A garotinha descendente dos índios puris, que cresceu em meio ao mato e na beira de rio, chega aos 70 anos preservando o seu encantamento com a natureza. Disposta a romper barreiras e iniciar importantes movimentos de preservação ambiental no Espírito Santo, Dalva Ringuier tornou-se a guardiã das árvores e dos rios.
Ela conta que via o avô pescando para sustento da família e, quando o rio enchia, ficava querendo saber de onde vinha tanta água, imaginando onde o rio nascia e para onde ele ia. Aos 9 anos, saiu com os pais do interior de Cachoeiro de Itapemirim para morar na cidade. A casa ficava bem na beira do Rio Itapemirim.
“Eu comecei militando na área ambiental porque eu fui morar na beira do Rio Itapemirim e meu sonho era salvar o rio”, relembra a guardiã.
Quando chegou a Cachoeiro, Dalva começou a ser alfabetizada. “Minha família é muito simples, minha mãe analfabeta, meu pai só sabia escrever o nome dele, e a vida não foi nada fácil.”
Para cursar a graduação em Ciências Sociais na então Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras Madre Gertrudes, no município do Sul capixaba, Dalva trabalhava de dia e estudava à noite. Quando chegou o momento de preparar a monografia de conclusão do curso, resolveu fazer o estudo sobre o rio. Era início da década de 1980 e o título da monografia foi “Para onde vai o Rio Itapemirim?”
Na época, não havia informações sobre o tamanho da bacia do Rio Itapemirim, nem mesmo quais municípios faziam parte. Com esse estudo, Dalva percebeu que o curso d’água estava perdendo vazão e ganhando dimensão. Foi a partir daí que o trabalho em prol do meio ambiente ganhou corpo. Em 1986, foi criada uma ONG chamada Amigos da Bacia do Rio Itapemirim.
“Com a ONG, começamos a buscar formas de tratar o esgoto do rio porque ele era podre, fedia. Todo o esgoto ia para lá. Com isso, conseguimos mobilizar e sensibilizar e o Itapemirim foi o primeiro rio do Estado a ter quase 100% de tratamento de esgoto. Hoje você passa por ele e vê peixes nadando pela margem. Claro que ainda tem um índice de poluição, mas a água é classe 2, e garante vida no local.”
Outro destaque na carreira da ambientalista foi ajudar na criação do programa de educação ambiental do Espírito Santo. Dalva era diretora de Educação Ambiental da Secretaria de Estado do Meio Ambiente e, em 1997, ajudou a organizar, em Guarapari, um fórum nacional sobre o tema.
Com esse trabalho, foi ao Caparaó desenvolver algumas ações e percebeu o quanto a região estava esquecida, mesmo abrigando 80% do parque e o Pico da Bandeira. Daí, apresentou ao governo a ideia de criar um acesso pelo lado do Espírito Santo e, em 22 setembro de 1998, com autorização do governo federal, a portaria capixaba foi aberta.
Hoje, após alguns anos, Dalva está novamente trabalhando pelo Caparaó, por meio do consórcio de desenvolvimento sustentável da região. No momento, estão sendo elaborados as leis e os programas ambientais de todos os municípios que compõem o grupo.
Perto de fazer 70 anos, Dalva mantém a disposição daquela garotinha que queria saber para onde o rio ia. “A área ambiental para mim é prioridade. Enquanto eu tiver força vou estar agindo, por meio de entidade ou com o meu trabalho voluntário. Só o tempo pode me parar, mais ninguém.”
Escolhida na categoria “Meio Ambiente” do Prêmio Capixaba de Valor, Dalva disse ter ficado lisonjeada. “Espero estar fazendo de fato tudo para estar merecendo. Eu sempre digo que fazer a minha parte é fácil, porque tenho consciência que adquiri através de conhecimento. Difícil é convencer o outro a fazer a parte dele também. Esse é o grande desafio."
Dalva Ringuier é cientista social, especialista em educação ambiental e turismo.
Nasceu em Cachoeiro de Itapemirim, no dia 25 de setembro de 1954.
Casada, tem três filhos, dos quais dois são biólogos, e quatro netos.
Participou de todas as expedições que percorreram o Rio Itapemirim e seus afluentes e esteve presente em todas as lutas em defesa do meio ambiente.
Em 1996 comprou uma propriedade que faz limite com o Parque Nacional do Caparaó, em Dores do Rio Preto, e reflorestou, transformando 80% da área em Reserva Particular de Patrimônio Natural (RPPN), uma certificação concedida pelo Estado. Isso significa que a área não pode ser alterada, com cortes de árvores ou novas construções, por exemplo. No local, há atividades de pesquisas científicas e visitas turísticas, recreativas e educacionais. No local, ela também construiu uma pousada, cercada de mata e cachoeiras, que permite uma imersão na natureza.
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