O ex-presidente Jair Bolsonaro é uma das 37 pessoas indiciadas pela Polícia Federal (PF) pelos crime de golpe de Estado, abolição violenta do Estado Democrático de Direito e organização criminosa.
Além do ex-presidente, estão na lista ex-ministros, militares e aliados de Bolsonaro, como os generais Augusto Heleno e Braga Netto.
Apesar de seu peso e impacto político, o indiciamento não é uma condenação nem significa que o investigado será automaticamente levado a julgamento.
Ele serve para embasar o trabalho do Ministério Público (no caso, a Procuradoria-Geral da República), que vai decidir sobre a continuidade do processo.
Essa não é, inclusive, a primeira vez que a PF indicia Bolsonaro. Ele já foi apontado pela polícia como o autor de crimes em duas investigações da polícia: o caso das joias sauditas e a fraude no cartão de vacinas. Sua defesa nega que ele tenha cometido qualquer crime.
O indiciamento também não significa que a pessoa será presa: o cumprimento da pena só acontece no final de um processo, caso haja condenação e tenham se esgotado todas as possibilidades de recurso.
Existe a possibilidade de uma pessoa ser presa antes somente se for presa em flagrante ou se a Justiça entender que ela apresenta um perigo imediato para a sociedade ou pode atrapalhar o andamento do processo. Até o momento, não houve um pedido de prisão para nenhum dos acusados.
Mas o que o indiciamento significa e o que acontece agora?
Um indiciamento é um ato formal da polícia que acontece quando ela entende que há indícios suficientes de que a pessoa investigada cometeu um crime. O processo então segue uma trajetória bem definida, que passa por diferentes esferas do sistema de Justiça.
No caso em questão, a Polícia Federal terminou o inquérito que investigava a existência de uma tentativa de dar um golpe de Estado no final de 2022, após Bolsonaro perder as eleições, e concluiu que há provas de que as 37 pessoas - incluindo o ex-presidente - foram autores desses três crimes.
Embora seja o primeiro passo para a abertura de um processo criminal na Justiça para que os acusados possam se defender e ser julgados, o indiciamento não significa necessariamente que a pessoa enfrentará um processo: são necessárias outras etapas para que isso aconteça.
Assim como nos dois outros casos, o indiciamento relativo à tentativa de golpe de Estado significa que a PF entregará suas conclusões para o Ministério Público (MP), o órgão responsável por tomar os próximos passos.
Como o caso tramita no Supremo Tribunal Federal, a Corte precisa autorizar que o inquérito siga para o próximo passo, e, em seguida, quem o receberá é a Procuradoria-Geral da República, órgão que chefia o Ministério Público.
Segundo a assessoria do STF, o inquérito - que está sob sigilo - está neste momento sendo analisado pelo relator do caso, o ministro Alexandre de Moraes, que deve encaminhá-lo para a PGR na próxima semana.
Após qualquer indiciamento policial, o Ministério Público (no caso, a PGR) recebe o inquérito policial e pode seguir um de três caminhos:
No caso em questão, caso decida apresentar uma denúncia à Justiça, a PGR vai denunciar Bolsonaro e os outros 36 acusados ao Supremo Tribunal Federal - que pode ou não aceitar a denúncia.
Caso aceite a denúncia, o STF então dará início a um processo penal contra os acusados, que se tornam formalmente réus no processo.
A partir deste momento, os réus têm direito a ter acesso às provas e têm a oportunidade de apresentar sua defesa à Justiça.
O processo então segue o rito normal de um processo criminal, com uma diferença: as instâncias envolvidas.
Normalmente em um processo criminal, o réu, caso seja condenado, tem direito a recorrer à segunda instância da Justiça, ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e, em alguns casos, ao STF.
No entanto, o processo em questão já correria direto no STF e, embora os réus possam apresentar recursos e recorrer de decisões, não há possibilidade de recorrer a uma instância superior, pois o STF já é a mais alta instância da Justiça Brasileira.
Embora Bolsonaro não tenha mais foro privilegiado após deixar o cargo de presidente, o inquérito da PF precisou ser autorizado pelo STF por estar relacionado a outras investigações que já existem com aprovação do STF.
O relator do caso no Supremo, o ministro Alexandre de Moraes, toma as decisões em relação à investigação, mas caso um processo criminal seja de fato aberto, os acusados serão julgados por um colegiado de ministros.
Dois dos crimes pelos quais Bolsonaro e aliados são acusados foram previstos em 2021.
Neste ano, a Lei de Segurança Nacional, criada durante a ditadura, foi revogada e o Código Penal foi alterado para conter novas descrições dos crimes contra o Estado Democrático de Direito, um seja, um Estado onde o povo escolhe seus líderes e que é regido por normas e leis que todos precisam seguir.
Os crimes de Abolição Violenta do Estado Democrático de Direito e Golpe de Estado são bastante parecidos, explica o advogado Acacio Miranda da Silva Filho, mestre em direito penal internacional pela Universidade de Granada (Espanha).
Enquanto Abolição Violenta do Estado Democrático é impedir o livre exercício de qualquer um dos poderes (Executivo, Judiciário, Legislativo) que compõe o Estado; o Golpe de Estado é tentar derrubar um governo democraticamente constituído.
Como ambos são crimes recentes, não existe jurisprudência sobre eles, ou seja, não existem decisões anteriores sobre eles que possam embasar a Justiça no caso, afirma Miranda da Silva.
No entanto, segundo o advogado, é possível entender que ambos são crimes subsidiários, ou seja, que caso ambos sejam cometidos, o mais grave (golpe de Estado), "absorveria" o menos grave (abolição do Estado) - ou seja, a pessoa responderia apenas pelo mais grave.
É como quando alguém esfaqueia outra pessoa com o intuito de mata-lá. Tecnicamente, dois crimes foram cometidos: lesão corporal e tentativa de homicídio. Como homicídio é o mais grave, o réu responde apenas por ele.
No caso, Bolsonaro e aliados foram indiciados por três crimes. Caso sejam condenados, podem receber penas:
Se condenados, os réus só começam cumprir a pena após o trânsito em julgado do processo, ou seja, após o fim da possibilidade de recursos.
No entanto, qualquer um deles pode ser preso preventivamente, a pedido do MP, caso a Justiça entenda que eles apresentam perigo imediato à sociedade ou podem atrapalhar o andamento do processo.
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