A Polícia Federal realizou uma operação na manhã desta terça-feira (19/11) para cumprir mandados de prisão e busca e apreensão contra suspeitos de planejar um golpe de Estado no final de 2022 para impedir a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Cinco pessoas foram presas com autorização do Supremo Tribunal Federal (STF). Quatro deles são militares do Exército, integram forças de operações especiais e são conhecidos como "kids pretos".
Foram presos o general de brigada da reserva Mario Fernandes, o tenente-coronel Helio Ferreira Lima, o major Rodrigo Bezerra Azevedo e o major Rafael Martins de Oliveira.
Dessa lista, o nome de Mario Fernandes é um dos mais conhecidos. Ele atuou como secretário-executivo da Secretaria-Geral da Presidência no governo de Jair Bolsonaro e também exerceu a função de assessor do deputado federal Eduardo Pazuello (PL-RJ), mas foi afastado do posto por determinação do STF.
O quinto indivíduo que teve a prisão decretada foi o policial federal Wladimir Matos Soares.
Nos documentos da PF e do STF que embasam a decisão divulgada nas últimas horas, estão detalhadas todas as provas — trocas de mensagens por diferentes aplicativos, documentos, fotos, áudios, entre outros — e o trabalho de investigação que relacionou esse material.
Mas dois nomes de documentos ou operações clandestinas que foram descobertas pela PF chamaram a atenção.
Intitulados "Copa 2022" e "Punhal Verde Amarelo", eles trazem detalhes dos planos de monitoramento, prisão ilegal e até uma possível execução de três personagens centrais nessa história: Alexandre de Moraes, ministro do STF e então presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Lula, à época presidente eleito, e Geraldo Alckmin (PSB), vice-presidente eleito.
Confira a seguir os detalhes divulgados até o momento.
Segundo o documento do STF e a apuração da PF, os investigados tinham a "a finalidade de impedir a posse do governo legitimamente eleito e restringir o livre exercício da Democracia e do Poder Judiciário brasileiro".
Para isso, eles colocaram em marcha uma operação que teve "auge a partir de novembro de 2022" e avançou até o mês de dezembro, "como parte de plano para a consumação de um golpe de Estado, em uma operação denominada pelos investigados de 'Copa 2022'".
Ainda de acordo com a investigação, tal operação tinha "elementos típicos de uma ação militar planejada detalhadamente, porém, no presente caso, de natureza clandestina e contaminada por finalidade absolutamente antidemocrática".
No dia 15 de novembro de 2022, o major Rafael Martins de Oliveira (um dos presos pela PF nesta terça-feira) encaminhou via WhatsApp para o general Mauro Cid, ajudante de ordens de Bolsonaro, um documento protegido por senha intitulado "Copa 2022".
"Pelo teor do diálogo, seria uma estimativa de gastos para subsidiar, possivelmente, as ações clandestinas, que seriam executadas durante os meses de novembro e dezembro de 2022", aponta a petição do STF.
Esse mesmo nome — "Copa 2022" — foi usado posteriormente como título de um grupo criado no Signal, um aplicativo de troca de mensagens.
Esse grupo era composto de seis usuários — e cada um deles recebeu um país como codinome "para não revelarem sua identidade", segundo a PF.
Os codinomes escolhidos foram: Alemanha, Áustria, Brasil, Argentina, Japão e Gana.
Vale destacar que os chips dos números de celulares que aparecem no grupo de mensagens estavam cadastrados em nomes de terceiros, que se encontravam em outras regiões do país.
A petição do STF aponta que "as mensagens trocadas entre os integrantes do grupo 'Copa 2022' demonstram que os investigados estavam em campo, divididos em locais específicos para, possivelmente, executar ações com o objetivo de prender o ministro Alexandre de Moraes".
Um exemplo: no dia 15 de dezembro de 2022 às 20h33, a pessoa associada ao codinome Brasil, informa um dos locais em que estava atuando. Ele diz: "Estacionamento em frente ao gibão carne de sol [um restaurante]. Estacionamento da troca da primeira vez".
