A comissão especial da Câmara dos Deputados já disse não à adoção do chamado voto impresso, mas o plenário da Casa vai deliberar sobre o tema nesta terça-feira (10), por esforço do presidente da Câmara, Arthur Lira. A votação, no entanto, deve apenas sepultar de vez a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que acrescentaria a impressão de cada voto ao ato de apertar o botão "confirma" na urna eletrônica.
Bandeira do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), o "voto auditável", como ele chama a iniciativa, virou munição na tentativa de tirar a credibilidade do processo eleitoral, pelo qual, inclusive, o próprio Bolsonaro elegeu-se diversas vezes.
Coordenadora-geral da Transparência Eleitoral Brasil, pesquisadora em Direito Eleitoral e mestra em Direito Constitucional, Ana Cláudia Santano conta como começou essa história de voto impresso. Não é coisa de agora e tem consequências maiores do que os memes sobre a volta do passe escolar e do "cheque impresso auditável" no lugar do Pix que você vê nas redes sociais. Veja a íntegra da entrevista no vídeo acima.
Santano diz que o termo correto a ser utilizado é auditoria cruzada, uma vez que o voto eletrônico atualmente adotado no Brasil já é auditável.
Engana-se quem pensa, no entanto, que a impressão individual dos votos e a "contagem pública" – que, de acordo com a PEC, seria manual, feita em cada seção eleitoral pelos mesários – seria apenas mais um reforço na segurança do pleito.
Em conversa propiciada pela ONG Transparência Capixaba com a editora de A Gazeta Letícia Gonçalves (esta que vos escreve), o repórter Guilherme Mendes, do site Congresso em Foco, e o secretário-geral da ONG, Rodrigo Rossoni, Ana Cláudia Santano destacou alguns pontos, nesta segunda-feira (9), dentre eles:
- Tem gente que acha que vai pegar o papelzinho e levar para casa. Isso não confere, não tem nada a ver com a proposta.
- Não é um debate novo e não é exclusivamente brasileiro.
- Lembra quando nossa vida começou a ficar digital? A gente era cismado com extratos bancários, ou com o caixa eletrônico. Muita gente preferia ir ao caixa no interior da agência a usar o caixa eletrônico.
- No entanto, ainda que o debate seja legítimo, toma um contorno que não lhe é próprio.
- A proposta da deputada federal Bia Kicis (PSL-DF), endossada por Bolsonaro, prevê que cada vez que o eleitor votar na urna eletrônica o voto seja impresso e, automaticamente, vá para uma outra urna.
- Depois, os mesários de cada seção eleitoral contariam, manualmente e em público, os votos impressos para conferir se o resultado é igual ao da urna eletrônica. Em caso de divergência, prevaleceria o voto impresso.
- Ocorre que ao colocar a interferência humana na contagem aumenta-se o risco de fraudes ou mesmo de erros não intencionais, além dos problemas práticos envolvidos na operação, considerando que o Brasil tem quase 148 milhões de eleitores aptos a votar, de acordo com dados de 2020 do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
- Além disso, não haveria tempo e, em tese, dinheiro, dada a crise instalada no país, para implementar a medida para as eleições de 2022.
- É bem provável que a PEC não alcance os votos necessários e não haja voto impresso, auditável ou auditoria cruzada (escolha o nome que preferir) em 2022.
- O voto, hoje, é auditável. E já é impresso um boletim de urna, disponível aos fiscais dos partidos e aos eleitores em todas as seções eleitorais.
- Ainda assim, o questionamento à credibilidade do sistema eleitoral brasileiro foi posto, o que é um risco à democracia. Ano que vem é provável que haja ainda mais desinformação em circulação para justamente desestabilizar as eleições, com desfecho imprevisível.
- Na Índia, há urnas eletrônicas e também a impressão do voto, uma mudança recente. Ainda assim, isso não reduz os questionamentos quanto à legitimidade dos resultados da conturbada democracia do país asiático. Ana Cláudia Santano, que foi lá, ouviu que sempre houve e sempre há questionamentos. Com base em quê, ela questionou: "Com base na derrota", ouviu como resposta.
- No Peru, recentemente, também houve questionamentos da candidata derrotada à presidência, Keiko Fujimori. Ela alega que houve fraude. Lá, o voto é feito exclusivamente em papel.
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