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Javier Milei: quem é o 'anarcocapitalista' aliado de Bolsonaro que surpreendeu em primárias na Argentina

Javier Milei: quem é o 'anarcocapitalista' aliado de Bolsonaro que surpreendeu em primárias na Argentina

Apoiado por Bolsonaro, Milei foi o candidato mais votado nas eleições primárias argentinas; resultado posiciona o parlamentar como favorito para as eleições gerais de outubro

Publicado em 14 de agosto de 2023 às 10:50

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Imagem BBC Brasil
Javier Milei venceu com mais de 30% dos votos. (Reuters)

Em um resultado que causou enorme surpresa na Argentina, o economista de direita radical Javier Milei foi o vencedor das eleições primárias realizadas no domingo (13/8).

Milei, que se autodenomina um libertário, e seu grupo La Libertad Avanza ("A Liberdade Avança", em tradução livre) lideraram a corrida presidencial com mais de 30% dos votos.

Ficaram para trás as duas forças que governaram o país nas últimas duas décadas: o macrismo (Juntos por el Cambio, ou "Juntos pela Mudança"), com cerca de 28% dos votos, e a coalizão peronista-kirchnerista (Unión por la Patria, ou "União pela Pátria"), com mais de 27%.

A maioria das pesquisas deu a Milei cerca de 20% das intenções de voto, dez pontos atrás das outras duas coalizões — que, juntas, protagonizaram a "fenda" que dividiu politicamente o país nos últimos 20 anos.

O resultado deixa Milei, que atualmente é congressista e tem discurso contra as forças políticas tradicionais, como favorito para as eleições gerais de 22 de outubro.

Atrás dele, aparecem Patricia Bullrich, vencedora pelo "Juntos pela Mudança" e ex-ministra de Segurança durante a presidência de Mauricio Macri, e Sérgio Massa, do "União pela Pátria", e atual ministro da Economia do governo de Alberto Fernández.

Quem é Javier Milei?

Milei é formado em Economia pela Universidade de Belgrano, na Argentina, e tem dois mestrados na área. Ele atuou em consultorias, bancos e grupos de políticas econômicas, segundo um perfil disponível no site do Fórum Econômico Mundial.

Milei tem um discurso de ferrenha defesa do livre mercado — e muitos o comparam ao ex-presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e ao ex-presidente do Brasil, Jair Bolsonaro.

Ele se definiu como anarcocapitalista — corrente que defende um modelo de capitalismo sem regulação do Estado.

Em entrevista ao jornal O Globo em setembro de 2021, o economista declarou que o alinhamento que tinha com Trump e Bolsonaro "é quase natural".

Bolsonaro publicou vídeos nas redes sociais nos últimos dias manifestando apoio a Milei.

Durante a adolescência, ele foi goleiro do Chacaritas Juniors e teve uma banda de rock chamada Everest, que tocava músicas dos Rolling Stones.

Ao longo da atual campanha, Milei se conectou especialmente com os mais jovens, com a promessa de acabar com o sistema político tradicional, que ele chama depreciativamente de "a casta".

A proposta mais conhecida do candidato é dolarizar a moeda, acabando com a desvalorização do peso. Ele também propõe fechar o Banco Central e privatizar empresas estatais.

Durante a campanha, Milei gerou polêmica ao sugerir que permitiria a venda gratuita de armas de fogo e até de órgãos humanos.

Ele também teve vários problemas com a imprensa e recebeu críticas por fazer comentários misóginos.

Imagem BBC Brasil
Milei atraiu muita polêmica durante a campanha. (EPA)

A vida pessoal de Milei tem sido alvo de muitas especulações, em especial sua relação com a irmã, Karina Milei, que é a gerente da campanha dele, e seus cachorros — que ele chama de "filhos de quatro patas" e aos quais agradeceu no discurso de vitória.

“Obrigado a todos aqueles que apostam desde 2021 na criação de um projeto liberal com projeção nacional”, disse Milei diante de uma plateia constituída majoritariamente por jovens.

"Conseguimos construir esta alternativa competitiva que não só vai acabar com o kirchnerismo, mas também com a casta política parasita, corrupta e inútil que existe neste país", afirmou ele.

Para o analista político Facundo Cruz, do Centro de Estudos da Qualidade Democrática, o voto em Milei “canalizou o descontentamento dos cidadãos pelos últimos dois governos”.

"Milei foi subestimado nas pesquisas", disse ele à BBC News Mundo, serviço em espanhol da BBC, observando que os jovens são "os mais atingidos pela crise e não veem oportunidades".

A Argentina sofre com inflação alta por mais de uma década e atualmente tem a terceira maior taxa anual do mundo, acima de 115%.

Quatro em cada dez argentinos são consideradores pobres (entre menores de 14 anos, a pobreza chega a quase 55%) e o país vive uma profunda crise de endividamento.

Juan Germano, diretor da Isonomía Consultores, considerou que a vitória de Milei “é uma crítica ao sistema em geral”.

Imagem BBC Brasil
Em sentido horário: Patricia Bullrich, Sergio Massa, Horacio Rodríguez Larreta e Javier Milei. (Reuters)

Macrismo e kirchnerismo

As prévias argentinas também serviram para definir quem serão os candidatos que liderarão as duas coalizões que governaram a Argentina neste século.

Sem a presença das principais figuras — os ex-presidentes Cristina Kirchner e Mauricio Macri —, as primárias serviram para eleger quem serão os sucessores políticos deles.

Do lado do "Juntos pela Mudança" macrista, a vencedora foi Patricia Bullrich, que tem propostas de linha mais dura, que se aproximam em alguns aspectos do que defende Milei. Ela prevaleceu confortavelmente (com cerca de 17% dos votos) sobre o rival mais conciliador e atual prefeito de Buenos Aires, Horacio Rodríguez Larreta, que obteve cerca de 11% de apoio.

Enquanto isso, a coalizão kirchnerista-peronista que hoje governa a Argentina sob o comando de Alberto Fernández será liderada pelo atual ministro da Economia, Sergio Massa, que obteve uma vitória confortável sobre o rival Juan Grabois (21% contra 5%, aproximadamente).

Apesar dos graves problemas econômicos, o partido governista conseguiu se colocar apenas um ponto atrás de seu rival histórico.

O kirchnerismo também conseguiu manter o governo estratégico da província de Buenos Aires, enquanto o macrismo manteve o próprio reduto: a cidade de Buenos Aires.

Somando todos os votos, os três principais candidatos nas eleições chegam à disputa com números semelhantes: cerca de 30% para Milei, 28% para "Juntos pela Mudança" (Patricia Bullrich) e 27% para "União pela Pátria" (Sergio Massa).

Nas eleições presidenciais de outubro, se nenhum candidato atingir 45% dos votos, ou 40% com diferença de pelo menos 10 pontos em relação ao segundo colocado, os dois mais votados vão para o segundo turno, em novembro.

A grande incógnita agora é qual dos dois — Bullrich ou Massa — conseguirá atrair os votos dos rivais para enfrentar Milei, que não teve concorrência nas primárias.

Enquanto isso, uma questão ainda mais urgente para a maioria dos argentinos será como os mercados reagirão nesta segunda-feira ao inesperado triunfo de Milei.

*Com reportagem de Veronica Smink, da BBC News Mundo na Argentina

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