Eleito com a promessa de normalizar a política americana após os quatro caóticos anos de governo Trump, o presidente Joe Biden conseguiu, ainda durante a campanha eleitoral, agregar o apoio de setores progressistas, moderados e anti-Trump em sua base de apoio, em uma espécie de coalizão que garantiu ao Partido Democrata não apenas a Presidência dos Estados Unidos, mas a maioria na Câmara e no Senado. Em um cenário político polarizado como o dos EUA, Biden conseguiu manter a avaliação positiva sobre seu governo nos primeiros meses de mandato, mas viu tudo ser posto em risco com a saída americana do Afeganistão e o domínio do país pelo Talibã, sua primeira grande crise.
O número de americanos que desaprovam o governo Biden superou pela primeira vez o porcentual de apoiadores do presidente nessa segunda-feira, 30, mesmo dia que os EUA encerraram oficialmente sua retirada do Afeganistão, de acordo com o índice de aprovação da Presidência americana calculado pelo site especializado em dados FiveThirtyEight. De acordo com a iniciativa, 47,5% dos americanos desaprovam o democrata, enquanto 47,2% permanecem fiéis ao governo.
A queda na popularidade de Biden - que chegou a ser 55,1% positiva em 22 de março, segundo o mesmo índice - vem na esteira da retirada apressada dos americanos de Cabul e na reconquista do Afeganistão pelo Talibã - grupo extremista retirado do poder pelos EUA em 2001, ainda no primeiro ano da 'guerra ao terror' lançada pelo então presidente George W. Bush
A pressão sobre Biden aumentou gradualmente no mês de agosto, com o avanço da campanha militar do Talibã contra as tropas do governo afegão, enquanto as tropas americanas começavam a deixar o país. Com o desempenho das forças afegãs muito abaixo das expectativas, sendo derrotada em semanas, militares e civis americanos, além de afegãos que cooperaram com as forças ocidentais nos últimos anos, viram-se encurralados em Cabul no dia 15 de agosto, com a operação de retirada tento que ser concluída em um país controlado de fato pelos extremistas islâmicos - em cena comparada pela opinião pública americana com a saída americana de Saigon.
O cenário só piorou para Biden nos dias subsequentes, quando as imagens de pessoas se agarrando desesperadamente a fuselagem de aviões - e caindo para a morte após a decolagem - ganharam o mundo. Mesmo com o controle da pista nos dias subsequentes, imagens marcantes não pararam de surgir dos arredores do aeroporto lotado - como crianças sendo passadas de mão em mão até serem entregues a soldados americanos. Além disso, a própria relação com o Talibã, que assumiu o papel de garantir passagens seguras até o aeroporto de Cabul - apesar das denúncias de abusos por parte de militantes contra quem buscava deixar o país - foi vista como mais um vexame na retirada.
O auge da pressão para o público americano, no entanto, veio na última quinta-feira, 26, quando um atentado terrorista promovido pelo Estado Islâmico Khorasan (ISIS-K), trouxe à memória dos americanos, de forma muito viva, a ameaça do terrorismo. A explosão no entorno do aeroporto de Cabul foi um dos ataques mais letais de toda a guerra, vitimando 13 militares americanos e mais de uma centena de civis afegãos.
A reação ao atentado no Congresso americano conturbou ainda mais o cenário político do país, motivando até mesmo pedidos de renúncia de Biden por parlamentares alinhados ao ex-presidente Donald Trump. Contudo, mesmo parlamentares democratas exigiram explicações e investigações sobre a operação de retirada, como o senador Robert Menéndez, presidente do Comitê de Relações Exteriores do Senado.
Apesar da popularidade de Biden só ter se tornado inferior à desaprovação na segunda-feira, segundo o índice calculado pelo FiveThirtyEight - que leva em consideração uma série de pesquisas, quantificando os porcentuais a partir de critérios como a data de realização da pesquisa, o tamanho da amostra e a tendência partidária -, outros levantamentos já apontavam que a maior impopularidade do presidente antes da conclusão da retirada.
Uma pesquisa do USA Today/Suffolk University apontou, na semana do atentado do ISIS-K, que Biden tinha uma aprovação geral de apenas 41%, com 55% de desaprovação. Apesar disso, os americanos consultados disseram não acreditar que a continuidade da guerra do Afeganistão fosse desejável.
"Não sei se Biden sofrerá danos permanentes", disse o professor de governo da Universidade de Georgetown, Mark Rom, em entrevista à France-Presse quando a pesquisa foi divulgada. E completou: "Mas os republicanos farão tudo o que estiver ao seu alcance para garantir que sim".
Charles Franklin, diretor de Pesquisa da Escola de Direito da Universidade de Marquette, disse que dada a impopularidade da guerra afegã, Biden ainda pode resistir ao fiasco. "A pergunta política, uma vez que os Estados Unidos tiverem saído por completo, é se a maioria ficará contente de não estarmos mais ali. Se for assim, é provável que este problema se esfumace", disse. (Com agências internacionais).
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