O Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) decidiu que o proprietário de um imóvel terá de pagar aos inquilinos R$ 4 mil de indenização por danos morais por fazer publicações embaraçosas e ofensivas nas redes sociais e nos grupos de compra e venda, expondo-os por não pagarem o aluguel.
A mulher, então com 24 anos, entrou com uma ação contra o locador em maio de 2021. Ela alegou que, devido ao atraso no pagamento do aluguel, o locador marcou as contas dela e do marido em uma rede social com cobranças indevidas, que os expuseram e humilharam.
Conforme ela explicou, o marido era o único provedor de renda da família, porém ele sofreu um acidente de trabalho, em que perdeu dois dedos da mão esquerda.
Além de ter tido uma série de gastos imprevistos com medicamentos, ele ficou afastado do trabalho e passou a depender do benefício previdenciário, cujo valor era inferior ao salário que ganhava antes.
Por causa disso, o casal não conseguia quitar as obrigações do imóvel alugado. A mulher, que, inclusive, estava grávida na época, afirmou que a exposição que o locador fez dos locatários nas redes sociais foi uma forma vexatória e abusiva de pressioná-los a pagar as dívidas, além de ter atingido a imagem, a dignidade pessoal e a honra dos dois.
O especialista em Direito do Consumidor Kamylo Costa Loureiro defende que o locador tem direito de efetuar a cobrança de débitos do contrato de locação. O problema está em como isso será feito.
“Todavia, para o exercício regular do seu direito, existem meios legais para que essas cobranças sejam feitas, evitando, assim, excessos nessa cobrança. Nesse caso, o locador praticou um vexame, e essa conduta é considerada ilícita civil e criminalmente falando”, analisa.
Na visão dele, uma simples cobrança pode tornar-se um dano à moral dos inquilinos quando o locador usa meios ilícitos e constrangedores para que o devedor pague a dívida e quando esses atos são presenciados por outras pessoas. “Caso contrário, a reputação do devedor não estará em risco”, diferencia.
Além disso, Loureiro ressalta que, caso o proprietário tenha cometido somente a cobrança vexatória, sem emprego de violência ou ameaça, ele poderia responder a um processo criminal. “Se condenado, a pena de detenção pode ser de 15 dias a um mês, ou multa”, observa.
“Todavia, se ele praticou outros crimes durante a cobrança vexatória, com prática de violência e/ou ameaça, além da cobrança vexatória, também vai responder por isso”, complementando que a pessoa ainda pode responder por dano moral e material e ser condenada a ressarcir os prejuízos sofridos pelo locatário.
Para o advogado imobiliário e vice-presidente da Associação Empresas do Mercado Imobiliário do Espírito Santo (Ademi-ES), Gilmar Custódio, ao exercer o exercício de cobrança de um direito, o proprietário adotou um caminho equivocado.
“Em vez disso, ele deveria ter proposto a ação contra o locatário, com base no que estava firmado no contrato, pedindo o pagamento do valor do aluguel e dos demais encargos do condomínio, junto com os juros e outras penalidades contratuais e, se fosse preciso, até mesmo pedir o bloqueio de bens”, explica.
Isso porque, para ele, ninguém pode ser exposto ao ridículo, muito menos na Internet, ambiente onde as pessoas são julgadas a todo momento, mesmo sem provas.
“A violação do direito de outra pessoa precisa ser reparada. Afinal, quem nunca deveu algo que atire a primeira pedra. O correto seria a adoção de medidas legais, como a notificação e a ação junto à Justiça, sempre amparado por um profissional jurídico. Por conta de uma atitude mal pensada, além de não receber o valor a que o proprietário tem direito, ele ainda terá de indenizar os seus inquilinos”, analisa.
Os especialistas explicam que se deve procurar um advogado e ingressar com uma ação de indenização por danos morais contra o locador. Também é possível apresentar uma queixa-crime de exercício arbitrário contra ele.
Custódio deixa uma recomendação: “A locação de um imóvel precisa ser assessorada por um profissional. Se essa relação começa de forma equivocada, a chance de problemas futuros é alta. Por isso, o locador precisa se assegurar de uma empresa ou profissional antes de firmar um contrato de aluguel”, pontua.
Em sua defesa, o dono do imóvel argumentou que não se pode afirmar que o episódio causou danos morais, visto que foi apenas um transtorno.
Ainda de acordo com ele, o casal não trouxe aos autos provas do suposto dano moral sofrido, nem explicou as repercussões das cobranças na esfera íntima.
O juiz da Comarca de Monte Carmelo, João Marcos Luchesi, considerou provada a inadimplência da inquilina. No entanto, ele assegurou que não se prestam cobranças de débitos nas redes sociais, "sendo certo que o abuso da liberdade de expressão, potencializado em âmbito virtual, só acirra desentendimentos e prejudica toda a sociedade".
Segundo o magistrado, o exercício regular de um direito não permite excessos, como o constrangimento ou ameaças. Ele fixou em R$ 5 mil o valor da indenização.
Diante dessa decisão, o proprietário recorreu ao Tribunal, que manteve a condenação, porém reduziu a quantia para R$ 4 mil, em obediência a critérios de razoabilidade e proporcionalidade.
Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem
Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta