, afirmou Maurício Leite.

Na mesma linha, o presidente da comissão, Luiz Emanuel, destacou que a discussão se pautou não pelo mérito da iniciativa, mas pela constitucionalidade ou inconstitucionalidade da matéria. “Aqui nós vamos tratar tecnicamente e nós temos motivo, hoje, para concordar com o parecer do vereador Mauricio Leite.”

Vereadores barram instalação de câmeras privadas em ruas de Vitória

O autor do projeto, vereador Darcio Bracarense (PL), negou que a matéria tivesse vício de iniciativa, pois não estabelecia que a prefeitura deveria disciplinar o uso das câmeras. “Muito pelo contrário, respeitando a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), a matéria estabelece que o cidadão tem o direito de fazer a gravação de qualquer imagem em logradouro público”, manifestou.

Vereadores seguiram parecer do relator e votaram pela inconstitucionalidade da matéria
Vereadores seguiram parecer do relator e votaram pela inconstitucionalidade da matéria. (Reprodução YouTube)

Vereadores apontam violação à LGPD

A vereadora Karla Coser acompanhou o voto do relator e apontou, no plenário, que a matéria viola a LGPD e pode colocar em risco a segurança das crianças. “Esse PL é um perigo à proteção das nossas crianças e adolescentes. Pedófilos vão instalar câmeras na frente das escolas, nos espaços onde as crianças circulam e vão fazer o livre uso dessa imagem. A responsabilidade da segurança pública é do Estado, não de indivíduos.”

A parlamentar ainda destacou que as câmeras de videomonitoramento instaladas em casa continuam permitidas. O que está proibido é alguém instalar equipamentos do tipo em praças e logradouros públicos para tomar conta da vida das pessoas. “O seu patrimônio privado vai poder continuar sendo vigiado por você.”

Já Ana Paula Rocha (Psol) disse que a lei é perigosa, pois expõe mulheres, crianças e idosos. “A gente entende a necessidade de segurança, esse debate está posto na sociedade, mas não vai ser de forma atropelada, colocada de forma indiscriminada, sem dizer como vai ser o tratamento desses dados que a gente vai resolver a segurança pública”, declarou.

Especialistas veem problemas no projeto

Na avaliação do especialista em direito civil e empresarial Sandro Câmara, projeto de lei que permita a gravação indiscriminada em espaços públicos tende a violar a inviolabilidade da intimidade e da vida privada, garantida pela Constituição Federal.

“A captação generalizada de imagens sem causa específica poderia criar um ambiente de vigilância desproporcional a impactar, por exemplo, a própria liberdade de locomoção e até mesmo o direito ao anonimato, principalmente porque se dará em locais públicos”, avaliou.

Sandro Câmara destacou que a LGPD exige base legal específica para o tratamento de dados pessoais. Imagens de pessoas são consideradas dados pessoais e sua captação indiscriminada, como propõe o projeto de lei, violaria artigos da legislação. “Sem a regulamentação e a limitação adequadas, essa poderia ser uma forma de controle excessivo sobre a população, ferindo o direito do cidadão e da cidadã de circular livremente sem esse constante monitoramento.”

O especialista em privacidade e proteção de dados Carlos Augusto Pena da Motta Leal, por sua vez, destacou que a medida tem vício de iniciativa.

“O projeto legislativo interfere em atribuições típicas do Poder Executivo, ao tratar da organização e do uso de espaços públicos, da captura indiscriminada de imagens em logradouros públicos por particulares”, avalia.

Na avaliação de Carlos Augusto, permitir irrestritamente a instalação de câmeras por cidadãos particulares para captar imagens de transeuntes, sem qualquer controle, fiscalização ou critérios objetivos, cria um ambiente de risco à privacidade, especialmente de grupos mais vulneráveis, como mulheres e crianças, grupos com proteção especial de seus dados assegurados pela LGPD.

“Embora o combate à criminalidade seja uma pauta legítima, as soluções devem sempre observar os limites constitucionais e legais, especialmente no que diz respeito à proteção de direitos fundamentais, especialmente a proteção dos dados pessoais dos cidadãos”, declarou.

Comerciante já instalou mais de 200 câmeras pelo centro de Vitória
Comerciante Eugêncio Martini teve que retirar as mais de 200 câmeras pelo Centro de Vitória. (Carlos Alberto Silva)

Comerciante foi obrigado a retirar câmeras do Centro

A discussão polêmica foi levada à Câmara de Vitória após o comerciante Eugenio Martini ser obrigado a retirar mais de 200 câmeras instaladas por ele no Centro da Capital. A medida foi necessária após uma ação movida pelo então vereador de Vitória, André Moreira, do PSOL, junto ao Ministério Público Estadual (MPES) e também apresentada à concessionária de energia elétrica EDP, em fevereiro do ano passado.

Na avaliação do advogado e ex-vereador André Moreira, a iniciativa tem por objetivo proteger os direitos dos cidadãos.

“Só para você ter uma ideia, nem uma empresa de segurança privada, registrada na Polícia Federal pode sair fiscalizando o espaço público se não for contratada para proteger um cliente específico. Colocar câmeras pela cidade inteira, como ele fez, é usurpar uma atribuição que é exclusiva do poder público. Além disso, havia suspeita de que ele estivesse usando postes da EDP e até se apropriando da energia elétrica, o que pode configurar furto”, argumentou.

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