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BBC questiona líder do Hamas sobre ataques de 7 de outubro

BBC questiona líder do Hamas sobre ataques de 7 de outubro

Khalil al-Hayya responde perguntas sobre o ataque do Hamas a Israel e o agravamento da crise na região desde então.

Publicado em 4 de outubro de 2024 às 19:42

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Imagem BBC Brasil
Khalil al-Hayya, vice-líder do Hamas, afirmou que grupo não tinha o objetivo de matar civis em Israel em outubro do ano passado . (BBC)

O líder mais antigo do Hamas fora de Gaza disse à BBC que a crise que seu grupo provocou no Oriente Médio, a qual levou a milhares de mortes na região desde o ano passado, é justificada.

Questionado pelo editor internacional da BBC Jeremy Bowen, Khalil al-Hayya, o vice-líder do Hamas, negou fortes evidências de que os combatentes do Hamas atacaram civis durante os ataques de 7 de outubro do ano passado.

Cerca de 1.200 pessoas, a maioria civis israelenses, foram mortas e mais de 250 levadas para Gaza como reféns na ocasião.

O Hamas é classificado como uma organização terrorista pelo Reino Unido e outros países.

A entrevista ocorreu em Doha, onde a maior parte da liderança política do Hamas está sediada.

Khalil al-Hayya se tornou o líder mais antigo do Hamas fora de Gaza depois que Israel assassinou seu antecessor, Ismail Haniyeh, em julho.

O Irã atacou Israel com mísseis balísticos cerca de uma hora após a entrevista ter sido gravada.

JB (Jeremy Bowen): Vamos voltar para o 7 de outubro do ano passado. Por que o Hamas atacou Israel?

KAH (Khalil al-Hayya):Tivemos que disparar um alarme para o mundo, para dizer que somos um povo com uma causa e demandas. Foi um golpe para Israel, o inimigo sionista — e um chamado para despertar a comunidade internacional.

Tivemos que fazer algo que dissesse ao mundo que há um povo sob ocupação há décadas.

JB: Por que seus homens mataram tantos civis, crianças também?

KAH: Ordenamos aos nossos combatentes da resistência que, em 7 de outubro, não atacassem civis — mulheres e crianças.

Os soldados da ocupação eram o nosso objetivo. Eles estavam sempre matando, bombardeando e destruindo em Gaza. Não endossamos ferir civis.

No terreno, certamente houve erros individuais — e ações. Os combatentes podem ter sentido que suas vidas estavam em perigo.

JB: Seus homens não estavam em perigo. Eles estavam com civis aterrorizados sentados no chão, enquanto seus homens estavam de pé com armas. Isso não é uma batalha.

KAH: Todos nós vimos como os combatentes entraram nas casas. Eles falaram com as famílias, comeram e beberam.

JB: Desculpe, mas eles estavam atirando nos civis. Tem vídeos.

KAH: Quando eles entraram em algumas das casas, nenhuma das mulheres e crianças com quem eles tiveram que lidar ficaram aterrorizadas. Esses vídeos foram publicados pela ocupação israelense. Não foram publicados por nós.

Imagem BBC Brasil
O jornalista da BBC Jeremy Bowen questionou Khalil al-Hayya sobre os ataques a civis em Israel . (BBC)

JB: Vamos passar a abordar o que aconteceu desde 7 de outubro. Quase um ano depois, Gaza está em ruínas e há mais de 40.000 mortos, muitos deles civis. Sua capacidade de lutar contra Israel foi fortemente diminuída. Valeu a pena tudo isso? Você pensou que algo assim poderia acontecer?

KAH: Quem é responsável por isso? Foi a ocupação [israelense] e seu exército. Quem destruiu Gaza? Quem matou o povo? Quem agora está matando civis em abrigos, escolas e hospitais?

Pergunte ao mundo — e àqueles que criaram o direito internacional. Estamos nos defendendo.

Se 1.200 pessoas da ocupação são mortas, como isso justifica Israel matar 50.000 pessoas e destruir toda Gaza? Isso não é o suficiente para eles?

Mas eles são motivados pela luxúria de matar, de ocupar e de destruir.

JB: Os israelenses dizem muito claramente que respeitam as leis de guerra e que a razão pela qual tantos civis morreram é porque vocês do Hamas lutam embrenhados dentro da população civil e os usam como escudos humanos.

KAH: Isso não é verdade. Eles destruíram mesquitas nas cabeças de seus donos quando não havia combatentes. Eles destruíram casas e prédios altos quando não havia ninguém neles.

