O governo do Espírito Santo já aplicou mais de R$ 45 milhões em multas ambientais entre 2006 e 2022, para 1,6 mil empresas e 652 pessoas físicas. Desse total, porém, só R$ 4,7 milhões, o equivalente a 10,4%, foram pagos. Os mais de R$ 40 milhões restantes viraram dívida, prescreveram ou estão sob recurso administrativo, ou judicial, alguns há mais de uma década.
Os dados são públicos e estão no site do Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema). Eles foram tratados e analisados por A Gazeta, já que o órgão ambiental não disponibiliza uma versão aberta dos indicadores.
Constam ao todo informações sobre 2.298 multas, que o Iema confirmou serem todos os autos emitidos pelo órgão. Há registros desde 2001, mas a maior parte deles se concentra entre os anos de 2006 e 2022.
As informações disponibilizadas, contudo, são incompletas e pouco esclarecedoras. Não é possível saber qual foi a infração ou crime ambiental que acarretou a multa. Também não há a data exata da emissão do auto de infração, apenas o ano.
Entre as multas aplicadas há mais tempo e que não foram pagas, 421 delas prescreveram. Elas somam R$ 3,6 milhões em recursos que o governo do Estado não vai mais recolher porque o tempo passou e o dinheiro não pode mais ser cobrado.
Ainda constam R$ 9,3 milhões em multas canceladas. Segundo o Iema, nesse grupo, além de penalidades prescritas, há também aquelas em que o acusado recorreu e conseguiu provar sua inocência ou cujo documento de infração tinha algum vício, algum erro.
Cerca de R$ 4 milhões não foram pagos e o devedor teve o débito inscrito na dívida ativa. A maior parcela dos débitos, porém, está em fase de recurso: R$ 13,8 milhões.
O volume de multas que prescreveram e foram canceladas preocupa o Conselho Estadual de Meio Ambiente (Consema).
“A gente tem batido nessa questão de acelerar os julgamentos dos processos porque muitos estão sendo prescritos por decurso de prazo. Eles têm prazo legal para serem julgados e muitos acabam vencendo e as pessoas acabam não pagando as multas”, explica o ambientalista Iberê Sassi, que integra o Consema.
O problema maior, afirma o especialista, não ocorre porque as pessoas e as empresas recorrem das multas, pedem algum tipo de compensação alternativa, parcelamento ou algo equivalente. Esse é um direito delas. “A questão é a demora do próprio órgão em julgar os processos para resolver a situação”, avalia.
Ele aponta que há casos em que a multa prescreve antes de chegar na segunda instância de recurso.
O recurso das multas vai para o Fundo Estadual de Meio Ambiente (Fundema), e pode ser usado para recuperação de áreas degradadas, proteção e conservação de espécies ameaçadas de extinção, preservação dos recursos naturais renováveis e na manutenção das unidades de conservação do Estado. Atualmente, o fundo tem em caixa R$ 5,5 milhões.
Segundo o Iema, ao receber a multa, o acusado tem 15 dias para entrar com a defesa ou pagar o valor com 30% de desconto.
“Se dentro desse prazo não houver recurso e nem a multa for quitada, é feita uma notificação ao autuado, dando um prazo de mais 15 dias para que o pagamento seja feito, caso contrário é feita a inscrição na dívida ativa”, afirma o órgão em nota. Segundo os dados do Iema, há R$ 4 milhões em multas inscritas na dívida ativa.
Caso queira recorrer, é o acusado que escolhe se quer usufruir desse direito administrativamente ou na Justiça. “No caso de defesa administrativa, protocolado o requerimento no Iema, o processo vai para análise jurídica e/ou técnica. Já no caso judicial, a competência para tratar a questão é do poder judiciário”, explica o órgão.
O sistema que registra a tramitação dos recursos mostra que alguns processos ficam parados durante anos, sem andamento. Uma multa registrada em 2009, por exemplo, ficou no setor de assessoria jurídica do Iema por nove anos (veja no print abaixo), antes de ter prosseguimento administrativo. Na planilha do órgão, a multa consta como prescrita. O valor: R$ 842 mil.
Outro auto, registrado em 2010, ainda está em tramitação, aguardando decisão de segunda instância. Ou seja, o recurso administrativo já dura 13 anos.
O Iema confirmou que há um passivo, principalmente de processos anteriores a 2019, e disse que vem “tomando medidas para reduzi-lo”. O órgão não informou quais são as medidas, nem informou quantas pessoas atuam no setor que dá andamento às multas.
A Gazeta questionou o Iema a respeito da baixa proporção de multas ambientais efetivamente pagas, mas não obteve resposta. O órgão também não explicou a razão para algumas multas estarem em processo de recurso há mais de uma década.
Sobre a falta de dados a respeito da origem das multas, o órgão diz que a legislação federal vigente não especifica itens obrigatórios para serem descritos nos autos de infração. Contudo, uma lei estadual deste ano, que dispõe sobre a divulgação de informações ambientais, prevê mais detalhamento a partir de janeiro de 2024. O Iema afirma que pretende atender à nova exigência.
Veja abaixo as perguntas não respondidas pelo órgão:
Quantos servidores atuam no setor que processa e dá andamento às multas?
O Iema considera esse número de servidores suficiente?
Por que há registros de multas em recurso há dez anos?
O que o órgão pode fazer para cobrar essas multas?
Por que só cerca de 10% delas são quitadas?
Para onde vai o dinheiro arrecadado com as multas?
Em que ocasiões esse dinheiro é gasto?
Com o que ele pode ser usado?
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