Em seguida, a pessoa associada ao codinome Gana informa que já estava no local combinado: "Tô na posição".
A troca de mensagens continua até que, às 20h57min, a pessoa de codinome Áustria diz: "Tô perto da posição. Vai cancelar o jogo?".
Segundo a PF, ele possivelmente queria saber se a ação contra Moraes seria cancelada.
Cerca de dois minutos Japão, o suposto líder do grupo, respondeu: "Abortar... Áustria... volta para local de desembarque... estamos aqui ainda..."
A investigação da PF cruzou as informações fornecidas pelos envolvidos e também dados de chips de celular, aluguel de carros e outras fontes para concluir que o grupo monitorava Moraes.
"A análise [...] permite concluir que 'é plenamente plausível que a pessoa de codinome Gana estivesse próxima a residência funcional do ministro Alexandre de Moraes."
O uso de termos específicos do ambiente militar e o detalhamento das ações sugere, de acordo com a investigação, que os envolvidos tinham treinamento e especialização em operações especiais.
O trabalho da PF apontou que o major Rafael Martins de Oliveira, um dos presos nesta terça-feira (19/11), seria o líder da operação "Copa 2022".
As evidências colhidas por STF e PF apontam que segundo documento-chave da investigação, denominado "Punhal Verde Amarelo", foi elaborado pelo general Mario Fernandes.
Esse arquivo detalhada um "planejamento operacional" que "tinha como objetivo executar o ministro Alexandre de Moraes e os candidatos eleitos Luíz Inácio Lula da Silva e Geraldo José Rodrigues Alckmin Filho, ambos componentes da chapa vencedora das eleições".
A PF aponta que o documento foi impresso por Fernandes no Palácio do Planalto no dia 09 de novembro de 2022.
Nessa mesma ocasião, os aparelhos telefônicos de outros investigados — Rafael Martins de Oliveira e Mauro Cid — também estavam conectados à rede que cobre o Palácio do Planalto.
Depois, esses papeis foram levados ao Palácio da Alvorada, residência do então presidente Bolsonaro.
"O planejamento 'Punhal Verde e Amarelo' evidencia que, no tabuleiro das intenções antidemocráticas, vidas humanas eram descartáveis, inclusive de eventuais militares envolvidos na ação", diz a petição do STF.
No relatório a PF diz que o documento tinha "características terroristas", no qual constam descritos "todos os dados necessários para a execução de uma operação de alto risco".
"O plano dispõe de riqueza de detalhes, com indicações acerca do que seria necessário para a sua execução, e, até mesmo, descrevendo a possibilidade da ocorrência de diversas mortes", diz a PF.
Há, por exemplo, menções ao arsenal que seria utilizado na operação — que inclui pistolas e civis comumente usados por policiais e militares, mas também armamentos de guerra mais pesados, como metralhadoras e lança-granadas.
A investigação aponta que, no documento, o codinome "Jeca" refere-se a Lula.
"Para execução do presidente Lula, o documento descreve, considerando sua vulnerabilidade de saúde e ida frequente a hospitais, a possibilidade de utilização de envenenamento ou uso de químicos para causar um colapso orgânico", revela a PF.
Já "Joca" seria Alckmin. "Isso porque o texto aponta que na inviabilidade do '01 eleito', ou seja, Lula, 'sua neutralização extinguiria a chapa vencedora'. Como, além do presidente, a chapa vencedora é composta, obviamente, pelo vice-presidente, é somente na hipótese de eliminação de Geraldo Alckmin que a chapa vencedora estaria extinta".
Há ainda a menção a um terceiro nome, "Juca", descrito como "iminência [sic] parda do 01 [possivelmente Lula] e das lideranças do futuro gov [governo]", mas a PF não conseguiu identificar quem seria essa pessoa.
Já para Moraes, "foram consideradas diversas condições de execução", "inclusive com o uso de artefato explosivo e por envenenamento em evento oficial público", dizem PF e STF.
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