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ES pode sofrer com calor extremo e mais ressacas do mar, alerta cientista

ES pode sofrer com calor extremo e mais ressacas do mar, alerta cientista

Se as emissões não forem reduzidas, Espírito Santo pode ter clima inabitável e capixabas que moram próximos ao mar precisarão abandonar as regiões em que vivem, afirma Carlos Nobre

Publicado em 27 de junho de 2024 às 18:21

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Carlos Nobre é um dos mais renomados climatologistas do País e um dos cientistas brasileiros mais conhecidos mundialmente.
Carlos Nobre é o primeiro brasileiro a entrar no grupo Guardiões do Planeta. (Gabriela Maia)
Gabriela Maia
Estagiária / [email protected]

Chuvas intensas e devastadoras; altas temperaturas e secas prolongadas; ressacas e fortes erosões no litoral. Eventos climáticos extremos com potenciais destrutivos vão se tornar ainda mais frequentes, inclusive no Espírito Santo, segundo alerta do cientista Carlos Nobre, um dos principais climatologistas do mundo.

Ele esteve em Vitória, na última quarta-feira (26), para participar do congresso Sustentabilidade Brasil 2024 e para apresentar um plano climático para a Capital capixaba. Em entrevista para A Gazeta, o especialista destacou a importância de se prevenir fenômenos com consequências trágicas, como as inundações que afetaram mais de 400 cidades do Rio Grande do Sul e que mataram 18 pessoas em Mimoso do Sul (ES) em março deste ano.

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Além de fortes chuvas ou ondas de calor, o Espírito Santo pode ainda sofrer com desequilíbrios ambientais, que podem provocar redução na biodiversidade. Confira a entrevista:

O que os capixabas podem esperar de mudanças climáticas nos próximos cinco anos?

É muito provável que o aumento de temperatura atinja permanentemente 1,5°C antes de 2030. Então Vitoria tem que já estar preparada para eventos extremos, principalmente para chuvas muito intensas que causam inundação, deslizamento de encostas, ressacas muito fortes e secas muito longas e pronunciadas. Tudo isso vai acontecer com uma frequência maior do que acontecia há 5 ou 10 anos, quebrando recordes. Não tem mais volta.

É preciso preparar soluções sustentáveis e políticas claras de adaptação, aumentando a resiliência das populações urbanas, principalmente as mais pobres.

Como as ressacas podem afetar o litoral capixaba?

Ressacas são ondas no mar geradas em período de tempestade muito forte. Essa tempestade transfere energia para o oceano, o mar sobe e forma uma onda que, quando chega na costa, estoura. Se a temperatura aumentar mais de 2,5°, podemos chegar na segunda metade do Século com ressacas comuns no Espírito Santo, de 2,5 a 5 metros. Isso traz um enorme impacto porque muitas populações habitam zonas costeiras muito baixas, quase no nível do mar.

As ressacas já estão aumentando e vão aumentar muito mais rápido porque as tempestades estão muito mais fortes. A maioria das populações costeiras provavelmente terá que abandonar as regiões em que vivem. Como não tem soluções de infraestrutura para esse problema, o melhor é achar lugares mais seguros. Isso vai afetar, certamente, um número muito grande de pessoas no Espírito Santo.

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O Estado pode sofrer com ondas de calor extremo?

Os eventos extremos que mais levam a morte no mundo são as ondas de calor, mas, felizmente, o Espírito Santo é uma zona costeira, e por estar perto do oceano as temperaturas não costumam ultrapassar os 40°. Além disso, outras partes estão na serra, que também conseguem manter a temperatura.

O Espírito Santo sofre periodicamente com enchentes que afetam os municípios. Esse tipo de desastre pode se tornar ainda mais frequente?

O aumento da temperatura cria sistemas extremos de chuva. No Espírito Santo, quando o oceano está muito quente tem muita evaporação do mar, aumentando as chuvas. Esse sistema também impacta as secas que também vão acontecer em uma frequência que nunca foi vista.

Em entrevista para A Gazeta em 2019, o senhor alertou que, caso perdêssemos o controle das mudanças climáticas, Vitória se tornaria inabitável por horas, durante seis meses do ano. Nessas condições, os capixabas precisariam ficar em ambientes climatizados para sobreviver porque as temperaturas ultrapassariam o limite fisiológico que o ser humano comporta. Essa ainda é uma realidade? Em quanto tempo isso pode acontecer?

Isso é um enorme risco para o planeta todo. Tempos atrás foi calculado que se não conseguíssemos reduzir as emissões, esse nível de aumento de temperatura poderia ser maior que 4°C na virada do século, em 2100. No verão, em toda a região costeira do Brasil, a temperatura e a umidade ultrapassaria a capacidade do corpo humano de aguentar, com um ar muito úmido e quente.

Idosos e bebês só resistem 30 minutos quando o corpo não consegue perder calor, já os jovens e adultos saudáveis, duas horas. Em áreas subtropicais, como o Espírito Santo, durante 6 meses do ano, o lugar ficaria inabitável. Atualmente, se as emissões não forem reduzidas, isso pode ser atingido antecipadamente entre 2070 e 2080.

Como as indústrias presentes no Espírito Santo impactam as mudanças climáticas?

Com as secas, cria-se uma situação meteorológica que mantém todos os poluentes que as indústrias emitem, não se misturam e ficam na superfície, aumentando muito os níveis de poluição. É muito importante reduzir a emissão desses poluentes. Quando chove, essas partículas poluem os rios, oceanos e afetam sua biodiversidade. As empresas precisam traçar metas para reduzir essas emissões. 

Como as mudanças climáticas afetam a Mata Atlântica presente no território espírito-santense?

Com a diminuição da chuva, algumas áreas podem ficar com o clima muito mais seco, que não vão conseguir manter a Mata Atlântica. Se a temperatura subir muito, o clima semiárido do Nordeste vai descer pegando partes da Bahia e o Norte do Espírito Santo, o que é uma mudança ecológica muito séria. Esse fenômeno vai atingir uma das maiores biodiversidades de plantas do mundo.

Biografia de Carlos Nobre

Carlos Nobre é reconhecido pelo seu trabalho acadêmico sobre clima e aquecimento global, desenvolveu praticamente toda a sua carreira no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais – INPE, onde se aposentou em 2012 como pesquisador titular nível III. Desde então, atua como cientista sênior no Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo – USP. Ele é o primeiro brasileiro a fazer parte do grupo Planetary Guardians (Guardiões do Planeta) e está engajado em desenvolver um novo modelo econômico para manter a floresta amazônica em pé, aliando o uso de tecnologias de última geração com o conhecimento tradicional dos povos da região, com o Projeto Amazônia 4.0. Nobre fez parte da equipe internacional de cientistas que recebeu o Prêmio Nobel da Paz em 2007. Junto ao ex-vice-presidente americano Al Gore, os pesquisadores do IPCC (painel da ONU sobre mudanças climáticas) foram premiados pelo papel de alertar sobre os riscos do aquecimento global e lutar pela preservação ambiental.

Fonte: governo federal

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