Eles bombardearam casas em que não havia um único combatente nelas. É tudo propaganda israelense.

JB: Gostaria de falar sobre os reféns. Por que foi necessário fazer mais de 250 pessoas reféns, incluindo mulheres e crianças?

KAH: Um dos objetivos do 7 de outubro era sequestrar um pequeno grupo de soldados israelenses, para trocá-los por prisioneiros palestinos. Mas quando a Divisão de Gaza [setor militar israelense] entrou em colapso total diante dos guerreiros da resistência, fizemos muitos prisioneiros.

Não era nosso plano capturar civis, incluindo mulheres e crianças.

JB: Algumas dessas mulheres que vieram a público falar sobre o ocorrido disseram que foram abusadas sexualmente.

KAH: As ordens e a ética de todos os palestinos — e dos combatentes da resistência — eram humanitárias.

Somos criados de acordo com a religião, cultura e civilização nacional islâmicas. Nós os protegemos como nos protegemos. Agressão sexual — ou não sexual — nunca foi provada.

JB: Não, algumas mulheres disseram que foram abusadas sexualmente. Mulheres jovens que estavam no festival de música Nova. Há mulheres dizendo que foram abusadas sexualmente no dia 7 e depois. Evidências disso estão se acumulando.

KAH: Eu disse a você que as instruções eram claras. Pode ter havido atos anormais de pessoas irresponsáveis, mas essas foram apenas acusações.

JB: E quanto a um cessar-fogo? Israel diz que, sob as certas condições, aceitariam um cessar-fogo. Você aceitaria um cenário em que você devolve os reféns e a guerra acaba? Isso já foi falado, eu sei.

KAH: A questão é: quando Netanyahu [Benjamin Netanyahu, primeiro-ministro de Israel] decidirá parar a guerra? Quando o mundo o obrigará a parar a guerra? É uma decisão de Netanyahu e da ocupação de Israel continuar a guerra.

JB: Vocês poderiam fazer isso. Vocês poderiam se render.

KAH: Como podemos nos render? Pessoas que resistem à ocupação não desistem. Se nos rendermos, o que é impossível, nossos filhos e nosso povo não desistirão.

Por que deveríamos nos render? A ocupação que deveria parar de matar. Chegar a um acordo de cessar-fogo estava ao alcance em 2 de julho. Quem apresentou novas condições? Netanyahu! É por isso que não houve acordo.

Imagem BBC Brasil
Khalil al-Hayya quebrou o pé durante um ataque israelense em julho e ainda está usando uma bota imobilizadora. (BBC)

JB: Você está perdendo a guerra: Gaza está em ruínas, dezenas de milhares estão mortos, Israel está atacando o Líbano e agora está se sentindo forte. Você não está vencendo, está?

KAH: Minha família, meus filhos, minha família, meus parentes e meus vizinhos estão em Gaza. Nós vemos com os olhos deles. Nós sentimos a dor deles. Nós choramos pelas feridas deles. O que os machuca, nos machuca.

Se o mundo nos desse nossos direitos legítimos, esse ciclo de violência pararia. Mas Israel não quer isso. O mundo precisa entender que Israel quer queimar toda a região.

Se os palestinos não assumirem seu direito a um Estado, ao retorno dos refugiados e à autodeterminação, a região não acalmará — não importa quanta morte e quantas matanças ocorram.

JB: Para você, o Estado israelense é parte do futuro? A carta do Hamas dizia que o Estado sionista tinha que ser destruído.

KAH: Dizemos que Israel quer eliminar o Hamas e o povo palestino.

Israel está chorando e alegando que o Hamas e o povo palestino querem destruí-lo.

Vamos perguntar o que Israel pensa do povo palestino? Dê-nos nossos direitos, dê-nos um Estado palestino totalmente soberano.

JB: Os israelenses dizem que a razão pela qual não aceitam a solução de dois Estados é porque temem que pessoas como você queiram destruir o Estado e o povo deles.

KAH: Até agora, Israel não reconhece uma solução de um Estado, ou uma solução de dois Estados.

Israel rejeita tudo: resoluções internacionais, as leis internacionais e nossos direitos.

JB: Você se considera um terrorista? É assim que Israel o chama.

KAH: Estou buscando liberdade e defendendo meu povo. Para a ocupação, somos todos terroristas — os líderes, as mulheres e as crianças. Você ouviu como os líderes israelenses nos chamaram. Eles disseram que éramos animais.

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