Durante a sessão desta quarta-feira (17), deputados estaduais acusaram o governo estadual de interferir no Legislativo por ter apresentado uma notícia-crime ao Ministério Público do Espírito Santo (MPES) contra os seis parlamentares que fizeram uma visita surpresa ao Hospital Estadual Dório Silva, na última sexta-feira (12). O órgão, segundo o colunista Vitor Vogas, instaurou um procedimento investigatório criminal para apurar possíveis irregularidades na visita feita pelos deputados.
Até mesmo membros da base do governador Renato Casagrande (PSB) argumentaram que o assunto diz respeito ao Legislativo e deve ser tratado pelo parlamento. O deputado Enivaldo dos Anjos (PSD) foi um dos que pediram à Procuradoria-Geral do Estado que retire o instrumento processual apresentado no MPES.
"Essa é uma questão que a própria base do governo e os deputados independentes podem tratar, em discussão, dentro da Assembleia. Nas últimas sessões, eu e o deputado Capitão Assumção (Patriota), inclusive, discutimos bastante sobre o que aconteceu. Não é assunto para o Executivo se meter em questões da Assembleia, por isso faço meu apelo para que o procurador retire essa ação contra os deputados", afirmou.
Na mesma linha, o deputado Emílio Mameri (PSDB) e Theodorico Ferraço (DEM) também pediram a retirada da representação, alegando que ela coloca em risco a independência dos Poderes. O deputado estadual Marcos Mansur (PSDB) chegou a comparou o caso com a tensão entre o Legislativo e Executivo em âmbito federal.
"Guardadas as devidas proporções, essa tensão constante entre Poderes e esse sentimento de estar com o cabo sempre esticado é muito perigoso para o Estado de Direito. Não podemos deixar que o que vemos em Brasília se repita aqui no Espírito Santo. Isso nos preocupa", afirmou Mansur.
Quando alguém faz uma representação por meio de uma "notícia-crime", serve para que haja a exposição e comunicação do fato criminoso à Polícia ou ao Ministério Público. Quando um crime ocorre, as autoridades competentes podem ser notificadas para dar início à investigação contra seu autor ou autores, caso não tenham iniciado o procedimento por conta própria.
Como neste caso o Ministério Público já deu início a um procedimento para apurar o suposto crime contra a saúde pública, apontado pela Procuradoria Geral do Estado (PGE), o governo não pode, teoricamente, desistir da acusação, inclusive por se tratar de um fato que recebeu ampla divulgação dos próprios deputados. O próprio procurador-geral do Estado, Rodrigo de Paula, afirma que depois de feita a representação não cabe mais desistência.
Ainda assim, o pedido exerce pressão em outros Poderes. Como a análise envolve deputados estaduais, todas as requisições dos procedimentos são de competência da Procuradora-Geral de Justiça, Luciana Andrade. Uma vez iniciado, o procedimento investigatório criminal deve ser concluído em 90 dias, com a possibilidade de ser prorrogado por igual período.
"A retirada de uma denúncia acontece quando o dano à vítima pode ser maior do que o próprio crime em si. Porém, neste caso, como diz respeito a um suposto crime que atinge o interesse público, não há como impedir a apuração pelo Ministério Público. Mesmo que o governo do Estado não tivesse representado, a situação já está expressa nos veículos de comunicação, já seria dever do órgão investigar", afirma o especialista em Direito Constitucional Caleb Pereira.
A visita surpresa feita por um grupo de deputados ao Dório Silva foi, de acordo com eles, a partir de denúncias recebidas sobre a qualidade precária dos equipamentos de segurança destinados aos profissionais de saúde que lá atuam. Participaram da visita os deputados Carlos Von (Avante), Danilo Bahiense (PSL), Lorenzo Pazolini (Republicanos), Vandinho Leite (PSDB), Capitão Assumção (Patriota) e Torino Marques (PSL).
As denúncias sobre a suposta precariedade no trabalho dos profissionais de saúde no hospital, contudo, não chegaram a ser levadas à Comissão de Saúde da Assembleia Legislativa, presidida pelo deputado Hércules Silveira (MDB). O emedebista criticou a forma como a visita foi feita e destacou que todas as denúncias recebidas pela comissão foram apuradas e, quando necessário, encaminhadas ao Ministério Público. Para ele, a ação sugere uma tentativa de fazer campanha em cima da pandemia.
"É ruim para a imagem da Assembleia um deputado querer se sobrepor em cima do outro. Não pode um deputado querer fazer campanha para prefeito de seu município querendo pisotear quem vem trabalhando na Comissão de Saúde", destacou.
Além do pedido para retirar a representação contra os parlamentares do Ministério Público, na sessão desta quarta (17) Enivaldo dos Anjos também cobrou o governo para que nomeie o líder de governo na Assembleia.
O cargo, que era ocupado pelo ex-deputado estadual Eustáquio Freitas (PSB), ficou vago após o retorno de Bruno Lamas (PSB) que estava na Secretaria de Trabalho, Assistência e Desenvolvimento Social (Setades) para a Casa. Atualmente, Freitas é assessor especial da Casa Civil. Desde então, a função tem sido desempenhada pelo vice-líder, Dary Pagung (PSB).
"É preciso que o governo envie o ofício indicando o líder definitivamente. Isso interfere, inclusive, na atuação do deputado Dary, que ainda está na condição de vice-líder", apontou Enivaldo. O deputado foi líder do governo no início da gestão de Renato Casagrande (PSB), mas foi retirado da função após a polêmica da eleição antecipada de Erick Musso (Republicanos) para a Mesa Diretora, no final de 2019.
A Secretaria da Casa Civil foi procurada para comentar sobre o pedido para a retirada da ação no Ministério Público e sobre a indicação do novo líder na Assembleia. Até a publicação da matéria, a secretaria não havia se manifestado.
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